A Proposta de Orçamento para 2020 não apresenta grandes novidades a nível fiscal, o que não deixa de ser, em parte, uma boa notícia para a generalidade dos portugueses. A estabilidade fiscal deve ser preservada pois assegura a necessária segurança jurídica e previsibilidade para os agentes económicos. Existem, igualmente, pequenas benesses para os contribuintes, ainda que de pequena monta. É o caso da dedução/isenção parcial de IRS nos 3 primeiros anos para os jovens entre os 18 e os 26 anos que entrem no mercado de trabalho – ainda que não se entenda a limitação da remuneração anual bruta, incluindo rendimentos isentos, não poder exceder o 4º escalão de IRS (25.075€).

Com efeito, num país a necessitar de aumentar a produtividade e a qualificação dos seus trabalhadores, a apologia fiscal dos baixos salários não deixa de ser uma contradição. Facto, aliás, tanto mais grave quanto os salários em 2019 continuaram a crescer (2,1%) bem acima da produtividade (0,8%). Se não invertermos este dado, continuaremos no ciclo vicioso de crescimento económico incipiente e uma carga fiscal elevada para sustentar a despesa corrente e o pagamento da dívida pública.

De igual modo, prevê-se o aumento do valor das deduções à coleta dos agregados familiares em que existam dois ou mais dependentes com idades inferiores a três anos. Trata-se de uma opção legislativa duvidosa pois parece cultivar uma natalidade acelerada, o que não se crê ser alcançável apenas pela via fiscal. Portugal precisa de um plano nacional para a natalidade, com medidas integradas em matéria laboral, redução da carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho e incentivos à mobilidade e desenvolvimento do interior do país. Ninguém tem filhos para reduzir a sua fatura fiscal.

Este é um tema central para a sociedade portuguesa quando se prevê a rutura do atual sistema de segurança social a partir de 2050. Para as PME, estabelece-se um alargamento da aplicação da taxa reduzida de 17% dos atuais 15.000€ de matéria coletável para 25.000€ a partir do próximo ano, uma medida de impacto reduzido pois permitirá uma poupança no IRC a pagar de 400€. Medida de grande alcance prático é a isenção de Imposto do Selo para as operações de cash pooling, permitindo uma mais fácil gestão da tesouraria nos grupos empresariais.

Em resumo, o conjunto de medidas estruturais do lado da receita – i.e. medidas de agravamento e desagravamento – apenas permitem uma devolução à economia de 72M€. Já as medidas de agravamento de despesa primária ascendem a 900M, dos quais 700M em salários com a função pública. Significa que a pressão fiscal em 2020 manter-se-á elevada, ultrapassando os 35% do PIB.

Esta é, aliás, a pior notícia deste Orçamento. Uma nota, igualmente negativa, é a atualização dos escalões de IRS em apenas 0,3% quando a inflação estimada para 2020 rondará 1%. Equivale isto a dizer que todos aqueles que tiverem atualizações salariais acima de 0,3% correm o risco de sofrer um agravamento fiscal por via da mudança de escalão de IRS. Teremos, ainda, de ver as novas tabelas de retenção na fonte e seu impacto no rendimento líquido das famílias.

Do ponto de vista macroeconómico é de destacar a circunstância do crescimento estimado (1,9%) ter como principal alavanca a procura interna (3%), sendo que a procura líquida externa terá um crescimento negativo (-1,1%) em 2020. De igual modo, prevê-se um desaceleramento do investimento privado (decresce de 7,3% para 5,4%) em parte compensado por um incremento do investimento público. Mantém-se a receita dos últimos anos: o equilíbrio orçamental é obtido através do crescimento sistemático da receita fiscal para compensar o aumento da despesa primária com salários e pensões, recorrendo-se à cativação de verbas para controlar a execução do investimento do setor público.

Veremos até quando será possível manter este rumo, sobretudo num contexto de contração global da economia. Neste contexto é positiva a almofada obtida com o primeiro excedente orçamental da democracia portuguesa.