O Tribunal Constitucional polaco decidiu, num parecer requerido pelo próprio primeiro-ministro, Mateusz Morawiecki, que, em determinadas questões, o direito polaco tem primazia sobre as normas da União Europeia. E a questão é saber até que ponto poderá esta decisão conduzir ao Polexit, ou seja, à saída da Polónia do clube comunitário.

Bruxelas não ficou surda ao grito de independência da Polónia ao reafirmar a prevalência da sua lei fundamental, a Constituição Polaca, sobre o direito europeu em contrário. Contudo, é preciso dizer que não é a primeira vez que tal sucede e outros Tribunais Constitucionais, como o da Alemanha e da Itália, adotaram no passado decisões semelhantes.

Convém também esclarecer que o princípio do primado é um dos princípios fundamentais mais controversos da ordem jurídica da União e resulta de um litígio que deu origem ao acórdão Costa c. ENEL.

Tudo começou quando Flaminio Costa, advogado em Milão, se recusou a pagar a sua conta de eletricidade, no valor simbólico de 1,925 libras, como forma de protesto contra a lei italiana de nacionalização da energia elétrica, que considerou ser incompatível com certas disposições do então Tratado CEE.

Flaminio Costa impugnou esta decisão junto de um tribunal nacional que, tendo dúvidas de interpretação das normas comunitárias recorreu ao Tribunal de Justiça através do mecanismo do reenvio prejudicial.

Este declarou em 1962, pela primeira vez, o primado do Direito da União face ao Direito nacional, o que implica que, em caso de conflito, o direito da União prevaleça sobre o direito nacional dos Estados-membros em contrário.

Porém, esta situação não é nova e surgiu noutros Tribunais Constitucionais, especialmente na Itália e na Alemanha, e na sequência, foi desenvolvida a doutrina dos contra limites que pretende impor balizas às limitações da soberania estadual decorrentes da afirmação da primazia do Direito Europeu.

Contudo, quando os Estados aderiram à União Europeia, enquanto organização de integração, sabiam que tal implicaria a transferência de atribuições e competências para o nível supranacional.

A questão é que embora a jurisprudência comunitária seja fonte de direito, o princípio do primado não se encontra inscrito nem nos Tratados originários, nem nas suas subsequentes alterações.

Noutra vertente, várias vulnerabilidades afetam o Tribunal Constitucional da Polónia, o que não aconteceu com outros, dado que este não respeita as garantias de imparcialidade e de independência, nem assegura o direito a um processo justo e equitativo, em conformidade, nomeadamente, com a Convenção Europeia dos Direitos Humanos.

Porém, tudo indica que a Comissão Europeia não irá ceder às chantagens da Polónia e irá retaliar através de uma eventual ação por incumprimento por violações graves dos valores europeus e usar a poderosa arma dos fundos europeus, designadamente para bloquear o seu acesso a 121 mil milhões de euros em fundos para o desenvolvimento regional até 2027 e, eventualmente, reprovar a sua candidatura a 36 mil milhões de euros do Mecanismo de Resolução e Resiliência.

Aguardemos, pois, os próximos desenvolvimentos deste caso, sob o lema de fundo Money makes Poland go round.