Não há semana em que a passagem de um qualquer nababo pela Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o Novo Banco não provoque a repulsa e indignação da comunidade. É uma perfeita e complexa galeria de horrores. Não como naquele circo de atracções bizarras do filme “Freaks” do Tod Browning, mas pela indignidade das prestações, declarações e tristes espectáculos de amnésias selectivas misturadas com simuladas impreparações de gente que pelo menos devia respeitar a Casa da Democracia e todos os portugueses que ali são representados.

Bem esteve Fernando Negrão (presidente dessa CPI) ao dar por terminada a sessão com Nuno Vasconcellos – ex-líder da Ongoing que em tempos idos envergava a imagem de homem de sucesso, cabelinho puxado para trás, brilhante de gel, armado em Gordon Gekko dos sabões para impressionar parolos – por uma questão de “dignidade dos trabalhos”. Foi pouco mais de uma hora a desviar culpas próprias de uma dívida reconhecida de mais de 500 milhões ao Novo Banco.

Escolhi propositadamente a palavra “nababo” no primeiro parágrafo, que tem como significado “homem rico que vive com grande luxo e fausto”, pois, curiosamente, nenhum dos ouvidos até agora no Parlamento vive debaixo da ponte ou vai buscar as suas refeições ao Banco Alimentar. Não, todos eles “vivem bem”, como disse Luís Filipe Vieira (outra triste figura), ao melhor estilo de marajás.

É o caso de Nuno Vasconcellos que “migrou” em grande estilo para o Brasil, onde segundo rezam as crónicas se delicia com os prazeres do clima tropical do Rio de Janeiro, habita numa moradia com piscina, conduz um Porsche. Para lá disto, era colunista semanal do jornal brasileiro “O Dia”, num espaço intitulado: “Um olhar sobre o Rio”, escrevendo “sobre a alma alegre do carioca”.

Ora, se isto não é gozar com todos os portugueses que foram amarrados à obrigação de custear o buraco da banca por tantos negócios ruinosos como a sua Ongoing, respeito não é com certeza.

No total, este Gordon Gekko dos sabões (o seu negócio de origem) deixou 1,2 mil milhões de dívidas à banca, ao Estado, a trabalhadores e fornecedores. É pena que enquanto escreve “sobre a alma alegre do carioca”, por cada letra teclada não tenha também um martelo a bater-lhe na consciência para lhe fazer lembrar a vergonha que perdeu, se alguma vez a teve. Foram muitas famílias e outros tantos destinos que ficaram pendentes da sua fuga para a frente e do lastro de incumprimentos que são a sua herança.

Por isso, para lá do nababo que era e é, também era bom que alguém lhe ensinasse o significado de dignidade: “qualidade moral que infunde respeito, autoridade moral, decência, modo digno de proceder”. Como podem constatar, isto é tudo o que Nuno Vasconcellos não tem, a dignidade não entra no seu Porsche. “Tudo se resume a dinheiro, o resto é conversa”, proclamava Michael Douglas em “Wall Street”, o amoral Gordon Gekko original.

Nuno Vasconcellos marcou um tempo, tentou montar uma guerra a Balsemão, comprou media, andou em OPAs milionárias, puro fogo fátuo. Afinal, para o rodapé da história ficará apenas como o Gordon Gekko dos calotes que todos nós estamos a pagar.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.