A ‘novela’ em torno da TAP conheceu esta semana novos capítulos, com a divulgação dos resultados da companhia em 2022. Resultados estes que, numa empresa habituada a prejuízos crónicos, foram extraordinariamente positivos, com uma subida significativa das receitas e do EBITDA (ver páginas 16 e 17).

Porém, a principal responsável pela apresentação destes resultados terá sido impedida de os apresentar publicamente por um Governo que tem estado mais preocupado em construir uma narrativa politicamente conveniente do que em esclarecer os portugueses sobre este dossier tão sensível.

Christine Ourmières-Widener pegou numa companhia falida, deficitária e desacreditada e transformou-a numa empresa rentável. Com dinheiro do Estado, e muito, é certo. E com um doloroso processo de despedimento coletivo e de rescisões, que teve um importante custo humano e social. Mas, com mérito, conseguindo aumentar as receitas da companhia em 150%, face a uma subida nos custos de apenas 11%, apesar do impacto da forte subida dos preços dos combustíveis.

Teria sido possível a CEO alcançar estes resultados se não tivesse podido rodear-se de pessoas de confiança e afastar uma administradora – Alexandra Reis – que não concordava com a sua estratégia? Não sabemos, mas é um facto que, independentemente das naturais discordâncias que possam existir, uma equipa de gestão bem sucedida deve estar alinhada no essencial, quer se trate de uma empresa privada ou pública.

De igual modo, podemos perguntar-nos se teria sido possível alcançar estes resultados sem enfrentar os múltiplos interesses instalados que desde há décadas se alimentam da companhia, numa versão moderna da Grande Porca de Bordalo Pinheiro. Muito provavelmente não. Era impossível pôr a TAP a dar lucro sem mudar a forma como as coisas funcionavam, sem reduzir o número de funcionários e incomodar sindicatos, fornecedores, partidos políticos, advogados e consultores com interesses em jogo, concorrentes e os mais diversos lobbies.

Dito isto, o incentivo dado a a Christine Ourmières-Widener era para conseguir que a empresa desse lucro rapidamente, de maneira a conseguir gerar o maior encaixe possível na privatização. Mas os cortes realizados e outras decisões que foram implementadas desde 2021 poderão ter consequências a longo prazo na companhia, ainda difíceis de prever, por exemplo no que diz respeito à sua capacidade de atrair e reter os melhores pilotos e outros profissionais.

Christine Ourmières-Widener terá, provavelmente, de recorrer aos tribunais para conseguir receber a indemnização milionária que está prevista no contrato que assinou antes de iniciar funções. Terá de demonstrar que não houve motivo para justa causa e de argumentar que o facto de o contrato não ter sido validado pela assembleia-geral da companhia, juntamente com a inexistência do contrato de gestão previsto na lei, constituem violações dos compromissos assumidos pelo Estado. Provavelmente, a Justiça dar-lhe-á razão. Mas nessa altura os atuais decisores políticos já andarão noutros voos.