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Presidência de Trump marcada por várias tensões entre Washington e Lisboa devido a empresas chinesas

Os investimentos de empresas chinesas na EDP, na Mota-Engil e na rede de telecomunicações 5G foram os principais focos de tensão entre os dois países enquanto Donald Trump esteve na Casa Branca.
  • Dan Brouillette, secretário da Energia dos EUA, na visita à central de Sines
20 Janeiro 2021, 08h10

A presidência de Donald Trump ficou marcada por vários momentos de tensão entre Lisboa e Washington devido ao investimento chinês em Portugal. As mensagens do Governo norte-americano foram muito regulares em relação à presença da CTG na EDP, pois a elétrica é a quarta maior operadora eólica nos Estados Unidos. O secretário da Energia dos EUA veio a Portugal em fevereiro de 2020 para alertar para os riscos e avisar que o seu Governo estava preparado para atuar para travar a presença da CTG nos Estados Unidos.

Mas também a presença da chinesa Huawei na rede 5G em Portugal mereceu várias críticas a partir de Washington, incluindo do responsável máximo pela diplomacia norte-americana, Mike Pompeo, durante uma visita a Lisboa no final de 2019.

CTG na EDP

Em plena oferta pública de aquisição (OPA) lançada pela China Three Gorges (CTG) sobre a EDP, para aumentar a sua participação na elétrica nacional, o embaixador dos EUA em Portugal veio a público avisar que o seu Governo está preparado para travar a operação.

A 15 de março de 2019, o embaixador dá uma entrevista exclusiva ao Jornal Económico onde revela que o seu Governo está preparado para chumbar a OPA da CTG sobre a EDP. “Se a China Three Gorges insistir em continuar, o CFIUS [Comité para os Investimentos Estrangeiros nos Estados Unidos] tem o poder para impor essa venda”, declarou o diplomata.

“A EDP controla 80% da energia elétrica em Portugal. Do ponto de vista dos Estados Unidos, do ponto de vista de negócios, como do meu ponto de vista pessoal, não deve haver uma entidade estrangeira a deter a vossa energia elétrica. Deve ser controlada pela Nação ou pelos privados sob regulação nacional. Não é o caso do que está a ocorrer com a EDP”, começou por dizer o embaixador escolhido por Donald Trump para Portugal.

“Por isso, opomo-nos absolutamente a esse negócio. Ora, a EDP está localizada nos Estados Unidos. Em nenhuma circunstância os chineses vão controlar o que a EDP tem nos Estados Unidos, o terceiro maior produtor de energia renovável”, garantiu o diplomata norte-americano sediado em Lisboa.

O risco regulatório da operação encontrar entraves numa das suas geografias era real: como uma empresa presente em cerca de 20 países, a OPA carecia de dezenas de aprovações regulatórias incluindo a da Comissão Europeia em Bruxelas e pelo Governo de Trump e Washington.

Mais de um mês depois, a 24 de abril, 56% dos acionistas da EDP (precisava de 66,6%) rejeitaram o fim do limite de votos de 25% na elétrica. Esta era uma das condições de sucesso para a OPA da CTG.

Já com a OPA da CTG morta e enterrada, o Governo de Trump regressou a Portugal em fevereiro de 2020 com uma mensagem clara: o investimento chinês na EDP pode vir a ser um “problema”.

“Espero que empresas norte-americanas invistam na EDP. Queremos que se torne maior no mercado norte-americano”, declarou então o Secretário da Energia dos Estados Unidos da América (na foto).

Questionado sobre se a presença da CTG no capital do grupo EDP pode vir a ser um problema para a empresa nos EUA, mesmo depois da Oferta Pública de Aquisição (OPA) da CTG ter falhado, o governante apontou que pode vir a representar um problema, à medida que a empresa cresce nos EUA.

“A preocupação é, à medida que a EDP cresce nos Estados Unidos, e esperamos que continue a crescer, a presença do investimento chinês na EDP pode representar problemas, à medida que o crescimento continua. E é isso que vamos avaliar muito diretamente”, afirmou Dan Brouillette.

Huawei na rede 5G

O investimento da empresa chinesa na rede 5G em Portugal foi outro foco de tensão nas relações entre Lisboa e Washington durante a presidência Trump.

Em novembro de 2019, o assessor de Donald Trump para a tecnologia veio à Web Summit em Lisboa criticar os países que cooperam com a Huawei no 5G.

“Os países continuam a considerar abrir os seus braços a empresas chinesas de forma a construir infraestruturas críticas como o 5G e desenvolver tecnologias essenciais como inteligência artificial. A lei chinesa obriga todas as empresas chinesas, incluindo a Huawei, a cooperar com os seus serviços de inteligência e de segurança, independentemente de onde a empresa opere”, disse Michael Kratsios na altura.

“O Governo chinês construiu um avançado Estado autoritário ao distorcer tecnologia para dar preferência à censura em vez da liberdade de expressão. Através do seu grande sistema de censura, a grande firewall, o Governo chinês viola a privacidade de todas as pessoas no seu país, ao monitorizar comunicações online e bloqueando acesso à informação”, destacou o assessor de Donald Trump para a tecnologia.

“O partido comunista chinês usa tecnologia para controlar e impressionar dissidentes, ativistas, e minorias, incluindo os muçulmanos uigures. Degradam a dignidade individual de cidadãos chineses, ao implementar um distópico sistema de pontuação, e o Governo chinês continua a alargar o seu autoritarismo no estrangeiro, e em nenhum caso isto é mais claro do que a Huawei”, afirmou.

Mais recentemente, em setembro de 2020, o embaixador George E. Glass alertou para os riscos da presença da Huawei na rede 5G.

“Se não tivermos parceiros confiáveis na rede de telecomunicações portuguesa, mudará a forma como interagimos com Portugal em termos de segurança e de defesa. Temos feito chegar esta mensagem alto e a bom som: a forma como trabalhamos com a NATA ou como trocamos informações classificada será afectada. Se tivermos confiança nas telecomunicações, seremos capazes de continuar a relacionar-nos como no passado. Se não tivermos, teremos de mudar a forma como comunicamos com Portugal”, disse o então embaixador dos EUA em Lisboa em entrevista ao Expresso.

Chineses da CCCC na Mota-Engil

Mas houve mais empresas a serem criticadas, como no caso da Mota-Engil que “vendeu 30% da companhia por 30 moedas de prata” à chinesa CCCC, tendo chegado a admitir a possibilidade de “sanções”.

“É uma empresa bandeira de alta qualidade que agora tem uma enorme influência de uma entidade estrangeira. Se forem fazer negócios em Angola, em Moçambique ou no México, esses países têm respeito por uma empresa portuguesa de topo. Mas agora devem ter a consciência de que há uma influência maligna que pode ter intenções diferentes em relação ao negócio”, afirmou o diplomata ao Expresso.

State Grid na REN

Também a operadora das redes de transporte de gás natural e de eletricidade esteve debaixo do escrutínio do Governo de Trump, devido ao facto do seu maior acionista ser a chinesa State Grid.

Num encontro com jornalistas em Lisboa em fevereiro de 2020, durante a sua visita a Portugal, o Secretário da Energia norte-americano foi questionado se considerava que o facto da REN ter um acionista maioritário chinês era um risco para a segurança das infraestruturas energéticas nacionais, e se, neste cenário, as empresas norte-americanas deviam investir na REN. Em resposta, Dan Brouillette defendeu um maior escrutínio sobre o investimento chinês na REN pelas autoridades portuguesas.

“Vou deixar isso para os decisores políticos em Portugal, se isso representa ou não uma ameaça para a infraestrutura em Portugal”, disse Dan Brouillette na altura.

“Vou limitar os meus comentários às ameaças potenciais para as infraestruturas vitais dos Estados Unidos, ao ponto de, se representarem ameaças, vamos tratar delas muito diretamente”, afirmou.

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