A seca em Portugal não é algo que nos seja estranho. E, precisamente, por não ser estranho, mas, sobretudo, por ser um fenómeno cada vez mais recorrente no nosso país, seria expectável que estivéssemos mais preparados para quando com ela somos confrontados. Contudo, mais parece que continuamos a fazer fé em São Pedro e que só quando este nos falha bradamos aos céus.

Nos últimos 65 anos, Portugal Continental registou sete episódios de seca com maior grau de severidade. Alguns de nós guardarão ainda na memória algo do que foi a última seca de maior severidade, em 2004/2005, que afetou 100% do território e que mais intensidade registou, dado o número de meses consecutivos em seca severa e extrema.

Na televisão e nas capas de jornais, multiplicavam-se as imagens de albufeiras muitíssimo abaixo da cota, paisagens despidas de vegetação verde e solos gretados, resultando num custo superior a 285 milhões de euros. Rapidamente, essas imagens deram lugar a um país engolido pelas chamas. Se 2017 ficará para a história como um dos anos mais fatais dos incêndios em Portugal, em área ardida o pior registo continua a ser o de 2003 e, em número de ocorrências e de perdas económicas, o ano de 2005.

Até ao passado dia 15 de fevereiro, choveu apenas 7% do normal em Portugal para a época do ano e 91% do território encontrava-se em seca severa e extrema. A história tende a repetir-se, contudo, espera-se que não se repitam erros do passado.

Em 2005, a Comissão para a Seca alertava que a “situação de seca deve ser encarada como um desafio para a adoção de práticas do uso eficiente da água e de adequação das atividades humanas às capacidades do território”. Frisava ainda que “a melhoria da ação para minimizar as consequências das situações de seca implica uma nova visão do problema, de modo a focar a prevenção e a mitigação”. Portugal tem tido, no papel, inúmeros planos e estratégias que, se pensados e implementados mais eficazmente, poderiam contribuir para um tal fim.

Olhando, porém, para os registos públicos, não podemos deixar de nos perguntar o que resultou de concreto do Plano Nacional para o Uso Eficiente da Água cuja vigência terminou em 2020? O que se lhe seguiu? Por que não avança o Governo com um Plano Nacional da Água adaptado às Alterações Climáticas, tal como propõe o PAN? Por que razão se avança, em contraciclo, com medidas que contribuem para o aumento de áreas com espécies, como o eucalipto, mais exigentes em termos de pegada hídrica?

Por que razão continuamos a não apoiar quem opta pela agricultura biológica em detrimento do modo intensivo e superintensivo que empobrece o solo e contamina os recursos hídricos? E por que se avança com um plano de regadio que, a prazo, poderá contribuir para o contrário ao pretendido e resultar num aumento do consumo de água e a uma redução da resiliência hídrica dos territórios, com perdas irreparáveis para os valores naturais a submergir?

Porque, “estranhamente”, querem perpetuar a crença de que estamos reféns do pilar da economia, enquanto fazem de conta que sem o fator ambiental podemos ter futuro.