Vamos imaginar um cenário positivo para os próximos meses em Portugal, ou seja, vamos pensar que apenas 30% das empresas nacionais estão a soro ou a oxigénio, e que apenas teremos uma recessão de 6,8%, como diz Bruxelas, e que o desemprego não passará dos 10%.

E se a hecatombe for mais cavada? Deixo, de rajada, duas ideias para voltarmos a estar positivos: os financiamentos às empresas garantidos pelo Estado deveriam ser risk-free para os bancos e não com 20% de risco assumido, como agora; e o lay-off deveria ir além dos três meses, passando para seis ou mesmo para nove meses.

Vamos aos detalhes. O país vive do turismo, com 17% do PIB alimentado por esta indústria e quase metade do income vem do Algarve. Mas o turismo nunca mais será igual. Já vivia nos limites perante a concorrência do sul da Europa, a Páscoa foi inexistente e o verão será miserável. O impacto inclui a restauração, o turismo sustentado e o alojamento local em bairros históricos. Mas também inclui o retalho, sobretudo o de bairro e que emprega grande parte da população. Também vivia nos limites, com grande endividamento, salvo as grandes superfícies. O rent-a-car também foi afetado e o transporte aéreo que continua no chão.

Temos ainda as grandes indústrias como o setor automóvel, que esteve dois meses parado porque os mercados de destino também estavam fechados. Impactou toda a cadeia a montante no fornecimento de componentes, assim como a logística. E depois temos as grandes empresas, mas sabemos que são poucas, talvez 20%, as que trabalhavam com equity e cash flow positivo.

Perante tudo isto, qual foi a solução do Governo? Endividem-se e nós garantimos através da Garantia Mútua. A opção foi dívida, com os bancos a assumirem 20% dos riscos. Acontece que os bancos trataram primeiro de si, de limpar balanços, e foram contribuindo para destruir a economia apertando a tesouraria a milhares de empresas, sendo sabido que 30% das médias e grandes empresas são NPL e NPE para os bancos. Terão de se aguentar por si. Estas são aquelas empresas que têm dívidas à Segurança Social e ao fisco e que vão negociando, mas dão emprego.

Ora, a banca só empresta para aquelas empresas que são “investment grade” e essas são 25% do total, as outras ficam na fila ou entram em desespero. Aliás, nem o banco de fomento, o IFD, nem o Portugal Ventures, nem o Portugal Invest têm ritmo e capacidade. Fazem uns apoios a startups para “inglês ver”.

E não nos esqueçamos que, com grande parte da banca com matriz espanhola apesar de se dizer neutra, na hora da verdade quem irão apoiar? Basta ver que 60% dos concursos públicos na cosnstrução civil vão para empresas do país vizinho. Convém não esquecer que a periferia sofre mais que o centro, pois o governo espanhol tem uma política de atuação nesta zona e a economia raiana tem sofrido pressão para investir do outro lado.

Não é difícil perceber a necessidade de desbloquear fundos para empresas que têm dívidas a entidades públicas com o compromisso de manter postos de trabalho, ou de não distribuir dividendos ou outras obrigações. E, claro, serão necessários write-offs de dívidas passadas. Tal como não difícil perceber que a única vantagem das empresas em termos de subsidiação tem sido o lay-off simplificado e que três meses não vão chegar.