No próximo dia 31 celebraremos o Dia Mundial da Poupança. Deveria ser uma efeméride com os olhos postos no futuro, mas a data corre o risco de ser encarada pelas gerações mais jovens como coisa do passado. O nível historicamente baixo de taxas de juro e os elevados níveis de impostos diretos sobre o rendimento das famílias, a par dos impostos indiretos sobre o consumo e sobre o património, reduzem a capacidade de acumulação em Portugal.

Fazendo um paralelismo, a poupança dos particulares é tão importante no desenvolvimento do bem-estar e da sustentabilidade financeira das famílias como a capacidade de as empresas se financiarem com capitais próprios e, por essa via, conseguirem a base de autossustentação dos investimentos que realizam no desenvolvimento da sua atividade. Simplificando, a prazo, não há capacidade de investimento sem capacidade de poupança.

Na gestão dos ciclos económicos, a poupança contribui crucialmente para a estabilidade financeira. No fundo, permite um salutar equilíbrio entre o dinheiro próprio anteriormente poupado e a alavancagem decorrente de um endividamento moderado. É como se fôssemos comprar um carro. É muito diferente comprarmos sem entrada inicial, recorrendo a endividamento a 100%, ou ter uma poupança para dar de entrada, reduzindo os encargos com as prestações ao longo do período do financiamento.

Isto, porque o impacto de futuras subidas de taxa de juro em empréstimos pode pôr em causa a capacidade de as famílias honrarem com os seus compromissos. Daí que seja muito salutar fazer-se uma análise sobre o impacto na prestação de uma subida de um ou dois pontos percentuais na taxa de juro a aplicar ao contrato.

A taxa de poupança sobre o rendimento disponível das famílias, que já atingiu este século valores próximos dos 11% em 2001 e 2002, está hoje em níveis historicamente baixos. Numa década, esse valor caiu de 10,4% para 4,6% em 2018. É menos de metade da taxa de poupança dos países da zona euro.

No Dia Mundial da Poupança, 31 de outubro, seria muito importante que a elaboração do Orçamento de Estado para 2020 ousasse anunciar novas medidas de incentivo à poupança. Deixo duas sugestões: o relançamento do incentivo fiscal à poupança de longo prazo, nomeadamente a alteração aos limites de dedução à coleta em sede de IRS das poupanças de complemento de reforma, e a revisão em baixa das taxas liberatórias sobre os juros de contas bancárias. Mas sem “truques”.

Ou seja, não penalizando a capacidade de poupança da classe média que, naturalmente, terá maior capacidade para poupar, pois o regime atual acaba por beneficiar mais na poupança quem não tem capacidade para a constituir, uma vez que sobre os limites de dedução dos benefícios fiscais prevalece o chamado limite da soma das deduções à coleta. Um verdadeiro entrave ao incentivo a poupar.

A poupança dos particulares é uma questão central para o desenvolvimento sustentável do país. Diria mesmo, um importante pilar da liberdade de escolha dos indivíduos. E, sempre que a política fiscal se fizer sentir, de forma desproporcionada, sobretudo junto da classe média, é esse equilíbrio, entre a solidariedade do Estado e a liberdade de cada um, que está em causa.