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“Sistema financeiro consegue agora decidir se e que inovações avançam ou não”, aponta Peter Blom

Numa altura de grandes transformações nas economias ocidentais, os problemas no sector financeiro podem ser um entrave considerável, além de o atual paradigma não favorecer o financiamento a pequenas e médias empresas, aponta o antigo diretor executivo do Triodos Bank.
8 Junho 2023, 10h07

Para poder continuar a financiar o sector produtivo da economia, sobretudo numa altura de disrupção e inovação, o modelo da banca deve ser revisto, evitando situações de ‘demasiado grande para cair’, mas permitindo a margem suficiente para incorrer em projetos com mais risco. Peter Blom, antigo diretor executivo do Triodos Bank, defende ainda que a relação dos bancos com os empreendedores deve assentar na confiança, dado que o investimento em inovação pode demorar a dar resultados visíveis, embora seja importante definir o que é realmente inovador.

O fundador e antigo líder do Triodos bank esteve à conversa com o JE, onde pôde expor alguns dos aspetos críticos da banca atual num prisma de sustentabilidade e inovação. À luz dos problemas recentes nos sistemas financeiros americano e europeu, com as falências dos bancos regionais nos EUA e a compra forçada do Crédit Suisse, Peter Blom confessa que esperava que estas situações tivessem ficado acauteladas depois da crise de 2008-2012.

“Temo-nos debatido bastante sobre qual deve ser o papel da banca na sociedade”, começa por referir. O problema passa bastante por um paradigma em que “os lucros são privados e as perdas são nacionalizadas”, o que cria um problema claro de risco moral, em que os agentes não são responsabilizados pelas suas ações, tendo assim um incentivo tácito para agir de forma irregular.

Isto levanta a questão sobre como limitar a probabilidade de problemas desta natureza. Por um lado, há quem advogue por limites ao tamanho dos bancos, o que levanta a questão sobre como determinar esse limite; por outro lado, ao deixar bancos ruir, o custo social pode ser elevado demais, o que cria outro tipo de problemas.

Ao mesmo tempo, o aumento de regulamentação, sobretudo na Europa, tem levado a aumentos consideráveis de custos, o que reforça o argumento da banca de que só através da escala é possível atingir uma rentabilidade razoável, relembra Peter Blom.

No entretanto, e enquanto estes problemas não são abordados, “o sistema financeiro consegue agora decidir se e que coisas avançam ou não”, o que confere a este sector um poder tremendo na sociedade.

Na Europa, esta realidade é agravada por margens muito pequenas, regulamentação extensa e apertada e, sobretudo, pela falta de alternativas maturas e credíveis ao financiamento tradicional na banca. Um caminho seria por capitais de risco mais forte, com maior literacia financeira entre a população e de forma a poder financiar pequenas e médias empresas (PME), para quem o atual sistema não tem funcionado.

“O mercado de capitais europeus é bom para as empresas nos 10% ou 20% do topo, mas para as PME é demasiado caro”, defende Peter Blom, pedindo também uma redução nos requisitos de capital definidos pela Comissão para estas empresas. Ainda assim, é preciso cuidado com a regulamentação nestas formas alternativas de financiamento.

“Como se regula estes agentes alternativos de forma a dar confiança às pessoas de que as coisas estão a ser feitas de forma correta, mas sem criar regras tão pesadas que repliquem o problema atual dos bancos?”, questiona, colocando o ênfase neste tópico.

Uma dimensão que Peter Blom argumenta tem agravado estes problemas é o excesso de liquidez nas economias europeias e americana, que criam incentivos para que “o dinheiro circule só de um lado para o outro sem criar valor”. Tal traduz-se num desequilíbrio entre a economia real e o mundo financeiro que, no limite, acaba por financiar produtos novos, como as criptomoedas, que, apesar de assentarem numa tecnologia válida, robusta e verdadeiramente inovador, “não são, por si só, inovação”.

“É preciso redirecionar novamente a inovação para o serviço da economia real. Pessoalmente, preferia ter estes jovens brilhantes a trabalhar em novas formas de engenharia, agricultura ou construção em vez de se focarem em derivadas matemáticas. Às vezes temos de dar um passo atrás e perguntarmo-nos de que forma estão estas pessoas a contribuir para resolver problemas reais do mundo”, remata.

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