Há algo de magnético nas personagens autoconfiantes, provocadoras, desbocadas e de discurso simplista. Está-se sempre à espera, com curiosidade, para ver o que têm para anunciar ou prometer. Tal como o saudoso sinhozinho Malta, da novela Roque Santeiro. O homem para quem os problemas mais complicados se resolviam com a entrada em cena de um grupo de “capangas”, e as discussões terminavam com a pergunta “tou certo ou tou errado?”, insinuando implicitamente que não valia a pena contestar o que estava certo.

Parte do fascínio que estas figuras suscitam tem a ver com o facto de serem genuínos, terem os seus defeitos visíveis e um certo “salero”, em perfeito contraste com a plasticidade insípida e cinzenta de algumas figuras públicas tradicionais. Aqueles que os eleitores hoje em dia, um pouco por esse mundo fora, decidem castigar. Outra parte tem que ver com a resposta para tudo, a aparente solução para todos os males. Não havia nada que fosse suficientemente grave que Malta não pudesse resolver, e nada onde não pudesse intervir. Dava o alento e esperança que outros não conseguiam dar. Não importa que a forma como os problemas fossem resolvidos não resistisse a uns testes de lógica mais robustos. Isso ficava para segundo plano.

Mas, se numa obra de ficção, estas caraterísticas até servem para nos captar a atenção, prender a um ecrã e pôr um sorriso na cara, já na vida real perdem rapidamente a graça. Podemos substituir acima Malta por Trump sem perder qualquer sentido e até ganhar actualidade. Só que o mundo é um pouco mais complexo que uma fazenda em Asa Branca, e Trump tem que provar que é muito mais do que este “bully do recreio”.

Para já há quem opte por lhe dar o benefício da dúvida. Há até quem o nomeie Personalidade do Ano, caso da revista Time. Vale o que vale. Relembro a propósito que Hitler, uma das mais execráveis figuras da história da humanidade, também o foi em 1938. E Trump substitui Angela Merkel, um dos poucos faróis de tolerância e inclusão que restam nesta Europa estraçalhada, o que nos faz pensar sobre a coerência nos critérios de nomeação desta gente… É claro que, até por interesse próprio, por aquilo que representa uma certa ordem mundial, estaremos a torcer para que as coisas corram bem. Mas cabe-lhe apenas a ele escolher como quer ficar para a história. E o Mundo não perdoará se não se mostrar à altura do cargo para o qual foi eleito.