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Fusões e aquisições. Otimismo cauteloso pautará atividade de M&A em 2022

Consultores e advogados concordam que 2022 pode ser um ano positivo para as operações, apesar do cenário de crise e conflito internacional que exige prudência. Existe capital para investir, mas deve haver reforço das ‘due diligence’.
9 Abril 2022, 19h01

Apesar de consultores e advogados anteciparem algum abrandamento na área das fusões e aquisições em virtude do contexto de crise e de guerra, a trajetória de crescimento, tanto em valor como em volume de operações, poderá manter-se para 2022. Especialistas ouvidos esta quinta-feira pelo Jornal Económico dão conta de um cenário de otimismo, que, dizem, deve ser “prudente”.

Quem o diz é a sócia da Abreu Advogados, Ana Sofia Batista, quando recupera o relatório divulgado pela sociedade de advogados sobre a recuperação pós-pandemia, do ponto de vista das fusões e aquisições. “Referimos na altura alguns sectores e áreas da economia que achámos que tinham crescimento e que se antecipava que poderiam crescer ainda mais”, explica. “Obviamente, o otimismo sempre prudente: os dados eram positivos e era esperança de que 2022, depois de dois anos de pandemia, fosse um ano mais forte”, adianta Ana Sofia Batista.

A pandemia, e o que veio antes, é também referida pelo CEO da Yunit, Bernardo Maciel, como um contexto interessante para as fusões e aquisições, sobretudo porque, diz, “a pandemia trouxe outra derivada que é importante, que alimenta o negócio de M&A (fusões e aquisições), que tem que ver com a descapitalização”. Maciel esclarece que há “um conjunto de empresas e sectores que ficaram demasiado descapitalizados, e isto faz com que haja aqui uma procura de formas de capitalização”. Nesse sentido, o líder da consultora refere a importância que terá o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), através do Banco do Fomento, por trazer “um conjunto de instrumentos”. Também forçada pela pandemia, diz existir uma lógica de alteração das cadeias de fornecimento que está associada a uma necessidade de “reindustrializar a Europa”, nomeadamente em sectores “como a metalomecânica, automóvel, plástico e moldes”, nos quais considera que Portugal é um país que pode concorrer diretamente com aquilo que são os fornecimentos da Ásia e Oriente” – a pandemia, diz Bernardo Maciel, trouxe ao de cima a urgência em devolver indústrias ao continente europeu, tornando esses sectores “mais apetecíveis” para eventuais operações de M&A.

O manager da Moneris, João Nunes, também considera que a cadeia de abastecimento veio evidenciar alguns problemas. Contudo, defende que a “atual e difícil conjuntura também poderá gerar oportunidades, mas há que saber monitorizar essas oportunidades e, com segurança, aproveitá-las”, seja uma empresa ou uma entidade que dispõe do financiamento para realizar esses investimentos.

A sócia administradora da FB & Associados, Ana Salgado, acena a esta existência de oportunidades e sublinha que é fundamental “um reforço da segurança do investimento” neste período pós-pandemia que agora se encaixa a um contexto externo de guerra. “Tem de haver segurança para que se possa investir e realizar estas operações”, diz, explicando ainda que do lado das empresas, em concreto, estas “têm de, primeiro, ter capacidade para investir e essa capacidade tem de vir de capitalização”. O desfecho pode não ser satisfatório “não a tendo”.

João Nunes recorda também que a cautela pré-investimento, ou que antecipa a transação, é imperativa no atual “período de grande incerteza”, mas que essa cautela “é válida em qualquer período”, não só em crise ou em cenário pós-pandémico. “Provavelmente vamos assistir a um reforço das due diligence para gerar mais confiança e perspetivar aquilo que será o futuro da transação, quer sejam de alto nível, quer também ao nível das pequenas e médias empresas”, diz. Além disso, o consultor deixa o alerta para aquele que considera ser “um factor muito importante”: o pós-negociação e pós-transação. “Tem de haver um reforço do pós-deal para que, no fundo, todos consigam ter alguma segurança naquilo que é um nível muito grande de incerteza”, garante.

Capital existe, mas pode demorar
Por sua vez, Ana Sofia Batista acena ao apelo de cautela pela situação atual e garante que “vão existir” efeitos nos negócios. “É natural que haja abrandamento”, explica, “as entidades e os grupos têm de pensar se existe mais tempo para decidir e fazer due diligence”. Ainda assim, não acredita que estejamos perante um repto entre um cenário positivo ou negativo: “Parece-nos que podemos ser positivos, o PRR vai realmente ter importância”. Batista destaca aqui algumas áreas que poderão beneficiar do plano – como a transformação digital, o 5G, o turismo e o imobiliário – mas refere que há até novidades no palco das M&A nacionais: “Temos notado M&A em empresas do mercado das criptos, por exemplo. Algum abrandamento, mas com otimismo”.

Explica ainda que, apesar de um “calculismo maior (…) o grau de otimismo dos mercados não caiu abruptamente de todo. Continua elevado. A previsão que tem sido feita da evolução das economias, continua a apontar para uma perspetiva de crescimento”, esclarece.

Isto porque, segundo a sócia da Abreu Advogados, há “muito capital para investir” apesar do aumento das taxas de juro e da inflação. “A verdade é que há capital e montantes para investir, que vão ser investidos, podem é demorar mais tempo”, em parte ao nível da decisão, explica Ana Sofia Batista. “Com toda a incerteza que nos rodeia, o mercado e as instituições continuam a operar, com mais ou menos reflexo pelo que se passa na Europa”, admite.

Bernardo Maciel também reconhece que “houve um conjunto de fundos de private equity que acumularam bastante liquidez e alguma captação: gerou-se uma dinâmica muito interessante dos dois lados da barricada – do lado financeiro e do lado económico”, explica. Ainda sobre o mercado das consultoras, Maciel diz que “as grandes consultoras têm obviamente um conjunto de competências que são relevantes para players internacionais quando procuram o mercado nacional” e que, por existirem “menos de mil grandes empresas” em Portugal, que a atividade de M&A se deverá registar mais nas médias empresas – para as quais as consultoras de menor dimensão demonstram, segundo o CEO da Yunit, “uma agilidade e experiência” que as grandes consultoras “não têm”. Admite ainda que o mesmo “acontecerá nas sociedades de advogados que têm esta capilaridade internacional”.

Sociedades multidisciplinares geram “apreensão”
Ana Salgado confessa que a potencial existência de sociedades multidisciplinares é um tema sobre o qual tem “vindo a refletir há já algum tempo”. “Entendo as razões de índole económica e de concorrência que, aliás, foram o mote para a legislação comunitária”, diz. Contudo, mantém “algumas ressalvas de aplicação prática, concreta, nas sociedades de advogados”.

Estas preocupações práticas, explica, prendem-se com “a possibilidade de sócios de sociedades de advogados não serem apenas advogados” e que o grande problema que daí poderá advir “prende-se com o sigilo profissional, a independência”. A solução? “Alguns colegas dizem resolver-se com acordos de confidencialidade – vale o que vale”, refere. “Ambos os argumentos são válidos”, lembra a advogada, que mantém as suas “ressalvas quanto à aplicabilidade prática”. Em convergência, João Nunes reconhece que a possível existência dessa sociedades é “um tema pertinente”, mas que o importante se mantém inalterado tanto para as sociedades de advogados como para as consultoras: “Focarmo-nos não em sociedades multidisciplinares, mas em ter equipas multidisciplinares para dar apoio”.

Assista a esta conversa na íntegra na JE TV em jornaleconomico.pt

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