Quem quer o melhor do mundo? O Real Madrid poderá querer vender o trintão e interessados não faltam.
Corria a época de 1987/88 quando uma notícia sobre o eventual despedimento do então treinador do Vitória de Guimarães foi dada em primeira mão pelo Jornal de Notícias. Instado a comentar sobre a continuidade do técnico René Simões, Pimenta Machado, à época presidente dos vitorianos, limitou-se a proferir uma frase que se tornaria uma verdade incontornável que se confunde com o próprio futebol português: “O que hoje é verdade, amanhã pode ser mentira!”. René foi mesmo despedido e de lá para cá, sempre que há fumo há fogo, seja ele treinador do Guimarães ou o melhor jogador do mundo da atualidade. E em Madrid, fogo parece ser o que não falta no balneário dos merengues sobretudo depois da propalada festa de aniversário de Cristiano Ronaldo na capital espanhola, na ressaca da copiosa derrota por 4-0 (e sem espinhas) frente a um aguerrido Atlético Madrid. Poderá uma simples festa de aniversário ser o rastilho de uma transferência lá para o verão e o perfeito álibi para convencer os adeptos de que a venda do melhor do mundo é um mal necessário? É provável.
Festa (pouco) privada
Era para ser só para alguns mas acabou por chegar aos olhos de todos com um estrondo impressionante. Fruto da mistura explosiva entre smartphones e redes sociais (e da ânsia do cantor colombiano Kevin Roldán que fez questão de partilhar um vídeo onde cantava com o craque, algo que não foi bem visto por Cristiano), a festa da chegada aos trinta do melhor do mundo surgiu em todo o lado e nos mais diferentes ângulos possíveis. Cantoria, jogadores lesionados a darem um pézinho de dança e até moeda própria… houve de tudo um pouco na festa do ano… afinal, não é todos os dias que se faz trinta anos. Acontece que também não é todos os dias que o Real Madrid é cilindrado por 4-0 e a última vez que tinha perdido por tantos na Liga Espanhola, tinha sido há cinco anos. Duas horas e meia depois da humilhação e apesar do presidente dos merengues ter tentado demover Cristiano para cancelar os festejos, CR7 recebia, num luxuoso restaurante junto à urbanização onde vive, cerca de 150 pessoas. Casillas, Sérgio Ramos e outros espanhóis do plantel faltaram à festa onde até o técnico Ancelloti marcou presença mas nas horas seguintes ao evento, os adeptos do Real Madrid criaram a hashtag (#)LaFiestaDeLaDeshonra (a festa da desonra) e no centro de estágios dos merengues surgiu uma faixa onde se podia “Vuestra risa, nuestra verguenza” (o vosso sorriso, a nossa vergonha).
De “cortar à faca”
Ao que se diz em Espanha, o balneário do Real Madrid (um espaço difícil por natureza mas que tem sido magistralmente gerido por Ancelloti) voltou a ser o que era após a chegada aos 30 de Cristiano. O espaço que habitualmente ficava dividido por nacionalidades ou por contestatários e apoiantes do treinador, desagregou-se por um motivo inédito: entre os que foram à festa de CR7 e os que ficaram em casa a lamber as feridas da derrota frente aos colchoneros. A imprensa desportiva espanhola, que quase se divide pelos principais clubes do país, marcou posição. A Marca na defesa do aniversariante e o Mundo Deportivo a gozar o mau momento do Real Madrid. Entre críticas e elogios, começou a surgir o rumor de que este seria o momento certo para se comentar algo que é tabu a Madrid: a saída de Cristiano.
Há dois anos, em fevereiro de 2013, quando era incerta a renovação de contrato de Ronaldo com o Real Madrid (vínculo terminava em 2015), foi notícia que Florentino Pérez equacionou contratar jogadores como Bale e Isco para substituir o português. O craque português acabou por renovar mas, à cautela, Bale e Isco também foram contratados e pertencem hoje aos quadros dos blancos.
Na altura, a imprensa desportiva sublinhava a preocupação da direção merengue em não deixar sair o jogador a custo zero. Dois anos depois, a preocupação é outra e está relacionada com os trinta anos de Cristiano.
Pergunta para milhões de euros
“A sua cláusula de rescisão é de um bilião por isso vale um bilião. É impossível que alguém o contrate”, disse recentemente Jorge Mendes que não tem dúvidas: “se por algum motivo o clube o decidir vender por 300 milhões, alguém haverá de pagar”.
Apesar das três Bolas de Ouro e de ser absolutamente imprescindível no esquema de jogo de Ancelloti, a direção do Real Madrid já pensa a médio longo prazo e a questão de um milhão de dólares que se coloca na mente de Florentino Pérez (tendo como referência os exemplos dos craques Raúl Gonzalez e Hugo Sanchez que saíram do Real já em baixo rendimento) é clara: Vender Cristiano com 30 anos e efetuar o maior encaixe financeiro alguma vez garantido com a transação de um futebolista desta idade ou deixar o contrato correr até 2018 e deixá-lo sair com 33 anos sem receber qualquer quantia?
Após a renovação do contrato em 2013, o internacional português (que custou 94 milhões de euros ao Real Madrid) passou a auferir quase 20 milhões de euros por ano, tornando-se assim o futebolista mais bem pago do mundo: 15 milhões de euros limpos por temporada. Sabe-se que dinheiro não é problema para os merengues mas na estrutura merengue muitos veriam com bons olhos o alívio orçamental que seria provocado pela saída do atleta que mais ganha no luxuoso plantel blanco.
Por outro lado, uma manifestação de intenção de venda por parte do Real Madrid iria reacender a esperança de muitos clubes, sobretudo ingleses e da cidade de Manchester. O United, com muito dinheiro para gastar, faria tudo para ver regressar o melhor jogador da história da Premier League (votação conhecida no dia em que Ronaldo fez 30 anos) e melhorar os índices de rendimento de uma equipa que parece ter perdido a chama desde a saída de Ferguson; o não menos endinheirado City que encara a possível contratação de Cristiano como o passo que falta para se afirmar em definitivo como o grande rival do Chelsea na luta pelo título inglês. Existe ainda a possibilidade de rumar à cidade-Luz. O Paris Saint Germain tem muitos milhões de euros para gastar mas seus dirigentes sabem que a Ligue 1 não é suficientemente atrativa para um jogador que tem feito carreira a um nível altíssimo e sente-se capaz de o continuar a fazer.
“Se Ronaldo vai terminar a carreira no Real Madrid? Quase de certeza que sim. Terá 38 ou 39 anos, porque ainda tem muitos anos pela frente”, foram as palavras de Jorge Mendes há pouco menos de um mês, ainda na ressaca da terceira Bola de Ouro conquistada por Cristiano Ronaldo. Um mês depois, e como diria Pimenta Machado, o que então era verdade, amanhã poderá ser mentira.
José Carlos Lourinho