Perante esta epidemia que se propagou aos quatro cantos do mundo,  com mais de dois milhões de infetados e 130 mil mortos, e em Portugal a ascender aos 20 mil casos e mais de 600 mortos (13º país do mundo com maior incidência) e após mais de um mês de isolamento e estado de emergência nacional, o momento é de pensar na reconstrução do país.

Neste esforço, contaremos muito com os nossos empresários e empreendedores, que lutam diariamente pela sustentabilidade das suas empresas, pela manutenção dos postos de trabalho e, em muitos casos, contribuindo de forma ativa e generosa em iniciativas de apoio aos mais necessitados. Já o disse em várias ocasiões, há um Portugal que não se conforma nem se verga às dificuldades. E que irá lutar pelo nosso futuro coletivo.

É digna de registo, por exemplo, a disponibilidade imediatamente manifestada por mais de 200 empresas do setor têxtil e de vestuário do norte do país para avançar para a produção de máscaras e equipamentos de proteção individual, reorientando as suas linhas de produção de forma a dar resposta à escassez destes equipamentos essenciais no combate à covid-19. Tal como as empresas que faziam impressões 3D ou peças para automóveis e que agora se reinventam para fabricar viseiras e as que produziam cerveja e agora fazem gel desinfetante.

Ainda assim, segundo dados do FMI – menos negativos do que os de outras entidades – haverá uma quebra profunda na economia nacional, bem maior do que na crise da troika. Num cenário de contração da economia à escala mundial, o ano de 2020 irá, em Portugal, bater todos os recordes negativos, com a economia a afundar-se e a taxa de desemprego a mais do que duplicar. A contração do PIB este ano poderá ser superior a 8%, a quinta maior, a par da Espanha, entre os 19 países da zona euro. A taxa de desemprego, em queda desde 2013, poderá mais do que duplicar, passando dos 6,5% em 2019 para os 13,9%, atingindo 700 mil portugueses.

O Estado terá de ter um papel absolutamente relevante neste domínio com o apoio comunitário (que, ainda assim, poderia ter ido bem mais além com a criação dos coronabonds ou eurobonds, as desejadas obrigações europeias por parte dos países do Sul, que seriam diretamente garantidas por todos os Estados do euro), se houvesse um real espírito solidário entre todos os Estados europeus.

O valor para já previsto, apesar de expressivo, não será suficiente para Portugal e outros países do Norte, e será mesmo necessário a emissão comum de dívida como forma de financiamento da retoma económica, para financiar o investimento necessário a ultrapassar a crise, usando o método comunitário e recorrendo ao Orçamento da UE como garantia.

Os apoios lançados pelo Eurogrupo passam para já por um pacote de empréstimos aos Estados reembolsáveis, superior a 500 mil milhões de euros, para fazer face à pandemia da covid-19, cabendo a Portugal 1% deste valor – ou seja, um jackpot de cinco mil milhões para auxiliar a saúde e a economia.

Fruto deste acordo para o imediato, o Governo de António Costa detém uma verba europeia, apesar de tudo significativa. Impõe-se que o executivo seja rápido a entregar a Bruxelas as suas intenções e projetos e que não se deixe discriminar em relação a outros países, como, por exemplo, a Alemanha, que já garantiu apoios a 100% a empresas estatais e estratégicas, quando em Portugal quase nada ultrapassa os 80% ou os 90%.

Com exceção das empresas de alojamento, restauração e comércio geral, há muitas outras que resistem, e com planos de contingência ao vírus, continuam a laborar (82% das empresas), mas com quebras de produtividade de mais de 50% e com menos de metade dos trabalhadores. Mas apesar desta resiliência, o momento económico é dramático, pois mais de metade das nossas empresas, não tendo liquidez, vivem de apoios bancários, e sem receitas para fazer face aos compromissos, sem apoios reais do Estado, correm sérios riscos de colapsar.

Neste Portugal a meio-gás e em confinamento, exige-se precaução e sabedoria nos passos públicos. Há que planear a retoma económica, proteger o emprego e o rendimento dos portugueses e evitar no futuro mais austeridade, já que estamos em máximos impensáveis de carga fiscal sobre as pessoas e as empresas. Projetar o pós-crise sem propagandas políticas é determinante para evitar uma pandemia financeira que já se sente no ar. Urge, e para já, mas a Europa terá que ir bem mais além!