Soares é grande porque foi um visionário que conseguiu conduzir o seu povo pelo caminho certo da História, rumo à liberdade e ao desenvolvimento, fugindo à sina de Kerensky português que muitos lhe vaticinavam nos idos de 75. Para o bem e para o mal, Soares é o que, à sua pequena escala, Portugal tem de mais parecido com um Churchill ou um De Gaulle: como estes, Soares é um grande homem, mas igualmente um ser convencido da sua própria importância. Com mau perder, como se viu quando falhou a eleição para a presidência do Parlamento Europeu, derrotado por uma senhora a quem apelidou de “dona de casa”. E por vezes arrogante, como se viu quando mandou um guarda da PSP “desaparecer”. Por fim, amigo do seu amigo, nunca teve problemas em apoiar publicamente políticos suspeitos de corrupção, déspotas africanos e banqueiros caídos em desgraça.

Há quem não lhe perdoe estas e outras coisas, bem como o seu papel no processo de descolonização (que, provavelmente, estava condenado à partida a correr mal), mas tudo isto é secundário quando comparado com o que fez por Portugal: foi graças a Soares e a outros líderes moderados que o nosso País não se transformou numa Albânia da Península Ibérica e optou antes pelo caminho da democracia, da economia de mercado e da integração na União Europeia.

Devemos, por isso, muito a Soares, sem diminuir a gratidão que também merecem figuras como Salgueiro Maia – exemplo maior de coragem e integridade – e todos os valentes que arriscaram a vida pela liberdade, antes e depois do 25 de abril.
Afonso Costa, António de Oliveira Salazar, Álvaro Cunhal e Mário Soares foram os quatro grandes da política portuguesa no século XX. Porém, apenas o último dos quatro deixará como legado um país livre, democrático, tolerante e aberto ao mundo. Realçar isto é, provavelmente, o melhor elogio que podemos fazer a Mário Soares.

Nota: Um advogado de uma grande sociedade portuguesa foi constituído arguido no âmbito da Operação “O Negativo”. Quando um advogado é constituído arguido, é colocado em causa o segredo profissional e prejudicadas as garantias de defesa dos seus clientes. Não deixa de ser preocupante que este tipo de situações ocorram cada vez mais e as autoridades devem explicar de forma clara o porquê destas decisões. Investigar os advogados não pode passar a ser um modus operandi por parte das autoridades.