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TAP: dos aumentos, à greve dos pilotos que não aconteceu e onde fica o contribuinte nesta história?

Da perspetiva do contribuinte interessava que, quando lêssemos notícias sobre a TAP, a empresa e o Governo pudessem explicar aos portugueses um plano detalhado e claro para levar a TAP a ser uma empresa financeiramente sustentável e próspera e quando é que estariam reunidas as condições para a empresa proceder à devolução dos 3,2 mil milhões de euros de apoios aos contribuintes.
8 Julho 2022, 06h45

Começamos esta semana com a notícia que os Pilotos da TAP não iriam avançar para uma greve, após a TAP ter decidido unilateralmente rever o salário mínimo na empresa para 1.410 euros e reduzir unilateralmente o corte salarial dos pilotos em 10%.

À partida, e apenas tecendo considerações superficiais e à primeira vista, diria que é sempre positivo não existir greves numa altura crítica como o Verão em Portugal e que o bom senso imperou…
Mas, analisando em maior pormenor, do ponto de vista do contribuinte (ou seja, todos nós) existe aqui um conjunto de questões que levantam alguma perplexidade (para não dizer semi-indignação) em todo este caso e que é importante enquadrar.

Ora vejamos, Portugal é um país pobre, tem um tecido empresarial assente em pequenas e médias empresas, sendo que o conjunto de todas as empresas de Portugal geram aproximadamente, por ano, cerca de cinco mil milhões de euros em receita de IRC.

Este mesmo país (pobre), erradamente, ou não, injetou 3,2 mil milhões de euros, em apoios já prestados e a prestar à TAP, ou seja, a maioria da receita fiscal gerada por todas as empresas do país (incluindo a própria TAP), nesta companhia aérea.

Assim, da perspetiva do contribuinte interessava que, quando lêssemos notícias sobre a TAP, a empresa e o Governo pudessem explicar aos portugueses um plano detalhado e claro para levar a TAP a ser uma empresa financeiramente sustentável e próspera e quando é que estariam reunidas as condições para a empresa proceder à devolução dos 3,2 mil milhões de euros.

Em vez disso, lemos nas notícias que a prioridade da TAP foi decidir unilateralmente aumentar o salário mínimo da empresa para 1.410 euros e reduzir a redução salarial dos pilotos da TAP (perdoem a redundância – pilotos estes que, em média, já auferem remunerações muito superiores a, por exemplo, os colegas da “vizinha” Iberia). Sobre a devolução do dinheiro dos contribuintes nem uma palavra…

Em troca, os pilotos da TAP decidiram “por respeito aos contribuintes e aos passageiros” não marcar greve para esta época de Verão, depois da TAP ter unilateralmente decidido melhorar as condições de trabalho dos seus colaboradores.

Procurando devolver algum senso de noção a todo este caso, parece-me que é importante relembrar que todo o propósito da gigantesca injeção de capital que se fez na TAP (com o dinheiro de todos nós), foi com o objetivo de garantir a sustentabilidade desta companhia aérea e dar condições para esta ser capaz de prestar um serviço de qualidade e a preços aceitáveis (o que não se verifica hoje em dia), nomeadamente, para com as regiões autónomas de Portugal, a diáspora portuguesa e com os países europeus, cumprindo assim, não só, o propósito da injeção de capital que foi ministrada, como também o serviço público nacional de transportes de passageiros, nomeadamente a nível nacional, cumprindo assim o desígnio do direito à livre circulação em território nacional que a nossa Constituição confere a todos os portugueses (atenção que quando se pede 800 euros para uma viagem de ida e volta entre o Funchal e Lisboa, não se pode considerar que este direito se encontre assegurado).

Por outro lado, a decisão dos pilotos em não fazer greve “por respeito ao contribuinte” parece-me, de facto, de elementar bom senso, porquanto não fosse o Governo de Portugal injetar uma quantia gigantesca de dinheiro dos contribuintes nesta empresa, os pilotos não teriam seguramente emprego do qual fazer greve, ou pelo menos, não fariam a greve na TAP, mas sim numa outra companhia aérea qualquer.

A conclusão a que podemos chegar sobre este caso é de que somos, de facto, um país de brandos costumes, em que arrisco a dizer que só em Portugal é que é possível derramar a maioria do produto gerado pelo IRC numa só empresa, permitir que a TAP continue a praticar preços para residentes nas Regiões Autónomas de Portugal que ascendem a mais de 800 euros por uma viagem de hora e meia, funcionar com atrasos permanentes e assistir de bom grado e sem grande ruído à introdução de aumentos salariais numa empresa que ainda se encontra a registar prejuízos de cerca de 120 milhões de euros por trimestre… Em outro país, arrisco dizer que o ultraje seria de tal ordem que milhares de pessoas saíram às ruas. Em Portugal? Não se passa nada… Onde é que é que fica o contribuinte nesta história?

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