15 de agosto é uma data histórica. É o dia da rendição dos japoneses na Segunda Guerra Mundial. Em termos económicos, é o aniversário da intervenção de Nixon na televisão a anunciar o fim da convertibilidade do dólar.

Foi a consagração do Exorbitante Privilégio, o termo criado por Giscard d’Estaing, erradamente atribuído a de Gaulle, para designar o dólar, que permite aos EUA financiar qualquer défice de pagamentos imprimindo moeda.

Os outros países, que pagam em dólares, têm que os ganhar no mercado internacional, produzindo e vendendo bens e serviços; os EUA só têm que os imprimir.

Foi também o fim do último receio ao seu uso: transformar as reservas de dólares em ouro, indo buscá-lo ao Tesouro americano, porque o dólar era “as good as gold”. Foi o que fez de Gaulle, e forçou Nixon a agir.

Foi o fim do dólar convertível e dos câmbios fixos, o adeus ao sistema de Bretton Woods. Passou-se a viver sob o não-sistema monetário internacional, particularmente depois do fracasso do Smithsonian Agreement. O resto é história.

Os EUA descobriram que estavam melhor assim, com menos regras e menos restrições. Uma moeda de reserva é, de facto, um exorbitante privilégio. Nem havia sequer que recear um pouco de inflação: que importa se os preços sobem e o dólar perde valor, se para pagar basta imprimir dólares?

E assim, com Ronald Reagan os EUA passaram de primeiro credor mundial a primeiro devedor mundial. Ter a moeda de reserva é um privilégio que explica a antipatia americana com a criação do euro e os ataques que foram movidos ao seu papel e credibilidade.

Hoje tudo é mais difícil. A ascensão da China e o declínio dos EUA representam uma ameaça maior ao atual estado de coisas que o euro alguma vez foi; as cibermoedas e os ciberataques são um perigo de perturbação à ordem económica e às bases do funcionamento do atual sistema – terminar com a nossa vida eletrónica seria voltar à Idade da Pedra.

Se viver com um vírus é mau, como seria sem teletrabalho, internet, redes sociais e multibanco? Impensável.

As guerras mais importantes de hoje são invisíveis, passam-se no ciberespaço, custam milhares de milhões e decidem eleições. Isto obriga a decisões estratégicas, resistir à tentação das vitórias de curto prazo para perder a guerra a longo prazo.

Mas a retirada do Afeganistão fragilizou Biden. Quem, em Taiwan ou na Coreia do Sul pode confiar nos americanos? Onde está o America’s back da primeira intervenção de Biden após tomar posse? Traiu ou não os que os EUA aliciaram para aliados?

Depois de um fracasso desta dimensão da sua política externa, Biden não pode ter fracasso igual na frente interna, na sua política económica. É bom que tenha muito cuidado no desenho dos estímulos à atividade económica, da saída do quantitative easing e do tapering, ou os democratas correm o risco de não se sentarem na Casa Branca durante muito tempo.