Escutei, com toda a atenção, a recente entrevista do senhor ministro da Saúde, Manuel Pizarro. Nesta coluna, já aqui destaquei a esperança no seu bom desempenho governativo, matéria mais de cidadania do que de afirmação política.

Entre as várias ideias e afirmações do senhor ministro, interessou-me em particular o que disse sobre os medicamentos, nomeadamente que a despesa pública nessa área está a crescer a 10% ao ano, o que não é sustentável. E aludiu, assim o interpretei, a uma potencial concertação negocial por parte da indústria farmacêutica, insensível aos montantes e quantidades que o Estado adquire anos após ano.

Também nos subsistemas de saúde se sente a despesa com os medicamentos a subir de forma acelerada e se percebe que o movimento, se continuado, é simplesmente insustentável.

Neste espaço, já anteriormente convidei o novo ministro a debruçar-se sobre a prática de certos operadores que cobram margens de 1000% na administração de medicamentos em ambiente hospitalar. Realcei também que é estranho que o Ministério da Saúde se remeta a um silêncio incompreensível sobre isto.

Num Estado que regula tanta coisa, é estranho o mutismo, num país onde a oferta estatal é frágil, para ser simpático, na medicina geral e familiar, na estomatologia, na oncologia ou nas cirurgias programadas. E onde as famílias e as empresas privadas pagam, em percentagem das despesas de saúde, mais, muito mais, que nos congéneres europeus.

É notório que as farmácias comunitárias estão a registar ruturas de stocks, não só de medicamentos de marca, mas sobretudo de genéricos. E que apesar dos genéricos serem apenas metade do mercado português de medicamentos, há um conjunto de problemas que estão a afetar este mercado em toda a Europa e demais países da OCDE, pelo que importa ter uma visão do conjunto, sem a qual continuaremos a ter falhas importantes de abastecimento nas farmácias.

Num contexto de inflação mundial nos mercados de matérias-primas (a título de exemplo, o preço do amido, que chega da Ucrânia e que é utilizado nos genéricos, subiu quase 300% este ano), agravado pela guerra e pelas disrupções das cadeias logísticas com origem na China, não basta dizer que queremos limitar o crescimento da despesa dos medicamentos. É preciso ir mais além.

Urge olhar de forma mais estratégica e integrada. Seria importante privilegiar a aquisição de medicamentos fabricados na Europa e em países da OCDE, para que se possa controlar a qualidade e estabilizar a produção através de compras programadas e contratualizadas a prazos mais longos. Acresce que é igualmente preciso regular os preços dos medicamentos em ambiente hospitalar no setor privado. Convém relembrar que quase metade dos portugueses usufruem de subsistemas, seguros ou planos de saúde. E estes portugueses também merecem ser protegidos numa relação onde o desequilíbrio de forças é notório.

Só desta forma controlaremos a despesa em medicamentos do Estado, das famílias e evitaremos ruturas indesejáveis nas farmácias.