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A importância do “jornalismo lento” como impulsionador do “pensamento crítico sobre o que nos rodeia”

Quiosque Manifesto organiza palestra sobre o “jornalismo lento”, com um dos editores da revista “Delayed Gratification”, precursora desse conceito. A coordenadora Inês Catarina Pinto refuta a “morte do papel”, diz que “estamos a viver uma época de ouro das publicações independentes” e enaltece a “valorização da informação como conhecimento”.
20 Setembro 2018, 22h32

O quiosque Manifesto, situado no Mercado de Matosinhos, vai organizar uma palestra sobre o conceito de slow journalism (“jornalismo lento”) no próximo sábado, dia 22 de setembro, contando com a participação de Matthew Lee, um dos editores da “Delayed Gratification”, revista britânica que se baseia precisamente em artigos mais extensos, com uma maior profundidade, conferindo prioridade ao rigor em detrimento da rapidez. Ou mais sucintamente: a vetusta arte de contar histórias com princípio, meio e fim.

Além da revista “Delayed Gratification”, o quiosque Manifesto (que integra também uma cafetaria e uma galeria dedicada à fotografia documental) tem várias outras publicações de “jornalismo lento”, impressas, exigindo tempo e atenção ao leitor. Tendo em conta a migração do papel para o digital e a transformação da leitura lenta para a leitura rápida, o Manifesto pode ser entendido como um projeto contra-cultural? “Não acho que tenha havido uma migração do papel para o digital, mas antes uma adaptação às tecnologias que temos para contar histórias. No Manifesto apoiamos uma narrativa lenta e acreditamos que a leitura em papel consegue captar mais a nossa atenção, permitindo-nos descansar os olhos do ecrã. Não diria que somos um projeto contra-cultural, uma vez que nunca ninguém perdeu verdadeiramente o contacto com o papel como meio de leitura, mas acho que se pode dizer que somos um espaço que quer apelar a um ritmo mais lento numa era rápida”, explica Inês Catarina Pinto, coordenadora do Manifesto e responsável pela curadoria das publicações independentes.

“O Manifesto abriu em setembro de 2016, com o propósito de ser um pólo agregador de uma comunidade curiosa e criativa”, salienta Pinto, com 28 anos de idade, formada em Ciências da Comunicação. “Através das publicações independentes disponíveis no nosso quiosque e da galeria de fotografia documental, assumimo-nos como embaixadores de uma narrativa lenta. O nosso propósito com este espaço é fornecer à comunidade ferramentas capazes de impulsionar o pensamento crítico sobre o que nos rodeia”.

Atendendo às ruturas tecnológicas dos últimos anos, a mudança de hábitos de leitura, o declínio dos jornais e revistas em papel, o encerramento de quiosques e livrarias, ainda é rentável um projeto como o Manifesto? “Desde a invenção da rádio que a morte do papel anda a ser anunciada e a culpa dificilmente é das novas tecnologias”, ressalva Pinto. “Contrariamente ao senso comum, estamos a viver numa época de ouro das publicações independentes. Diariamente chegam ao Manifesto revistas novas que primam por conteúdos de extrema qualidade, com um design cuidado e original, e que não receiam abordar temáticas desafiantes. Quando as publicações valorizam a qualidade em detrimento da quantidade, há sempre interessados em comprar revistas.

 

“Valorização da informação como conhecimento”

Replicando o mote da palestra de sábado, porque é que o “jornalismo lento” é importante? “Falar em slow journalism é apelar à valorização da informação como conhecimento. As redes sociais podem ter criado a falsa ideia de estarmos constantemente informados, mas, na verdade, estamos só a ler notas de rodapé, histórias com manchetes, mas sem corpo de texto. Isto fornece-nos uma visão demasiado limitada do mundo. Sabemos tudo e, ao mesmo tempo, quase nada. O que não significa que o slow journalism seja um substituto das notícias de última hora, nem que todos os acontecimentos mereçam meses de investigação. É tudo uma questão de ponderação. Há momentos em que um parágrafo pode ser suficiente, mas é importante não nos esquecermos de que há uma história inteira por trás que ainda não conhecemos. A revista ‘Delayed Gratification’ nasce deste conceito, dando continuidade às notícias que já esquecemos”, responde a coordenadora do Manifesto.

No panorama jornalístico português há escassez de oferta nesta área? “Acho que o panorama jornalístico português poderia beneficiar de mais oferta na área do slow journalism. Não sendo um substituto das notícias diárias, o jornalismo de investigação é um complemento que nos permite compreender melhor o desenvolver de um acontecimento e as suas consequências”, afirma Pinto. Com que objetivos é que avançam para esta palestra? “Queremos mostrar que há outras formas de encarar o jornalismo que vão além da pressão de informar mais rápido e em maior quantidade. Também esperamos compreender melhor as rotinas de trabalho de um meio noticioso tão singular como a ‘Delayed Gratification’”, conclui. 

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