A Geórgia tem vindo a ser assolada nos últimos dias por violentos protestos junto ao parlamento, em Tbilisi, com o objetivo de impedir a aprovação de uma lei sobre agentes estrangeiros. Visava essa lei registar Organizações Não Governamentais (ONG), comunicação social e outras entidades financiadas por organismos estrangeiros. Todas as organizações sem fins lucrativos e de media, com um orçamento financiado em mais de 20% por entidades estrangeiras, deveriam ser registadas como agentes estrangeiros.

Com essa lei, as organizações em questão passavam a ter de declarar quem as financia. Com a transparência que proporcionava, a sua influência na sociedade corria o risco de vir a ser severamente afetada. Não será, por isso, de estranhar que cerca de 300 ONG tivessem assinado uma petição a condená-la.

Os manifestantes acusaram os legisladores de preparar uma lei que visava reprimir a sociedade civil e atingir os media independentes. Afirmavam ainda que impediria a adesão do país à NATO e à União Europeia (UE). Num país como a Geórgia, permanentemente assolado pela interferência externa, faz sentido estabelecer um quadro legal que o proteja da ingerência de agentes estrangeiros nos seus assuntos internos.

Os EUA clamaram ser a lei similar a uma lei aprovada na Rússia, em 2012, ao abrigo da qual o Kremlin encerrou várias ONG acusadas de apoiar políticos oposicionistas, omitindo, no entanto, o facto de disporem de uma lei semelhante, aprovada em 1938 – Lei de Registo de Agentes Estrangeiros dos EUA (FARA) – que exige a divulgação das pessoas que façam lóbi nos EUA, em nome de governos estrangeiros. O Canadá irá também criar um registo de agentes estrangeiros, como já existe na Austrália.

O partido no poder, que desde 2012 tem vindo a ganhar sucessivamente as eleições, passou convenientemente a ser acusado de pró-Moscovo, apesar de nunca ter desistido da ambição do país aderir à NATO e à UE. Contudo, para desagrado de alguns, essas opções de política externa não o inibiram de estabelecer um diálogo com Moscovo, dada a dependência económica e geopolítica do seu vizinho.

Para desilusão de Washington e Kiev, Tbilisi não se enredou num conflito com a Rússia, para onde estes a empurravam, desde fevereiro de 2022. Esse sentimento esteve patente nos protestos, quando os manifestantes gritavam “Sukhumi,“ o nome da capital da Abecásia. Com a memória de 2008 presente, Tbilisi sabe exatamente quais seriam as consequências dessa aventura. Não cedeu e não alinhou em criar uma segunda frente contra a Rússia.

Segundo um dos instigadores dos protestos, Vano Merabishvili antigo primeiro-ministro e ministro do Interior, apoiante do antigo presidente Saakashvili, o objetivo confesso destas ações é realizar um golpe de estado. Segundo ele, a “Ucrânia não está sozinha”. A “nova liderança georgiana combaterá a Rússia e apoiará Kiev em tudo”. “Somos praticamente aliados; devemos estar juntos e juntos devemos celebrar a vitória não apenas sobre a Rússia, mas também da entrada na UE, na NATO.”

Como em Kiev-Maidan, em 2014, também agora Washington esteve por detrás desta tentativa de golpe de estado sedicioso com o objetivo de derrubar um governo democraticamente eleito, demonstrando assim que o leitmotiv da sua ação não é a luta pela democracia, mas sim a consolidação do seu projeto geopolítico hegemónico. Como sempre, a geopolítica acabou por falar mais alto. Por isso, a servil UE mandou o normativismo às urtigas.