A possibilidade da vinda de Donald Trump a Lisboa tem vindo a alimentar a discussão sobre os verdadeiros objetivos dessa eventual e curta visita. Os murmúrios, que fontes oficias se recusam obviamente a confirmar, colocam a tónica em assuntos de cariz económico e militar. No primeiro caso, o porto de Sines é apresentado como uma hipótese para o investimento norte-americano. No segundo caso, a Base das Lajes volta a estar no centro das atenções, depois da decisão unilateral dos EUA de redução do contingente aí estacionado, ato que transformou a outrora little America na atual gas and go.

Porém, em ambos os casos, há outro interlocutor que, desde há muito, vem traçando uma estratégia expansionista que vê em Sines e nas Lajes dois pontos de inegável valor geoestratégico. Trata-se da República Popular da China. Daí que o país de Xi Jinping já tenha manifestado interesse no porto do litoral alentejano, visto como uma porta de entrada para a Europa e para África. Por isso as paragens – ditas técnicas –  que altas individualidades de Pequim têm feito na Terceira.

O cenário é complexo. Nada que incomode Marcelo Rebelo de Sousa que, numa conjuntura marcada pela crispação aduaneira sino-americana, visitou os dois países e fez questão, em ambos os casos, de salientar o bom relacionamento que Portugal mantinha com o país que o estava a receber.

Só que a existência de dois potenciais interessados está longe de se reduzir a uma oportunidade de esticar a corda das exigências de forma a garantir o máximo de dividendos possíveis. Sines e Lajes não representam ativos da mesma natureza.

Se na costa alentejana parece possível a compatibilização do investimento das duas maiores potências económicas mundiais, o mesmo já não se passa com as Lajes, onde existe uma base aeronaval portuguesa na qual os EUA dispõem de um vasto leque de direitos decorrentes da transformação de um ultimato numa aliança por procuração. Um acordo que, para Portugal, assume a forma de tratado e, por isso, foi ratificado pela Assembleia da República, mas que, para os EUA, não passa de um Executive Agreement que apenas responsabiliza a Administração e não o país.

Acreditar que Trump vai abrir mão das Lajes ou aceitar a presença chinesa na base, ainda que na esfera científica e tecnológica, representa uma utopia, sabendo-se que é o pragmatismo e alguma falta de reflexão que ditam as decisões de um presidente que pretende vender armas no valor de 2,22 biliões de dólares a Taiwan. Exemplos desse pragmatismo interesseiro não faltam. O processo de descontaminação dos solos e dos aquíferos junto à Base das Lajes como o caso mais recente.

Voltando aos murmúrios da visita de Trump, sobretudo àquele que dá conta de um reforço da presença norte-americana nas Lajes, convém seguir o exemplo de São Tomé e, mantendo-nos no campo da religião, ter fé que a parte portuguesa tenha a coragem e a preparação de que não tem dado provas à mesa das negociações. Um processo sempre marcado pelo receio de incomodar o Tio Sam.

Os anos que venho dedicando ao estudo da questão das Lajes e à expansão chinesa talvez me autorizem a deixar um aviso. Assim, nem a Terceira é apenas a Base das Lajes nem os Açores são somente a Terceira. Daí as visitas do ministro do Mar chinês a vários pontos do arquipélago.