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Pedro Nuno Santos sobre a TAP: “Se o privado não aceitar as condições do Estado, teremos de nacionalizar”

Afastado o cenário de deixar cair a TAP em processo de falência só restam duas saídas: ou os acionistas privados cedem às exigências do Estado ou a companhia aérea vai ser nacionalizada, conforme o ministro das Infraestruturas deixou claro na audição de hoje no Parlamento.
  • Cristina Bernardo
30 Junho 2020, 15h18

“Se o privado não aceitar as condições do Estado, nós teremos de nacionalizar a empresa. Não vamos ceder ao privado, nem vamos deixar cair a empresa”, assegurou hoje Pedro Nuno, ministro das Infraestruturas, numa audição que está decorrer desde manhã na Comissão Parlamentar de Economia, Obras Públicas e Inovação.

O ministro respondia a uma questão colocada pelo deputado do CDS João Gonçalves Pereira, sobre se a intenção do Governo é avançar para um processo de nacionalização da companhia aérea nacional.

“O contributo da TAP para a economia nacional é muito visível, muito forte. Nós precisamos de ter uma companhia que possa ir ao encontro àquela que é a visão estratégica do país para as suas ligações aéreas. Temos muitas motivações diferentes, não só no quadro nacional, mas de ligação do país a países com ligações históricas, para ligações a muitos países onde temos comunidades portuguesas de máxima importância, ligação a territórios com quem temos ligações económicas, de vários dos nossos setores industriais. Nós estamos a falar de uma empresa que responde não só a uma necessidade de mercado, mas que responde também a necessidades nacionais e isso só se faz quando nós temos influência numa empresa. Por isso, a intervenção na TAP é tão importante”, explicou o ministro.

Abordando o diferendo com os acionistas provados da TAP, David Neeleman e Humberto Pedrosa, Pedro Nuno Santos sublinhou: “Esse braço de ferro resulta apenas da atitude intransigente que o Estado tem adotado na defesa do interesse público. Esse braço de ferro só existe porque nós decidimos tomar a atitude intransigente e firme de defender o país, de defender o povo português. Senão, não havia cá braço de ferro nenhum”.

“E é nesse cenário que nós estamos, não é de braço de ferro, é de defesa intransigente do interesse nacional. E nós fizemos uma proposta com um conjunto de condições, condições essas que defendem o país e o seu povo. Nós estamos disponíveis a salvar e a intervencionar uma empresa de máxima importância para o país, mas o povo português, através do seu representante, que somos nós, quer assegurar um conjunto de condições mínimas, equilibradas e razoáveis”, defendeu o ministro das Infraestrututras.

Entre essas condições mínimas, Pedro Nuno Santos exemplificou a questão da conversão dos créditos dos acionistas privados em capital da TAP e o controlo do Estado sobre as decisões que são tomadas com “o nosso dinheiro”.

Dizendo que o Estado não vai ceder em relação a estas exigências, o ministro das Infraestruturas admitiu que o acionista privado, “depois, tem todo o direito, num país e num Estado de Direito como aquele em que vivemos, de defender a sua posição”.

“Cá nós, defendemos a posição do Estado e do povo português. Nós estaremos cá e continuaremos cá a defender o país e a defender o povo português e só estamos disponíveis a fazer uma intervenção com aquela dimensão porque nós sabemos a importância que a TAP tem. Não cederemos na negociação com os privados, não lhe chamamos braço de ferro, chamamos-lhe defesa intransigente e firme do interesse nacional”, insistiu o ministro das Infraestruturas.

Necessidade de ajustamento
Pedro Nuno Santos alertou que “se nós vamos fazer uma intervenção com a dimensão que se avizinha, com a dimensão que é pública, e não fazemos nenhum ajustamento em rotas que são deficitárias ou que serão ainda durante muito tempo, nós estaremos a fazer um mau serviço à TAP e ao país”.

“Nós vamos ter um plano de reestruturação acordado com a União Europeia, mas o Estado português tem de defender a sua posição e aquela que é a sua visão daquilo que deve ser a TAP e até onde deve ir a reestruturação, consciente de que ela é importante e inevitável. A reestruturação é inevitável. A forma como a faremos é possível de ser discutida, falada por todos nós”, admitiu Pedro Nuno Santos.

Sobre as futuras negociações com Bruxelas, o ministro das Infraestruturas admitiu que “terá de ser feito um acordo e para nós é importante que a TAP não passe um determinado patamar que a torne incapaz de dar resposta às necessidades nacionais”.

Mas reconheceu que, “inevitavelmente, nós teremos de passar por um ajustamento, até para bem da própria TAP e dos postos de trabalho que queremos preservar. É fundamental. Acho que não vale a pena enganarmo-nos. Nas reuniões que tive com os sindicatos, desse ponto de vista, foi sempre muito sincero sobre o desafio que todos nós temos pela frente”.

Sobre o plano de injeção de 1.200 milhões de euros na TAP, Pedro Nuno Santos revelou que o pedido feito pela TAP foi de 1.500 milhões de euros, para aplicar no balanço da TAP SGPS, uma empresa que o ministro garantiu ter encerrado o exercício de 2019 com capitais próprios negativos em 600 milhões de euros. Fator que, no seu entender, explica a decisão da Comissão Europeia em não apoiar a TAP ao abrigo da Covid-19, uma decisão que “foi fundada em indicadores, em rácios objetivos”.

Pedro Nuno Santos explicou o valor de 1.200 milhões de euros da seguinte forma: “É verdade que fizemos o cálculo para a realidade que nós conhecemos e para as previsões da IATA, que é uma organização internacional da aviação. Não fomos nós que inventámos as previsões de recuperação futura. São as que estão a ser usadas por todas as companhias aéreas. Chegámos a um valor que é aprovado pela União Europeia, mas nenhum de nós, ninguém no mundo, tem a certeza sobre o que vai estar à nossa frente. Temos previsões, mas não temos a certeza sobre a rapidez e a intensidade da recuperação”.

Duras críticas a Antonoaldo Neves
O ministro das Infraestruturas deixou ainda palavras muito duras para o CEO da TAP, Antonoaldo Neves, que na semana passada, na mesma comissão parlamentar, destacou que a companhia estava a disposta a abrir um lugar na comissão executiva para um representante do Estado, declarações a que Pedro Nuno já havia reagido de forma pública, assumindo “perplexidade”.

Hoje, o governante foi mais longe nas críticas a Antonoaldo Neves. “A propósito de ter alguém na comissão executiva, não foi por nós pedido. É sempre interessante ver algumas pessoas, com o desplante que têm, de aqui, perante o Parlamento, que representa o povo português, vir oferecer, mostrar disponibilidade ao Estado português para ter um representante na comissão executiva, quando lá vai meter 1.200 milhões de euros”, desabafou Pedro Nuno Santos.

E prosseguiu: “Nós temos de saber lidar com isto. E ter nervos de aço e aguentarmo-nos e, no mínimo, dizer só, que é ridículo, para sermos simpáticos”.

“O Estado português não pediu nada a ninguém, nem tinha que pedir nada a ninguém, porque aquilo que está a ser feito e a ser preparado é uma intervenção de 1.200 milhões de euros na TAP e, que eu saiba, destes 1.200 milhões de euros, não tem nem um cêntimo do privado que elegeu o senhor CEO que esteve aqui a semana passada”, atacou o ministro das Infraestruturas.

Assim, para Pedro Nuno Santos, “a coisa é simples: Não é quem não mete [dinheiro] que diz que podemos ter ou não [administradores], é quem mete. E quem mete é o Estado português.

“A música agora é outra. Isso significa que o Estado não se vai por de cabeça baixa a lidar com um privado que não tem disponibilidade financeira para meter na empresa, Vocês acham que o sócio de uma empresa que não tem capacidade financeira para se chegar à frente, deve continuar a mandar nela?”, perguntou Pedro Nuno Santos aos deputados do PSD e do CDS, que criticaram a possibilidade de a TAP vir a ser nacionalizada.

“Nós temos é que apoiar e defender o povo português. Tem, tem, não tem, não tem, e é assim que deve ser. A música é outra. O povo paga, o povo manda. Temos que nos dar ao respeito. É assim que deve ser. É assim que quem está a exercer funções públicas se deve comportar. Ponto! É a minha interpretação” assumiu Pedro Nuno Santos.

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