Esta crónica fecha um ciclo de artigos que tenho vindo a escrever, com imenso prazer, desde novembro de 2020.

Quando comecei a escrever estes artigos, Biden tinha acabado de ganhar as eleições nos EUA, a pandemia dava sinais de resistência e um novo confinamento estava a bater-nos à porta. Sabemos, entretanto, que a pandemia agravou no início de 2021, mas que, agora, finalmente, parece começar a assumir um carácter endémico que nos permite uma certa normalidade.

Por outro lado, estamos desde fevereiro com uma guerra na Europa que não dá sinais de acabar. Tudo isto conduziu a um aumento do preço da energia, a uma falta de matérias-primas com o aumento do seu preço, a uma disrupção nas cadeias de abastecimento, e a um conjunto de factos económicos e políticos que teriam sido impossíveis de prever em fevereiro de 2020.

Se olharmos para alguns dos principais indicadores económicos, o país de hoje parece francamente melhor do que o país de há dois anos. Em 2020, o PIB teve uma quebra de 8,3% e prevê-se que este ano cresça cerca de 6%. O desemprego caiu de 7% para cerca de 6%, o déficit de -5,8% para -1,9% e a dívida pública de 134,9% para 118,9%.

Claro que sabemos que a economia está a desacelerar e a aproximar-se de uma estagnação, senão de uma recessão.

Sabemos também que temos fundos europeus consideráveis para nos ajudarem a evitar a dita recessão e implementar algumas alterações estruturais importantes, nomeadamente no que diz respeito à transformação digital e à mudança para um modelo de crescimento sustentável e circular.

Sabemos ainda que estamos a lidar com um problema de elevada inflação, que subiu de -0,14% em setembro de 2020 para mais de 9% em setembro de 2022. Devido a esta subida (idêntica em todo o mundo ocidental), os bancos centrais têm vindo a subir as taxas de juro de referência que em 2020 estavam, de forma bastante consistente, à volta de 0. Em outubro de 2022 a taxa de juro de referência do Banco Central Europeu subiu para os 1,25%, ainda assim atrás das taxas do seu congénere americano.

Esta inflação é, sobretudo, provocada por fatores do lado da oferta, mas as medidas de política expansionista levadas a cabo pela maioria dos governos para fazer face à pandemia e, mais recentemente, para diminuir os impactos negativos da inflação, ajudam a aquecer e estimular o lado da procura.

A subida dos juros tem de ser bem calibrada para se tentar conter o aquecimento da economia enquanto se dá tempo a que o lado da oferta se recomponha. Não é fácil, nada fácil, mas parece ser a única receita disponível.

Se tudo correr bem, isto é, se a guerra não se prolongar, se a pandemia (esta ou outra qualquer) não se descontrolar, uma política monetária moderadamente contracionista, a par com uma política fiscal moderadamente expansionista, pode ser a solução para um alisamento do ciclo negativo. Este controlo do ciclo pode permitir algum fôlego para se conseguir as mudanças estruturais e as alterações do lado da oferta, de que precisamos.

O futuro não se adivinha fácil e estou expectante para ver onde estaremos daqui a dois anos.

Do ponto de vista de política, e como tenho vindo a afirmar nestas crónicas, o foco tem de ser nas pessoas, na qualidade de vida, na demografia, na educação que permita mobilidade social. É preciso coragem, criatividade e a vontade de romper com modelos e hábitos do passado. É preciso recursos, mas sobretudo prioridades bem definidas no uso dos recursos.

A ver vamos… para já ficam aqui os meus votos sinceros que em 2024 os números nos mostrem que o caminho valeu a pena.