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Óscares: Quem irá proferir o discurso mais polémico? Aceitam-se apostas

Demasiado brancos ou demasiado políticos? Em 2017, as nomeações para os Óscares são mais diversificadas ao nível racial, neutralizando a controvérsia das duas edições anteriores. Mas a cosmopolita e liberal Hollywood tem agora um novo alvo: as políticas anti-imigração do presidente Donald Trump.
25 Fevereiro 2017, 15h50

A eleição de Donald Trump como presidente acentuou a fratura política dos EUA e é muito provável que isso seja visível (e audível) na cerimónia de entrega dos Óscares. Aliás, a presidente da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, Cheryl Boone Isaacs, ao apresentar os nomeados, no dia 6 de Fevereiro, fez um apelo à intervenção política.

“Todos nós sabemos que há algumas cadeiras vazias nesta sala, o que nos torna ativistas”, declarou Isaacs, referindo-se sobretudo à ausência do cineasta iraniano Asghar Farhadi (realizador do filme “O Vendedor”, nomeado para o Óscar de “Melhor Filme Estrangeiro”).

Na sequência da ordem executiva do presidente Trump que proibiu a entrada nos EUA de pessoas oriundas de sete países maioritariamente muçulmanos, incluindo o Irão, Farhadi anunciou que não estará presente na cerimónia dos Óscares. A proibição foi entretanto suspensa por um juiz federal, mas Farhadi manteve a sua decisão.

“Hoje disputa-se uma luta global pela liberdade artística, mais urgente agora do que em qualquer outro momento desde a década de 1950. A arte não tem fronteiras e não pertence a uma única fé. O poder da arte é que transcende todas estas coisas e as sociedades fortes não censuram a arte, celebram-na,” defendeu Isaacs. “Nós erguemo-nos contra aqueles que tentam limitar a nossa liberdade de expressão,” prosseguiu, evitando nomear Trump. “E nós erguemo-nos pelo princípio de que os artistas criativos de todo mundo estão ligados por um vínculo inquebrável, mais poderoso e permanente do que a nacionalidade e a política. E tal como o nosso trabalho não pára nas fronteiras, as fronteiras não podem parar nenhum de nós.”

O tiro de partida já tinha sido dado pela atriz Meryl Streep, a 8 de Janeiro, quando foi distinguida com o prémio Cecil B. DeMille na cerimónia dos Globos de Ouro. “Houve uma atuação este ano que me surpreendeu,” ironizou Streep. “Foi o momento em que a pessoa que pedia para se sentar na cadeira mais respeitada do nosso país imitou um jornalista deficiente,” recordou. “Como que partiu o meu coração. Ainda não consigo tirá-lo da minha cabeça porque não foi num filme. Era a vida real. Este instinto para humilhar, quando é modelado por alguém poderoso, infiltra-se nas vidas de todos.”

No mesmo discurso, Streep refletiu sobre o que é Hollywood. “Quem somos nós? Apenas um monte de pessoas de outros lugares”, sublinhou. E apontou os exemplos das atrizes Amy Adams e Natalie Portman, nascidas respetivamente em Itália e Israel. “Onde estão as suas certidões de nascimento?” Mais, Ryan Gosling é canadiano, Ruth Negga é originária da Etiópia e Dev Patel “nasceu no Quénia, foi criado em Londres e está aqui por interpretar um indiano que cresceu na Tasmânia. Hollywood está cheia de estrangeiros. Se os chutarem todos para fora, não terão nada para ver além de futebol e artes marciais mistas,” concluiu. Nomeada para o Óscar de “Melhor Atriz Principal”, se tiver a oportunidade de subir ao palco, Streep não deixará de voltar à carga contra as políticas anti-imigração de Trump.

O mesmo se aplica ao ator Mahershala Ali que, no dia 28 de Janeiro, ao receber um prémio do Screen Actors Guild, também proferiu um discurso politizado. “O que eu penso que aprendi ao trabalhar no ‘Moonlight’ foi ver o que acontece quando se perseguem pessoas. Elas dobram-se sob si mesmas,” lamentou. Ali também invocou o seu exemplo de afro-americano que se converteu ao Islão, dizendo que há duas formas de tratar as pessoas diferentes: atentar nas “texturas” dessas pessoas e no que as torna únicas, ou “ir para a guerra” contra essas diferenças.

Diversidade de raça e género

Além da imigração, há que ter em conta a questão racial. Em 2015 e 2016, os Óscares foram criticados (e boicotados) por serem “demasiado brancos”. Mas este ano o cenário é diferente: pela primeira vez foram nomeados afro-americanos nas quatro categorias de representação. Porém, não há mulheres nas categorias de realizadores e argumentistas. É possível que a questão de género venha a ser invocada em algum discurso.

Isaacs é a primeira afro-americana (e a terceira mulher) a assumir a presidência da Academia e, depois da controvérsia racial nas duas edições anteriores, prometeu implementar “grandes mudanças”. Em 2012, dos cerca de seis mil membros da Academia, 94% eram brancos e 77% eram homens, com uma idade média de 62 anos. No final de 2015, Isaacs lançou uma iniciativa com o objetivo de tornar a Academia mais jovem e diversificada. Já em 2016 anunciou a entrada de 683 novos membros, 46% dos quais mulheres e 41% não brancos, representando 59 países distintos. Essa mudança já se fez sentir nas nomeações deste ano, em que dois filmes com elencos predominantemente afro-americanos (”Fences” e “Moonlight”) estão destacados nas principais categorias. Mas as mulheres parecem continuar subrepresentadas.

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