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Veracruz quer criar em Portugal novo ‘cluster’ da produção de amêndoa

Um dos sócios fundadores da Veracruz, David Carvalho, explica, em entrevista exclusiva ao Jornal Económico, os contorno deste investimento de cerca de 50 milhões de euros nas terras do Fundão e de Idanha-a-Nova
8 Julho 2019, 07h42

O grupo luso-brasileiro Veracruz anunciou na passada semana, dia 2 de julho,  que vai investir cerca de 50 milhões de euros na instalação de um amendoal de cerca de dois mil hectares de amendoal no Fundão e em Idanha-a-Nova. Segundo a empresa, o objetivo é chegar aos cinco mil hectares de amendoeiras e exportar 70% da produção.

Em entrevista exclusiva ao Jornal Económico, David Carvalho, sócio fundador da Veracruz, explica os contornos deste projeto inovador no interior de Portugal, com destaque para o investimento de cerca de 6,5 milhões de euros para a construção de uma fábrica de descasque. Pode ser o início de um novo ‘cluster’ agroalimentar em Portugal, aproveitando as novas tendências de consumo de produtos saudáveis a nível global.

 

 

Em que fase está este projeto de investimento da Veracruz?

A primeira fase deste projeto, que foi recentemente reconhecido como Projeto de Potencial Nacional [PIN], está a decorrer. A plantação arrancou em 2018 e, neste momento, a Veracruz tem cerca de 300 hectares plantados. O primeiro ano de colheita será em 2021. Temos atualmente cinco herdades espalhadas por dois concelhos. O objetivo será, como frisado anteriormente, chegar a dois mil hectares com um investimento de 50 milhões de euros, e, numa fase posterior do investimento, a 5 mil hectares.

 

O que determinou a escolha de Portugal e da Beira Baixa para a instalação do amendoal?

A cultura da amêndoa necessita de características edafoclimáticas específicas: clima seco, sol e água e 300 horas anuais abaixo de 7º C de temperatura. Portugal oferece todas estas condições e a Beira Baixa é um território natural para este tipo de cultura.

Esta região é também servida por uma malha rodoviária moderna, que interliga as maiores cidades portuguesas e espanholas. Madrid está a apenas a 360 quilómetros de distância. Uma localização privilegiada, se tivermos em conta que Espanha é um dos maiores mercados importadores de amêndoa.

Por outro lado, estamos a falar de dois concelhos, Fundão e Idanha-a-Nova, empenhados em encontrar soluções para combater o processo de desertificação do interior português e em criar políticas de incentivo ao investimento. Essa abertura é muito importante para nós, uma vez que somos considerados como um projeto-âncora com capacidade para atrair outros investidores com o mesmo tipo de ADN, ou seja ‘agrotech’ e ‘smart farming’. Estes princípios e valores também são partilhados por estes dois concelhos, que estão a criar um ecossistema muito interessante. Por exemplo, o Fundão está a trabalhar na criação de um dos maiores centros rurais de IOT (Internet das Coisas) da Europa e uma incubadora de ‘startups’ dedicadas a ‘agrotech’. E em Idanha-a-Nova, o MIT e as universidades nacionais juntaram-se para darem forma ao Green Valley, onde já estão incubadas 10 ‘startups’ dedicadas ao sector.

 

Para quando está prevista a unidade fabril entrar em laboração?

A construção da fábrica de descasque e transformação de amêndoa será realizada em 2021, num investimento a rondar 6,5 milhões de euros. Esta unidade terá capacidade para transformar também a produção de outros produtores de amêndoa da região – criando valor acrescentado e ajudando ao escoamento. Acreditamos que, desta forma, somos capazes de ajudar a estabelecer a Beira Baixa como um ‘cluster’ na produção de amêndoa a nível mundial.

 

Qual a previsão de produção?

Quando a exploração estiver em velocidade cruzeiro, antecipamos uma produção de quatro mil toneladas anuais de amêndoa, o que equivale a dois mil quilos de miolo por hectare.

Prevêem exportar 70% da produção. Para que mercados?

Portugal tem, de facto, uma localização privilegiada, estando muito próximo dos maiores importadores de amêndoa. Apesar de a Europa só produzir cerca de um décimo da produção mundial (que está concentrada na Califórnia, responsável por 82% da amêndoa total), é o continente que mais consome: importa 42% da produção mundial. Alemanha, França e Espanha são os maiores mercados europeus. Obviamente, olhamos também com muito interesse o mercado asiático, a segunda maior região importadora (40%), com destaque para Índia, Coreia do Sul e Japão.

Acreditamos que temos os trunfos para sermos bem sucedidos neste mercado tão competitivo: por um lado, relativamente aos maiores ‘players’ mundiais (Estados Unidos e Austrália), visto que conseguimos produzir com menores custos de produção e, ao mesmo tempo, oferecer um produto de qualidade superior, graças às características das variedades de amêndoa mediterrânica.

Porque é a amêndoa uma cultura tão interessante para investir?

O consumidor atual é cada vez mais exigente nas suas escolhas. Um estilo de vida equilibrado e uma alimentação saudável são, hoje, as suas prioridades. Vários estudos têm apontado para os benefícios da amêndoa na prevenção de doenças degenerativas, na redução do colesterol, na redução de acidentes cardiovasculares e no tratamento de alergias. E o consumo não tem parado de aumentar. Na última década, a produção mundial duplicou (1,2 milhões de toneladas de amêndoa), mas a procura tem sempre excedido a oferta.

As utilizações da amêndoa não têm parado de aumentar: seja na indústria agroalimentar (‘snacks’ saudáveis, chocolates, gelados, etc); na indústria de derivados (farinhas, pastas, leite de amendoal); e na indústria de cosmética (óleos, cremes, champôs).

Quais as previsões de faturação no primeiro ano de atividade?

Esperamos, no primeiro ano de produção, registar uma faturação à volta dos dois milhões de euros. Quando estivermos em velocidade cruzeiro estimamos que chegue aos 15 milhões de euros. Naturalmente que estas perspetivas estão dependentes do preço de venda da amêndoa no mercado, que é definido com base na produção anual dos Estados Unidos (Califórnia).

Quantos postos de trabalho irá este investimento criar?

Prevemos a criação de mais de 50 postos de trabalho diretos entre a exploração agrícola e a unidade fabril. Vamos apostar muito em formação e qualificação dos nossos quadros para termos um padrão de excelência em termos de qualidade. Prevemos criar outros 100 indiretos através de prestação de serviços, dinamizando a economia local. Nesta fase de arranque, contamos já com 15 colaboradores. Procuramos, sempre que possível, recrutar colaboradores locais. Além disso, estamos a firmar parcerias científicas e tecnológicas com as instituições locais, além de estarmos a trabalhar lado a lado com as ‘startups’ de ‘agrotech’ que estão a desenvolver-se na região.

Qual o vosso compromisso em termos de sustentabilidade deste projeto?

A Veracruz tem um compromisso em garantir uma forte componente de sustentabilidade agrícola e ambiental, seja com a implementando de agricultura de precisão para garantir desperdício zero de água, pelo reaproveitamento material orgânico da poda como adubo natural, plantando vegetação nas entrelinhas para diminuir a erosão dos solos ou melhorando a qualidade dos solos através de fertilizantes naturais.

Também queremos construir novas barragens para aumentar a quantidade de água disponível nas herdades, utilizar a casca da amêndoa como biomassa para as suas fábricas (economia circular) e reduzir o consumo de energia através de fontes alternativas (painéis solares).

 

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