As alterações climáticas são uma realidade com impacto alargado no ecossistema terrestre, evidenciadas por alguns indicadores reportados em 2021 pela Organização Mundial de Meteorologia: +1,1ºC temperatura média anual; +150% emissões CO2; +20cm nível do mar (vs níveis pré-industriais ~1900).

Para combater estes efeitos, a UE estabelece metas europeias que se desdobram a nível nacional, sendo que para Portugal as principais metas para 2030, em vigor no âmbito do EU Green Deal, são: redução das emissões de GEE entre 45%-55% vs 2005; 47% de energias renováveis no consumo total de energia; eficiência energética de 35%.

As metas acordadas a nível europeu não só aceleram a transição energética, como também se traduzem nos desafios de uma geração para os intervenientes no setor elétrico, em particular para os operadores das redes de distribuição (ORD) de eletricidade, que têm de desenhar e implantar soluções que satisfaçam e antecipem as necessidades do mercado, garantindo qualidade de serviço e segurança de abastecimento a um custo acessível, com impacto ambiental mínimo.

Os desafios dos ORD tornaram-se ainda mais exigentes em função do contexto geopolítico atual, com o preço da eletricidade a disparar nas bolsas europeias e a aceleração de projetos de fontes renováveis em detrimento dos combustíveis fósseis, como o gás natural.

Interessa, então, perceber quais os principais desafios que Portugal, e as nossas redes, têm pela frente em áreas determinantes como eletrificação do consumo, integração de geração distribuída e novos agentes e serviços.

A eletrificação da economia é uma das principais alavancas da transição energética e, de acordo com a Eurelectric, o aumento do consumo de energia elétrica em Portugal pode atingir +16% em 2030 vs 2021. Esta eletrificação será potenciada nos edifícios, indústria, mas, acima de tudo, nos transportes, com a adoção dos veículos elétricos, que já é uma realidade, particularmente em Portugal, onde existiu um crescimento de 89% na energia associada à mobilidade elétrica em 2021 vs 2020.

A integração de geração distribuída é um dos temas em que Portugal é referência e, como prova disso, o nosso país tinha a 5ª meta mais exigente da UE relativa à quota de energias renováveis, no horizonte 2020 (31%). A imprevisibilidade e volatilidade destes recursos levaram o ORD a adotar uma gestão mais ativa e flexível do sistema, recorrendo a mecanismos avançados de previsão e aumento da capacidade de hosting, o que tem possibilitado a ligação de mais centros electroprodutores, fazendo com que Portugal terminasse o ano de 2021 com 59% do consumo de energia elétrica abastecido por produção renovável.

Relativamente a novos agentes e serviços, a transição energética trouxe novos players como prosumers (~+50% nos 6M22 vs 6M21), comunidades de energia e agregadores, cujas necessidades também implicaram adaptações na área da gestão de energia e settlement. Estes novos modelos de mercado poderão contribuir para a flexibilidade do sistema elétrico, algo que já foi alvo de algumas provas de conceito e pilotos em Portugal, no âmbito de projetos europeus, e que será utilizado como ferramenta de gestão das redes de distribuição.

As soluções para esta revolução no setor elétrico serão encontradas na aposta nas redes inteligentes, onde Portugal tem já uma infraestrutura com +4M contadores inteligentes instalados, permitindo a realização de operações remotas e contribuindo para a melhoria da eficiência global do sistema. A digitalização e a analítica são também parte da resposta, na medida em que se constituem como enablers da incorporação de novas tecnologias, serviços e modelos de negócio que transformarão o setor.

Em suma, as redes de distribuição são a chave para uma transição energética justa e inclusiva, rumo à neutralidade climática em 2050 e, embora possamos celebrar algumas conquistas, o caminho é longo e desafiante. Citando Churchill, “não chegámos ao fim, nem sequer ao princípio do fim. Chegámos, talvez, ao fim do princípio”.