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“Um banqueiro respeitável era aquele que assinava um crédito de 200 milhões com um aperto de mão”

Ganhar eficiência e transformar os bancos é o principal desafio na próxima década, acreditam os banqueiros portugueses presentes no Fórum Banca 2018. Evitar as “asneiras” do passado, investir na formação e na inovação são receita para a criação de valor.
29 Novembro 2018, 21h58

Os erros cometidos no passado são lições para os banqueiros portugueses, mas continua a faltar um ganho de eficência e transformação no setor bancário para responder aos desafios da próxima década. Este foi o pano de fundo na Mesa Redonda “O Estado da Nação – O Caminho para a Rentabilidade”, que se realizou no Fórum Banca 2018, organizada em parceria entre o Jornal Económico e a consultora PwC, esta quinta-feira.

Paulo Macedo, CEO da Caixa Geral de Depósitos (CGD), não esqueceu os prejuízos acumulados nos últimos sete anos de 12 mil milhões de euros. “Será um desafio se os resultados positivos da próxima década conseguirem compensar o resultados positivos desta década”, disse o presidente executivo da CGD, para quem os bancos têm de ser mais ágeis a responder de clientes, defendeu.

Na mesma linha, Licínio Pina, CEO do Crédito Agrícola, recordou que “não foi [a queda do] Lehman Brothers que fez a crise, mas sim um conjunto sucessivo de [más] práticas bancárias”.

Paulo Macedo alertou para a baixa rentabilidade (ROE) que é transversal ao setor em Portugal. “”Os milhões que a banca ganha em Portugal não paga o custo do capital, como todos sabemos”, disse. Voltou a frisar que “o primeiro desafio é compensar a década de prejuízos e o segundo desafio é remunerar o seu capital”.

Os obstáculos do futuro obrigam a esforços em diversas áreas, sendo reciso juntar ao trabalho que se está a fazer em termos de capital os trabalhos que se estão a fazer em termos da governance, reputação e da cultura de risco. “Hoje a banca tem mais capital e menos crédito”, disse o presidente do banco do Estado. Embora, o rácio loans-to-deposits já esteja abaixo dos 100%, “não sabemos se isso é necessariamente bom”, realçou Paulo Macedo. Os números hard da banca começam a estar melhor, reconheceu.

Os sistemas de concessão de crédito são melhores do que no passado, lembrou Paulo Macedo. “Houve muita asneira da banca”, disse.  Citando o economista César das Neves, o problema são os “old boys’ network“. Naquela altura, “um banqueiro respeitável era aquele que assinava um crédito de 200 milhões de euros com um aperto de mão”. Questionado sobre se hoje em dia ainda existem banqueiros, Paulo Macedo foi taxativo ao enunciar: “se ainda há banqueiros, não sei, mas sei que não quero estes”.

António Ramalho, CEO do Novo Banco, também fez um balanço do sistema bancário. “Mudou substancialmente”, disse, ressalvando que o negócio da banca é “comprar e vender risco” assente na “confiança”, quando se referia à concessão de crédito.  “No fundo, somos uma blockchain humana previamente estruturada”, frisou. Por isso  lembrou que “o crédito hoje não pode ser dado apenas por uma pessoa”.

A disrupção digital já chegou ao setor e os banqueiros estão atentos, nomeadamente ao surgimento das fintech que atuam em áreas muito segmentadas. O presidente executivo do Millennium bcp, Miguel Maya, mostrou-se recetivo à chegada das tecnológicas financeiras. “As fintech são uma ajuda enorme para a banca. Temos de reagir a algumas destas provocações, mas também temos de assumir as vantagens que fornecem ao customer service“, justificou.

Miguel Maya lembrou que existe uma diferença essencial entre fintech e os bancosno que diz respeito ao risco da inovação. As primeiras não se preocupam com os salários dos colaboradores porque são pagos por investidores, e os custos futuros serão ressarcidos por uma oferta pública de venda, o que reduz o risco da inovação caso falhe. Isto é, o mesmo não sucede com os bancos e, por isso, o risco é maior, defendeu. Além disso admitiu que “a inovação é mais lenta do que dizem as consultoras e mais rápida do que aquilo que as administrações pensam”.

“A inovação tecnológica deve acrescentar valor, mas não é a solução para a totalidade de criação de valor”, completou Licínio Pina, neste debate.

O futuro das instituições bancárias – principalmente as que têm presença em Portugal – será determinado por três principais desafios: o tecnológico, o regulatório e o demográfico, sendo este último apenas abordado pelo CEO do Crédito Agrícola. “A banca do futuro terá de ser um mix entre a banca presencial e a tecnológica”, concluiu.

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