No conjunto, o Governo acena com algumas medidas avulsas no que à fiscalidade que recai sobre as empresas diz respeito. Respondendo, é certo, a algumas das propostas dos empregadores, nomeadamente da CCP, mas de forma tímida e insuficiente e sem impacto decisivo nas condições de competitividade.

Esperava-se que o OE 2020, inaugurando simbolicamente uma nova década e num cenário de previsível estabilidade política e social, pudesse contribuir para impulsionar o crescimento económico assente num modelo de desenvolvimento renovado. Não será assim e teremos, no essencial, um orçamento de continuidade.

É verdade que foram introduzidas algumas medidas que podem favorecer as empresas. No entanto, nenhuma destas alterações representa mudanças de fundo. No que se refere ao IRS, o Governo dá um sinal, no mínimo, contraditório. Lançou um desafio às confederações empregadoras no sentido de aumentar o rendimento das famílias, mas esse desafio não encontra correspondência em matéria de revisão do IRS. Caso as empresas respondam positivamente a este desafio, terão necessariamente aumentos de custos sem que se verifique, em muitas situações, aumento do rendimento disponível para as pessoas.

No conjunto, continuaremos com custos fiscais e parafiscais a rondar os 35% do PIB e assim não será possível inverter o rumo. Temos defendido insistentemente a necessidade de repensar o modelo económico, privilegiando a passagem para uma economia centrada em factores intangíveis, que introduzem a diferenciação e intervêm em toda a cadeia de valor de todos os sectores da economia, mesmo os mais tradicionais.

Com as previsões que apontam para uma desaceleração bastante preocupante do crescimento do PIB nos próximos anos, é urgente repensar o nosso modelo focando-nos na necessidade de passar de uma competitividade centrada nos baixos custos para uma competitividade baseada no valor acrescentado. Ora, para isso precisamos de uma política orçamental mais “amiga” do investimento quer privado quer público, estando este, em particular, muito abaixo dos níveis necessários. No caso do investimento privado, alguns instrumentos de política fiscal são essenciais, nomeadamente, para incentivar a inovação.

Também, a absoluta necessidade de investimento em qualificação das pessoas, fundamental para assegurar a transformação económica, nomeadamente, digital, continua a não ser espelhada no OE2020.

O que se deve questionar neste momento não é a consolidação orçamental, mas o ritmo a que faremos essa consolidação. O que se verifica neste Orçamento, e que se manterá nos anos seguintes, de acordo com o Governo, é uma obsessiva manutenção da trajetória de consolidação orçamental, “para além do pacto de estabilidade” que necessariamente prejudicará o crescimento e a competitividade da economia.

Sabemos que as próximas semanas serão marcadas por múltiplas negociações para garantir o necessário apoio parlamentar à aprovação do OE2020. A nossa convicção, e também o nosso receio, é que dessas negociações resultem apenas medidas pontuais, que aumentem a despesa, mas sem que as mesmas se traduzam em ganhos estruturais para a economia e para a sociedade em geral.