Ferro Rodrigues não pode estar imune a críticas na sua actividade política e deve ser contestado quando age mal ou profere cretinas declarações, como foram várias no passado recente. Contudo, é indecente, é vil, o que ele e a mulher tiveram de suportar enquanto almoçavam. E é um perigoso sintoma da degradação a que os regimes democráticos estão a ser sujeitos por parte de um bando de gente que vive para a arquitectura do caos que querem impor.

Há uns anos, numa conferência pública relacionada com o futebol, criei um “soundbyte” que pegou de estaca e é muito utilizado.

Falei de exércitos do nojo, gente que estava ao computador gerindo múltiplos perfis falsos para atacar pessoas de bem, sérias, de presente e passado impoluto, tentando enlamear quem anda na rua de consciência tranquila. Estes exércitos do nojo são hoje prática comum de clubes, instituições, partidos que recorrem a eles sem pudor nem vergonha.

Ora, cabe à comunidade demolir esta armada de bandalhos (e de quem lhes paga), porque o enorme problema é quando este tipo de procedimentos sujos e a sua linguagem passam da esfera virtual para o mundo real. E enquanto não houver consequências, o nojo alastrar-se-á para mal das sociedades.

Dizia um especialista americano em ciências sociais ao jornal espanhol “El Mundo”: “pensar com clareza num mundo contaminado por notícias falsas e dados manipulados é uma cruzada”, propondo uma “terapia de cepticismo” contra quem quer ligar o ventilador para espalhar ruído.

Mas mais do que isso, começa a ser difícil ter paciência contra quem quer desvirtuar a verdade e navegar ao sabor da última teoria da conspiração.

Lembrei-me de Cícero em Roma, quando no Senado, em 63 a. C., com a sua intervenção dinamitou a intenção de golpe de Estado de Catilina. “Até quando realmente, Catilina, vais abusar da nossa paciência? Até que limites fará alarde essa tua ousadia sem freio?”

Jorge Sampaio já não seria destes sinistros novos tempos atrás descritos. O seu humanismo e bondade seriam uma vacina muito pouco resistente contra estas matilhas de ódio que ganham espaço e visibilidade no espaço público.

É neste buraco, no qual se vão sugando os regimes democráticos e os valores e referências cívicos, que grassa o vazio e o dito caos onde se semeiam os medíocres e os lunáticos ungidos a profetas e líderes, como a personagem de Joaquin Phoenix no filme “Joker”.

É preciso que o legado de sã convivência, simpatia, elevação e educação de Jorge Sampaio não seja triturado pela carnívora máquina de efabulações e dementes criaturas que são manifestamente intolerantes e desinformadas. E como disse há poucos dias Pinto Balsemão, “não podemos ser tolerantes com os intolerantes”.

PS: Cinco anos de Jornal Económico. Parabéns a quem o faz, é um gosto estar por aqui.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.