Terminando a década ou não, seguramente que entramos nos anos 20 do século XXI. O já célebre 2020 pela cacofonia. No século passado, os anos 20 foram batizados de anos loucos pela forma vertiginosa como se viveu. Acabados de sair da Primeira Guerra Mundial, vivia-se de forma absurda num momento de enorme desenvolvimento e prosperidade em que as grandes urbes progrediram em dimensão e sociabilidade, fruto dos primeiros resultados da revolução industrial e da disseminação da tecnologia.

A democracia dava os primeiros passos resolutos na política, no acesso generalizado do direito ao voto e verificavam-se grandes progressos na afirmação da igualdade social e de género. O cinema encarregou-se de preencher o nosso imaginário com as imagens das festas sumptuosas, do acesso a novos bens de consumo, do surgimento de uma arquitetura que ainda hoje marca a época e nos deixa fascinados.

Contudo, esses anos terminaram na célebre crise de 1929 e a intensidade no mundo nunca mais parou de nos surpreender. Ainda agora saídos de uma crise, que nos deixou marcas profundas de endividamento do país e das famílias, já outra ameaça e nos dizem que os índices de crescimento na economia mundial, europeia e também portuguesa vão desacelerar.

Mas em vez de aprender lições em função dos sacrifícios impostos, continuamos em espírito de festa e de sumptuosidade mantendo um peso fiscal significativo sobre as famílias e as empresas, limitando a produtividade e a poupança. Daí as notícias alarmantes de penhoras de meia em meia hora em Portugal mas com resultados pouco relevantes de recuperação de créditos, enquanto os bancos vendem sucessivamente os créditos que concederam sem que obtenham retorno direto dos financiamentos concedidos, apenas para garantir contratos e negócios sem efetivos contributos para a economia nacional.

Os anos 20 que agora se apresentam não podem ser denominados de loucos novamente. Para que tal não aconteça importa repor estratégia, cuidado e atenção. A tendência não se anuncia positiva, pois que aprendemos a exigir. Os governos transigem com partidos radicais para se manterem em sobrevivência e estes agitam o seu peso específico para acudir ao facilitismo populista e demagógico. E preocupante a forma como os governos se deixam contagiar, as populações se permitem ignorar esperando que alguém um dia lhes ofereça segurança, saúde e proteção social por via digital e não por criação e distribuição de riqueza.

Esse é um dos verdadeiros desafios de futuro: como adaptar a economia e o desenvolvimento perante os desafios pela prestação de serviços globais por multinacionais flutuantes sem sede, de fortunas sem rosto e, em consequência, a perda de financiamento de serviços que se entendem ser providenciados pelo Estado. A este, exige-se que defina novas políticas e estratégias, donde derive um novo algoritmo que proporcione dar a todos o que todos entendem ter direito.

Os anos 20 que se iniciam devem ser o princípio de um período de prosperidade como os seus homólogos do século passado se glorificaram. Estranho que em tempo anunciado da informação sem limites, do contacto global em tempo real em imagem e som, da tecnologia elevada à mais alta potência, da digitalização e do conhecimento, não se consiga canalizar esse ganho para travar dificuldades e limitar expectativas e frustrações. Falta imaginação a cientistas políticos para definir novas teorias, para além do que é fácil e imerecido.

Esse será o desafio mais próximo e relevante para que se anuncie mais prosperidade e realização de forma mais generalizada. Antes de entrarmos na próxima crise e muito antes do final destes anos 20 que queremos pouco loucos e muito felizes. Bons anos vinte.