A história rapidamente nos irá contar a verdade sobre a queda da Dielmar, uma empresa de confeções do distrito de Castelo Branco que emprega 300 colaboradores. A administração anunciou o pedido de insolvência há dias com a justificação da Covid. Tudo, no mínimo, estranho.

Por aquilo que se sabe, a última década tinha sido marcada por dificuldades e, nos últimos anos, a Dielmar recebeu milhões de euros do contribuinte através de fundos públicos específicos ligados à recuperação de empresas.

A Dielmar conseguiu vender imóveis ao Estado, para além do apoio da edilidade em despesas de consumo básicas. Aliás, o Estado já tinha entrado no capital ficando a deter uma participação minoritária de 30%.

As dificuldades não são de agora, contrariamente àquilo que a gestão de Ana Paula Rafael, a CEO da empresa, quis deixar transparecer. O próprio ministro da Economia, Siza Vieira, ao comentar o pedido de insolvência apresentado pela própria administração, deu a entender que o problema da empresa era de gestão.

A Dielmar recebeu dinheiro ao longo dos anos para se reestruturar e não fez. O período da pandemia foi aproveitado para mais uns subsídios via lay-off, e enquanto a concorrência se adaptava e produzia outro tipo de confeções, a Dielmar manteve-se impávida e serena e os números dizem isso mesmo.

A faturação em 2020 foi da ordem dos cinco milhões de euros, e no primeiro trimestre deste ano a empresa não foi além dos 700 mil euros de vendas.

Estes números são absurdos, comenta um gestor do têxtil, António José Cardoso, que conhece a situação desta empresa e de outras que lhe seguirão o caminho. Diz que uma empresa com 300 colaboradores tem de faturar 15 a 17 milhões de euros/ano e o custo por minuto tem de rondar os 13 a 15 cêntimos, enquanto na Dielmar o custo por minuto de trabalho andaria entre os 40 e os 50 cêntimos.

Depois, frisa que neste setor de atividade os colaboradores mais importantes são os diretos, enquanto este tipo de empresa tem privilegiado os indiretos, que saem mais caros.

António Cardoso acredita na reestruturação fácil desta companhia que diz precisar de um ou dois grandes clientes que absorvam a produção, deixando apenas 10% da mesma para as lojas da marca. Considera inconcebível que esta empresa bata no fundo quando as congéneres bem geridas estão a crescer a dois dígitos e alerta para a necessidade de se acabar com a gestão familiar.

Mais. Perante um período tão alargado da pandemia e da inexistência de casamentos e festas, a oferta de produtos na área dos fatos cerimoniais deixou de fazer sentido e esta foi das poucas empresas que não se reinventou. Acresce que a mão de obra da Dielmar é o ativo mais relevante do grupo e facilmente será recolocada caso não apareça ninguém para agarrar na empresa e reposicioná-la.

Grave é ainda o facto de o Estado com dinheiro dos contribuintes continuar a injetar fundos e a não fiscalizar a gestão. Contrariamente às declarações do ministro Siza Vieira, as “Dielmar” que vão aparecer nos próximos meses têm viabilidade se o Estado fizer o seu papel: fiscalizar e intervir perante a incapacidade de gestão ou gestão danosa de quem está à frente de unidades responsáveis por centenas de empregos. Quem não quer ser fiscalizado na sua gestão não pode pedir dinheiro público.

Levantar o tema da qualidade de gestão em Portugal é mais relevante do que a vitimização por falta de apoios ou mão de obra.