Requisitos de competência para reflexão coletiva

O Decreto-Lei 55/2018 manifesta a vontade política de as escolas e os professores assumirem no terreno a responsabilidade de, nas suas margens de liberdade, cofabricarem autonomia de facto por via curricular, considerando que se trata de uma necessidade adaptativa para as especificidades dos alunos em contextos particulares e o desenvolvimento de competências para atuar num mundo em acelerada transformação.

Neste quadro, este diploma salienta muitas vertentes de ação que devem ser ponderadas e decididas entre dirigentes, professores, e, cito, “em diálogo com os alunos, as famílias e a comunidade”. Vertentes das quais, a título ilustrativo, saliento: gestão integrada do conhecimento, trabalho interdisciplinar, diversificação de procedimentos, adoção de diferentes formas de organização do trabalho escolar.

Donde se conclui que as escolas e os professores estão, pelo legislador, assumidamente em vasto processo de aprendizagem para resolver problemas que envolvem alteração de padrões de funcionamento organizativo e operacional no limite dos consensos emergentes e efetiváveis no tempo e com os recursos disponíveis.

Nuclear a este processo de mudança, encontramos como instrumento de produção, para o que aqueles atores entendam fazer, a capacidade para entre si gerarem inteligência sobre a determinação do que, e como, importa e é possível fazer. Ou seja, neste contexto a liderança aparece como dependente da capacidade de reflexão coletiva dos grupos/equipas.

Levanta-se então a questão neste domínio de em que medida temos no chão de escola: por um lado, as competências pessoais e coletivas, designadamente dos professores; e, por outro, os requisitos organizativos para o seu exercício.

Sucede que a reflexão coletiva está exposta a múltiplas disfunções bem conhecidas, entre outras: superficialidade e desarticulação no tratamento dos assuntos, escassez ou turbulência nas participações, competição entre os participantes.

E acontece que, sem preparação, o modo típico destes problemas serem enfrentados é: pela imposição de ordem, inibindo as participações; pela persuasão, anulando precocemente a sustentação da diversidade para aprofundamento das ideias e vontades; pela autoexclusão, desinvestindo da participação por convicção de a atividade ser improcedente; ou pela disputa, estabelecendo conflitos intcerpessoais/intragrupais, erodindo a coesão necessária para suportar as tensões próprias da prospeção social de possíveis.

A reflexão coletiva está exposta aos desafios da participação distribuída, da qual inexoravelmente depende. A verdade em grupo não é garantia de valor pelo que é importante estabelecer contraditório, ou seja, são necessários conflitos de tarefa (o que fazer) ou de processo (como fazer), sendo a regulação da controvérsia construtiva necessária e a competência para a estabelecer e levar a bom porto um desafio.

Somam-se requisitos chave como, por exemplo: contenção de palavra, escuta com sustentação de foco nos tópicos, cognição de segundo nível para deduzir ou explicitar implícitos, interrogação metódica para escrutinar o valor dos processos e dos resultados da reflexão…

A rendibilização da autonomia escolar para o desenvolvimento humano depende de reflexão coletiva de qualidade, e esta de competências para a sua liderança distribuída. Prevalecem as questões de em que medida estão os professores habilitados neste domínio, e, estando, poderem capitalizar as competências em horários que não estejam já desgastados.