Desde o fim da Segunda Guerra, a economia mundial tem sido dirigida de acordo com um conjunto de normas ditadas pelos Estados Unidos. Hoje, esse sistema está a deteriorar-se. A agenda económica e política tornou-se multilateral, afastando o controlo americano e abrindo caminho para a emergência de novos protagonistas. As grandes potências procuram um lugar à mesa das negociações. As relações internacionais revestem-se da maior importância. É o começo de uma nova ordem mundial.

A hegemonia americana tem sido enfraquecida pelo gigante chinês, mas o abandono das regras de mercado pelo Presidente Joe Biden em prol de uma política industrial mais agressiva e determinada tenta reverter essa tendência. Os recentes desenvolvimentos apontam para o que se pode designar como uma nova era de política industrial nos EUA. Dois dos pacotes de medidas mais proeminentes contam com 465 biliões de dólares em subsídios para a indústria verde, no setor dos automóveis elétricos e da energia, e produção de semicondutores. Aliados a requerimentos para tornar a produção doméstica, ambicionam contrariar o galope chinês.

Noutro palco combate-se outra batalha pela soberania ucraniana, que em muito tem contribuído para uma acentuada divisão geográfica no que diz respeito às conceções de Democracia e composição da futura ordem internacional, de acordo com o Conselho Europeu de Relações Externas. Enquanto a opinião americana e europeia aponta para um apoio continuo à causa ucraniana, a opinião chinesa, indiana e turca demarca-se pela preferência pelo término rápido da guerra, ainda que implique a cedência de território por parte da Ucrânia. Paradoxalmente, a guerra tem unido o Ocidente, mas diminuído a sua influência.

Com as eleições americanas no horizonte, as intermédias podem ser um prelúdio do que se espera que se realize. Com a vitória dos Republicanos na Câmara dos Representantes, os Democratas têm encontrado mais dificuldades em aprovar financiamento para a Ucrânia. O que pode forçar os Estados Unidos a exercer uma maior pressão sobre os seus aliados europeus para aumentarem o seu apoio financeiro e militar à Ucrânia e cumprir com as suas obrigações no seio da NATO. É também do entendimento dos Republicanos, apesar dos esforços protecionistas da administração Biden, que a posição dos Estados Unidos face à China tem ficado aquém do expectável.

Deste modo, a China, o principal oponente americano à liderança da nova ordem mundial, tem sinalizado que é capaz de orientar soluções de política externa. Com a maior rede de diplomacia do mundo, como aponta o “Financial Times”, as relações entre estados são da maior importância para a China. Na América Latina também a sua influência tem sido notória, com o corte das relações diplomáticas com Taiwan por parte de vários países, incluindo as Honduras, mais recentemente. Noutra vertente, o rápido crescimento militar tem evidenciado que a China, mais do que nunca, está preparada para oferecer alternativas à segurança internacional, até então dominada pelos Estados Unidos.

O empenho dos Estados Unidos em conter o crescimento chinês tem alimentado uma narrativa de diabolização destes interesses, por parte do governo de Xi Jinping. A guerra na Ucrânia tem largamente contribuído para a mesma, onde a opinião predominante é de que esta foi provocada pelas potências do Ocidente para acabar com Rússia, sendo a China o próximo alvo. Assim, é sem surpresa que “Atrevam-se a lutar” é o apelo que resume a estratégia chinesa em matérias de política externa.

O Economia Viva é o maior ciclo de discussões económicas organizado por jovens economistas, em Portugal. A oitava edição decorreu no dia 21 de abril, na Nova SBE, e contou com a aclamada participação de Bruno Maçães, Ana Santos Pinto e Gonçalo Pina, com a Moderação de Cátia Bruno para o primeiro painel, lançando o mote para o presente artigo. O debate poderá ser revisto, em breve, nos canais oficiais do NEC.

Este é o primeiro de seis artigos elaborados para o Jornal Económico na sequência das seis sessões da 8ª edição do Economia Viva.