“Os partidos políticos devem reger-se pelos princípios da transparência, da organização e da gestão democráticas e da participação de todos os seus membros” – Art.º 51.º da Constituição da República Portuguesa. Os partidos estão há muito sob uma ofensiva reaccionária e fascista, inserida no combate ao Regime Democrático de Abril. Há muita similitude com o acontecido na I República, que conduziu ao 28 de Maio e à Ditadura fascista de Salazar.

Aproveitando a corrosão e descredibilização dos partidos do centrão (PS, PSD e CDS), bem como a tentativa de co-responsabilização de outros, como o PCP, metendo todos no mesmo saco pela situação a que a política de direita de sucessivos governos daqueles partidos conduziu o país, os inimigos da democracia aproveitam o balanço para se atirar ao próprio regime democrático. E que acaba por ter a cumplicidade do PS, PSD e CDS e dos seus ideólogos.

Para ilibar responsabilidades da sua política na degradação económica, social e política – caso das elevadas abstenções (mesmo se empoladas por recenseamento que aproxima o n.º de eleitores da população do país!) – há muito descobriram um bode expiatório: os (importantes) aspectos formais e legais do funcionamento do regime: o número de deputados; o funcionamento do Parlamento; os sistemas eleitorais (círculos uninominais) e o próprio funcionamento dos partidos com a eleição directa do “líder partidário”, inclusive com a participação de não membros do partido, etc..

Mas quando assistimos à recente decisão de apoio à reeleição de Marcelo Rebelo de Sousa pelo primeiro-ministro e Secretário-Geral do PS, ou a sua decisão de nomear um especialista para a elaboração de um plano estratégico de recuperação da economia no pós-Covid 19, completamente à margem do seu partido e dos seus órgãos, aparentemente por decisão exclusivamente sua e perante o espanto de membros do PS, uma pergunta deve ser feita: para que serve um partido?

É apenas a escada institucional para que alguém a suba até ao topo e assuma o lugar de primeiro-ministro após eleições? É apenas um instrumento de captação de lugares nas estruturas de poder do regime democrático? Para que servem os programas e estatutos partidários? As suas regras, valores e objectivos? Onde está a “participação dos seus membros” e dos seus órgãos directivos em decisões partidárias estratégicas que alteraram o que foi decidido em congressos ou nunca teve decisão?

É claro que ninguém está a pôr de parte a participação enriquecedora das formulações programáticas e da intervenção política dos partidos de personalidades sem partido, de entidades e associações que intervêm na vida do país nas mais diversas áreas. O problema é se estas consultas substituem ou marginalizam os membros/órgãos do partido, que supostamente são os primeiros detentores das decisões partidárias (como já são substituídos nas eleições dos partidos!).

É este esvaziamento da vida democrática dos partidos enquanto espaços da participação dos cidadãos, e de “através deles concorrer democraticamente para a formação da vontade popular e organização do poder político”, é esta inutilidade de se fazer parte de um partido que é veneno corrosivo do regime democrático. Causa da abstenção e desafeição partidária. Mesmo se não há funcionamento democrático óptimo que possa compensar uma política de desigualdade social e exploração. Não deixa de ser paradoxal que quem passa a vida a atazanar o PCP com calúnias e falsificações sobre a sua democracia interna, não dê por ela quando há um elefante na sala das porcelanas…

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.