Politólogos franceses consideram que a campanha para a primeira volta das eleições legislativas foi “pouco dinâmica”, onde o único campo a “marcar pontos” foi o do esquerdista Jean-Luc Mélenchon, e esperam uma maior “dramatização” na segunda volta.
Em declarações à agência Lusa na véspera da primeira volta das eleições legislativas francesas, Emeric Bréhier, diretor do Observatório da Vida Política da fundação Jean Jaurès, considerou que o único campo que conseguiu “marcar pontos” nesta campanha foi a coligação Nova União Popular Ecológica e Social (NUPES), liderada pelo esquerdista Jean-Luc Mélenchon.
Segundo o politólogo, Mélenchon conseguiu “gerar à volta dele uma coligação eleitoral real, que parece ter uma certa dinâmica”, ao apresentar o sufrágio como a terceira volta das eleições presidenciais e como a possibilidade de os cidadãos elegerem o futuro primeiro-ministro.
“Era a única estratégia realista que ele tinha: era obrigado a dar a impressão que havia uma possibilidade de vitória para conseguir contrariar a dinâmica clássica que favorece o candidato que ganhou as presidenciais”, disse o também antigo deputado do PS francês, que deixou a Assembleia Nacional após as últimas eleições legislativas, em 2017.
Em declarações à agência Lusa, Vítor Pereira, professor da universidade de Pau, também convergiu com Emeric Bréhier, vendo em Mélenchon o único candidato que conseguiu “dar algum relevo a esta campanha”, que considerou “pouco dinâmica” e quase inexistente.
Pereira sublinhou que as restantes forças políticas estiveram quase ausentes do terreno, designadamente devido à ideia comum que o Presidente eleito consegue sempre obter uma maioria absoluta, desde que, em 2002, as eleições legislativas passaram a ser organizadas poucos meses depois das presidenciais.
“Mélenchon conseguiu criar alguma dúvida [sobre essa inevitabilidade]. (…) O que provavelmente vai acontecer é que a esquerda vai ter muito mais deputados do que há cinco anos, que tinha sido um descalabro importante”, perspetivou.
Destacando também o “quase desaparecimento da paisagem” de Emmanuel Macron e de Marine Le Pen durante esta campanha, Bréhier considerou, contudo, que a possibilidade de a NUPES vir a obter uma maioria absoluta é pouco provável.
Para Bréhier, a eventual taxa de abstenção elevada irá penalizar Mélenchon – uma vez que afetará sobretudo as classes populares e os mais jovens, mais propensos a votar na NUPES – e poderá vir a favorecer Emmanuel Macron.
“Acho que, no dia 12 de junho [primeira volta], vamos ouvir muitos gritos de vitória da NUPES. Mas, no dia 19 [segunda volta], a realidade vai ser muito menos lisonjeadora”, afirmou.
Vítor Pereira também considerou que parece ser “mais difícil” que a campanha eficaz da NUPES seja “suficiente” para conseguir obter uma maioria absoluta, mas não descartou a possibilidade de Macron vir a perder a maioria que tem desde 2017.
Caso o Presidente se veja obrigado a dialogar com outros partidos para ter uma maioria governativa, o professor da universidade de Pau sublinhou que o mais provável é que o Presidente da República se vire para o partido dos Republicanos.
“Os dois antigos primeiros-ministros, tanto Édouard Philippe como Jean Castex, vinham dos Republicanos, muitos dos ministros importantes do Governo: [Gerald] Darmanin, Bruno Le Maire, [Sébastien] Lecornu, que agora é ministro da Defesa Nacional, vêm dos Republicanos. (…) Parece a coisa mais óbvia, obviamente a política às vezes é mais complicada”, indicou.
Os dois politólogos concordaram também que a campanha para a segunda volta das eleições presidenciais deverá ser mais empolgante para os eleitores, uma vez que o campo de Emmanuel Macron começa a sentir que poderá vir a perder a sua maioria absoluta e tenderá a envolver-se mais no terreno.
Emeric Bréhier referiu que, uma vez que em muitas circunscrições haverá um duelo direto entre candidatos da coligação ‘Juntos!’ – que apoia Macron – e candidatos da NUPES, haverá “seguramente uma dramatização tanto de um lado como do outro”.
“Essa dramatização irá certamente chamar a atenção para as eleições legislativas, isso não há dúvida nenhuma. Será que isso quer dizer que a campanha será mais emocionante? Não estou muito convencido”, sublinhou.
Vítor Pereira também perspetivou uma campanha para a segunda volta “não de grandes ideias, mas de grandes medos”.
“Se o partido de Macron vir que talvez a NUPES pode ganhar ou impedi-los de ter maioria absoluta, podemos ter uma campanha talvez um bocadinho mais agressiva, com o realçar do perigo que, segundo eles, seria uma vitória da esquerda: um caos, um bloqueio das instituições, várias medidas propostas por Mélenchonn que são vistas como liberticidas”, afirmou.
Depois da vitória de Emmannuel Macron na segunda volta das eleições presidenciais em abril, sobre a candidata de extrema-direita Marine Le Pen, as legislativas vão definir a composição do próximo parlamento.
A primeira e segunda voltas das eleições legislativas estão marcadas, respetivamente, para 12 e 19 de junho.