A Alta Autoridade Independente para Eleições (ISIE), entidade que na Tunísia enquadra os atos eleitorais, viu-se obrigada a estender o prazo de nomeação de candidatos parlamentares às eleições do próximo dia 17 de dezembro, as primeiras a realizar depois de a nova Constituição ter sido aprovada e estabelecida.
A decisão da ISIE, tomada no final de outubro, deu-se porque o número de candidatos nomeados não atingiu os mínimos necessários. Fechado finalmente o prazo, o ISIE anunciou que, de um total de candidaturas apresentadas (1.427), apenas foram aceites 1.058 processos — 936 candidatos do sexo masculino e 122 do sexo feminino.
Slim Bouzid, presidente da Tunisian Mourakiboun, uma associação anticorrupção que observou as eleições da Tunísia, disse ao jornal “Al-Monitor” que “a falta de candidatos mostra tanto a falta de entusiasmo geral quanto que o processo é bastante difícil”. Cada candidatura requer 400 assinaturas de eleitores registados e não há financiamento público de campanha.
Bouzid disse estar também preocupado com o facto de, não havendo financiamento público, haver evidentemente uma vantagem para aqueles que têm dinheiro e influência. “Se alguém é conhecido a nível local – por exemplo, o dono de uma fábrica – com certeza que pode obter as assinaturas necessárias. Portanto, o sistema não é democrático e não é aberto a todos”.
Comentando o sistema, analista político Amine Snoussi, igualmente ouvido por aquele jornal, disse que as dificuldades “mostram como o presidente Kais Saied destruiu a democracia parlamentar ao apresentá-la como a fonte da corrupção”, “não temos pessoas suficientes que queiram ser deputados e os partidos políticos não querem participar”.
Mas por trás do problema está também a natureza da assembleia a eleger – que na prática não terá qualquer função governativa, mas meramente de aconselhamento. Se for caso disso. “O parlamento será apenas um órgão político a ser consultado para obter uma opinião, mas Kais Saied será” o verdadeiro líder.
A nova lei eleitoral que reduz o papel dos partidos políticos num parlamento em vias de reforma. A decisão já estava prevista, dado que a diminuição das competências parlamentares estava prevista na Constituição aprovada em julho num referendo muito pouco participado.
Sob a nova lei, os eleitores escolherão individualmente os candidatos às eleições de 17 de dezembro, em vez haver uma única lista partidária – uma mudança que enfraquecerá a influência dos partidos e com certeza também a predisposição para a participação no ato eleitoral.
“Estamos a passar por uma nova etapa da história da Tunísia, em direção à soberania do povo após o anterior simulacro de eleições”, disse Saied, citado pelas agências internacionais, durante uma reunião do seu gabinete em setembro passado, quando tomou a decisão.
Na altura, Ahmed Nejib Chebbi, líder da Frente de Salvação Nacional, órgão que representa os principais partidos da oposição na Tunísia, incluindo o Ennahdha (de onde o presidente é oriundo), disse, citado pelas mesmas fontes, que as eleições de dezembro serão “realizadas sob a supervisão de um órgão que não é neutro e é leal à autoridade do presidente”. Nesse contexto, o boicote é a única resposta possível a mais um “golpe contra a legitimidade constitucional” (anterior à nova Constituição).
A nova Constituição foi aprovada por esmagadora maioria num referendo em que participaram apenas 30% dos eleitores, segundo dados oficiais – considerados ainda assim inflacionados pelos partidos da oposição. O texto constitucional colocou a formação do governo diretamente sob a alçada do presidente, reduzindo a influência de um novo parlamento de duas câmaras, que surgirá ã 17 de dezembro.