Numa visão estilizada do Homo Economicus, considera-se que os agentes económicos tomam decisões racionais, maximizadoras de utilidade, baseando-se em informação completa, quer sobre o ‘mundo’ (no contexto dos negócios, corresponde ao conhecimento do estado atual e da evolução previsível de todos os fatores da ‘envolvente’), quer sobre o resultado expectável (probabilístico) de cada uma das alternativas de ação.

Já há muito que é reconhecida a falta de adesão à realidade desta perspetiva simplista sobre os processos de tomada de decisão, sendo evidente que estes são efetuados num contexto de bounded rationality[1], isto é, com informação necessariamente incompleta, sendo significativamente influenciados por enviesamentos cognitivos e pelas emoções, aspirações e interações sociais dos decisores.

A crescente disseminação das tecnologias que permitem automatizar a recolha, tratamento e análise de grandes quantidades de dados (Big Data, Analytics) veio trazer uma nova perspetiva sobre a possibilidade de obtermos informação mais barata, completa, fiável e tempestiva, melhorando por esta via a qualidade da tomada de decisão.

É neste contexto que se justifica a defesa que muitos fazem da importância do Data Driven Decision Making, considerando que existe uma relação clara de causa e efeito entre mais informação e melhor tomada de decisão.

Efetivamente, é hoje evidente a importância destas tecnologias, permitindo que se detetem ‘padrões’ de correlação entre dados (embora nem sempre verdadeiros) que seriam impossíveis de obter por processos não automáticos (um bom exemplo, na área do Marketing, é a análise do comportamento dos consumidores atualmente efetuada pelas empresas de distribuição moderna).

Note-se que a disponibilização barata e rápida de grandes quantidades de dados pode exacerbar a referida bounded rationality, originando um excesso de informação limitador da capacidade de a processar e entender, sendo por essa via não um elemento facilitador, mas sim um travão aos processos de tomada de decisão (a denominada analysis paralysis).

Reconhecendo o relevante contributo destas tecnologias, não podemos deixar de salientar que elas não devem ser consideradas como a solução para todos os problemas de tomada de decisão. Mesmo com mais e melhor informação, os decisores continuarão a ser influenciados por enviesamentos cognitivos que limitam a capacidade de tomada de decisão.

É bem conhecido que o excesso de otimismo leva a que atribuamos uma maior probabilidade aos cenários de evolução da envolvente e do resultado das nossas em que queremos acreditar (exemplo: “se eu descer o preço, a procura vai aumentar”).

Também é usual os decisores recorrerem a informação mais recente e disponível (availibility bias) ou que permita confirmar as suas pré-convicções (confirmation bias). O cherry picking de dados a que muitos decisores políticos recorrem para justificaram as suas decisões ou a visão crescentemente afunilada sobre a realidade que as redes sociais promovem (“mostro-te aquilo que eu já sei que queres ver”) são bons exemplos do potencial pernicioso destes enviesamentos.

Por outro lado, o próprio ‘mundo’ não é hoje uma entidade de leitura e entendimento fáceis. Num contexto crescentemente VUCA, a volatilidade, imprevisibilidade, complexidade e ambiguidade da evolução das variáveis desse ‘mundo’ e do impacto das nossas ‘ações’ no mesmo tornam ainda mais difíceis os processos de tomada de decisão, continuando, na nossa perspetiva, a ser cruciais a intuição e experiência dos decisores[2].

Uma frase do ex-secretário da Defesa norte americano Ronald Rumsfeld, em 2022, parece sintetizar bem estes desafios do mundo VUCA: “There are known knowns; there are things we know we know; we also know there are known unknowns; but there are also unknown unknowns – the ones we don’t know we don’t know”.

 

[1] Conceito introduzido, na década de 1950, por Herbert Simon (Prémio Nobel da Economia).

[2] Parte-se aqui do princípio que continuamos a pensar num contexto de decisão decorrente da inteligência ‘humana’ e não ‘automática’ (IA). Essa é uma outra problemática que gerará certamente discussões muito interessantes nos tempos futuros.