Muito se tem falado e escrito acerca do Plano de Resiliência e Recuperação (PRR) no nosso país nos últimos meses. Um mecanismo, um plano, à escala europeia, na verdade com a contribuição quase total da Comissão e União Europeia (financiamento a fundo perdido, a título de emissão de dívida com juros, entre outras modalidades), para fazer face às consequências económicas e sociais da pandemia SARS-COV-2 Covid-19.

Conhecendo nós, a situação débil e muito frágil em que se encontra o nosso país, quer a nível económico, quer a nível dos seus determinantes sociais, este momento reveste-se de particular importância, aliás este é o momento para podermos dar “o salto” e sairmos de uma crise – que é sanitária – mas que é o “rosto” de um verdadeiro tsunami com contornos económicos e sociais intangíveis.

Com a pandemia sanitária, surgiu uma verdadeira pandemia na saúde, em particular na saúde mental, independentemente da nossa cor, religião, etnia, classe socioeconómica, ou até das idades. Na Saúde Mental basta referir as conclusões do estudo do Instituto Nacional Ricardo Jorge em que 7 em cada 10 portugueses experienciaram problemas de saúde mental – de moderada a grave – com a pandemia.

Ora, Portugal já apresentava a segunda pior taxa de prevalência de doença mental grave na europa e a quarta no mundo inteiro antes da pandemia, não é difícil, portanto, extrair conclusões evidentes do cenário que enfrentamos atualmente.

A nível económico, atualmente é possível comparar o impacto e a carga social em termos de custos diretos e indiretos que várias especialidades da saúde têm nas sociedades e o que constatamos é que a doença mental surge sempre ou em primeiro ou segundo lugar, com uma carga global de cerca de 10 a 15%. A Saúde Mental é a maior causa de reformas antecipadas e de baixas no trabalho e tem na depressão a maior causa de morbilidade.

Ora, apesar de reconhecer o esforço reformista que tem sido feito nesta área por parte dos organismos competentes na área da Saúde no nosso país, não é difícil perceber que o investimento da Saúde que temos atualmente – cerca de 4% – na saúde mental dos portugueses é ainda claramente insuficiente e insípido para adereçar os desafios do presente e do futuro a que todos somos convocados.

Nós temos um Plano Nacional para a Saúde Mental, e um Diretor, que é sobejamente reconhecido por todas as entidades internacionais competentes e aceite pelos agentes determinantes competentes a nível nacional, como nunca antes. É um excelente plano, pleno de respeito pela dignidade, direitos, garantias e liberdades destas pessoas que, pela sua condição de saúde, se encontram em situação de desvantagem social a vários níveis – por exemplo: acesso ao emprego, habitação, justiça, reinserção/reabilitação a nível familiar, entre muitos outros.

Ora, convém, porém, frisar que o PRR não é o Plano Nacional para a Saúde Mental (PNSM). O PRR pode e deve ser uma alavanca financeira para “recuperar o tempo perdido” numa reforma que tarda a ser implementada na sua plenitude há décadas.

Portugal vai usar 85 milhões do Plano de Recuperação e Resiliência para criar 40 equipas comunitárias capazes de fazer chegar os cuidados de saúde mental aos portugueses, com proximidade e intervenções mais especializadas, entre muitas outros investimentos, por exemplo, em centros de saúde, hospitais gerais e respostas de proximidade.

É um excelente “pontapé” na crise, e um excelente “pontapé” de “reinício” de algo que, já antes da pandemia, era imperativo e urgente concretizar no terreno no nosso país. Precisamos é que este PRR seja rápido na sua implementação e que seja tudo menos burocrático (ressalvando claro os mecanismos de controle e monitorização que se impõe por natureza).

Por fim, além da rapidez na implementação do PRR e de um incremento do investimento no desenvolvimento do PNSM, precisamos de uma coordenação nacional ou estrutura de missão que tenha uma clara autonomia de implementação. Precisamos de uma Coordenação “sem amarras” para implementar as reformas necessárias que terão o seu reflexo na saúde e na economia dos portugueses de forma significativa.