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Rapidez ou qualidade? De que precisa o jornalismo na era das ‘fake news’

Em debate num dos palcos da Web Summit, três dos mais reputados jornalistas políticos reconheceram que a profissão tem sido “ridicularizada” com a propagação das ‘notícias falsas’, sobretudo, nos Estados Unidos. A justificar o crescente alheamento e descrença nos media estão ainda as imprecisões, alimentadas pela pressa de dar a notícia ao minuto, e as tendências jornalísticas de privilegiar determinada ideologia política em detrimento de outra.
  • Sam Barnes/Web Summit
6 Novembro 2019, 16h07

Os desafios do jornalismo político na era das ‘fake news’ (notícias falsas) foi o tema de debate que juntou Dafna Linzer, editora-chefe de política do canal de televisão NBC, Tim Alberta, correspondente do ‘Politico’ e James Ball, editor do Bureau of Investigative Journalism (TBIJ), esta quarta-feira, num dos palcos da Web Summit.

Num painel moderado pelo jornalista Steve Clemons, do ‘The Hill’, os três convidados concordaram que o jornalismo é, nos dias de hoje, uma das profissões mais “ridicularizadas”, dada a propagação crescente de ‘fake news’, que vieram comprometer e levantar dúvidas em relação à informação que recebemos diariamente. O caso é sobretudo problemático no que toca ao jornalismo político, onde as ‘fake news’, com motivações e interesses suspeitos, encontraram terreno fértil para influenciar o sistema político.

“As pessoas não acreditam no jornalismo político porque nós confundimos qualidade com hábito. Continuamos a defender aquilo que fazemos, em vez de pensarmos em como devemos adaptarmos para tornarmos o nosso trabalho melhor e novamente credível”, afirmou James Ball.

Para o editor do Bureau of Investigative Journalism, a resposta que tem sido dada às ‘fake news’ tem sido “continuar a apostar em práticas já existentes e alterar o público-alvo”. “O que estamos a fazer é dizer que ‘o que estamos a fazer é correto e vocês [leitores] estão errados por não acreditarem mais nisso'”, indica, sublinhando que essa não é a solução para credibilizar os meios de comunicação social.

Tim Alberta acredita que a solução passa por uma clarificação da forma como são obtidas as notícias. “Temos de ser muito francos com as pessoas em relação ao que estamos a fazer e o porquê de estamos a fazer”, explicou, notando que “a crescente desconfiança em relação à imprensa” não deve ser ignorada.

Dafna Linzer considera que as ‘fake news’ são um problema que afeta, sobretudo, os Estados Unidos e que ganhou dimensão com a eleição de Donald Trump para a Casa Branca. A editora-chefe de política da NBC conta que, recentemente, Donald Trump proibiu uma biblioteca no estado da Florida de subscrever as publicações do The New York Times, acusando o jornal de divulgar notícias falsas. Mas o que são as ‘fake news’ e de onde vêm? “Esse é o nosso maior desafio”, sustentou, acrescentando que “há muitas teorias da conspiração”.

Às ‘fake news’, que têm descredibilizado a imprensa, juntam-se outros dois problemas que, de acordo com os oradores, tem contribuído para a insatisfação dos leitores: as imprecisões e as tendências informativas.

A pressa de dar a notícia ao minuto veio potenciar a divulgação de notícias imprecisas. “Temos de perceber que dar uma notícia primeiro não é a prioridade. É muito mais importante estarmos corretos. A pressão comercial obriga-nos a tal e, por isso, cometemos regularmente erros que podiam ser evitados”, defendeu Tim Alberta.

O correspondente do ‘Politico’ defende que a presidência de Donald Trump veio trazer “uma oportunidade aos jornalistas de recuarem e reconhecerem que o que, institucionalmente, há uma margem mínima para errar”.

“Há uma mentalidade no jornalismo, especialmente no jornalismo político e nos media de Nova Iorque, de que falamos uns com os outros, ouvirmo-nos uns aos outros, escrevemos uns para os outros e isso pode perpetuar-se e tornar-se uma espécie de ‘câmara de eco’, se continuarmos sem olhar para o que se passa fora disso”, indicou James Ball, introduzindo as tendências informativas como terceiro problema do jornalismo atual.

O editor do Bureau of Investigative Journalism considera que “a imparcialidade é um mau principio” e que “cada indivíduo tem as suas crenças e, por isso, é mais honesto, justo e autêntico se dizer logo àquilo que vem”. O mesmo defende Tim Alberta que reconhece que, “na maioria das redações, há um tendência implícita” para privilegiar uma ideologia em detrimento de outra, mas “o importante é ser honesto e reconhecer” isso.

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