O episódio do Silicon Valley Bank não é apenas o segundo maior colapso de um banco nos EUA (tinha 209 mil milhões de dólares de ativos no momento do colapso; em 2008 o Washington Mutual tinha 434 mil milhões) – com forte probabilidade vai ter repercussões que extravasarão o campo estritamente económico e irá marcar a discussão nesta altura de aproximação da campanha presidencial.

Por outro lado, permitirá que a Reserva Federal americana (Fed) não seja o bode expiatório do desastre. Com efeito, a subida das taxas de juro fez cair o valor dos títulos do Tesouro. Se tomarmos os títulos a 30 anos, os de maior maturidade, o seu valor em 2022 caiu 39,2%, a maior queda desde 1754, diz Edward McQuarrie, professor emérito na Santa Clara University, que chama à inflação a kryptonita dos títulos do Tesouro. O problema é que subidas seguidas da taxa de juro é como tirar ketchup do frasco: várias sacudidelas não fazem nada, e depois, quando sai, sai um monte.

Agora, a questão para a Fed é qual é o risco para o sistema financeiro de novas subidas da taxa de juro, coisa que pode moderar o apetite – para a reunião de 22/03 do Open Market Committee a probabilidade de ser um aumento de 25 pontos base é 86%, 0 com 14%. Isto quando a criação de emprego em fevereiro (311 mil postos) ficou acima das expectativas, quando a taxa de desemprego estava a 3,4%, a mais baixa desde 1969, sinal de que a economia ainda tem que “arrefecer”.

Ora, o Silicon Valley Bank (SVB) tinha as startup tecnológicas como clientes, com aplicações de investidores num setor com boa rentabilidade. O Banco aplicou estes influxos em títulos do Tesouro, a colocação a prazo por excelência dado o baixo risco. Porém, a subida das taxas de juro levou a que os investidores retirassem dinheiro quando o valor dos títulos caia.

O SVB foi obrigado a vender 21 mil milhões de dólares de bonds com perdas significativas e a bank run que se seguiu (chegou a 42 mil milhões de dólares num único dia) levou ao colapso. A situação é diferente da do Signature Bank, que foi ao tapete por apostar nas criptomoedas.

Agora temos o clássico empurrar de culpas entre democratas e republicanos. Os primeiros sustentam que isto se deve a Trump ter reduzido o escrutínio dos bancos de média dimensão em 2018, numa de facto alteração do Dodd-Frank Act de 2010; os republicanos acusam os democratas de fazerem os contribuintes suportar o bailout para não perderem votos e uma base de apoio financeiro (as tecnológicas e a Califórnia são “território” democrata), e de disfarçar o fracasso de um woke bank, que sacrifica rentabilidade a ESG.

Isto desfoca de um lado mau da equação: salvam-se venture capitalists, que fazem aplicações com maior rendimento médio porque com maior risco, que não vão ter perdas; e já nem sequer é por se ser too big to fail. Há um problema de moral hazard envolvido: a ideia que a partir de agora o risco paga porque se a coisa correr mal o Estado salva.