Na constelação dos políticos americanos, Joe Biden nunca foi uma estrela. Os oito anos que passou na sombra de Barack Obama confirmaram dele a imagem de “nice guy” que tinha ganho no muito tempo passado no Senado, onde a sua afamada capacidade de diálogo com o lado republicano acabaria, no entanto, por não ser suficiente para evitar, nos últimos anos de mandato, a paralisia legislativa que veio a ofuscar uma das presidências mais promissoras da história contemporânea da América.

No plano externo, onde, por vezes, o papel dos vice-presidentes surge com algum relevo, Hillary Clinton e, depois, John Kerry acabaram por não lhe dar espaço para brilhar, embora a política externa fosse um domínio de ação onde alguma da sua experiência parlamentar anterior lhe tinha dado prestígio.

Poucos candidatos à presidência dos Estados Unidos, em tempos recentes, terão sido escolhidos com menor entusiasmo do que Joe Biden. Tido por um “gaffeur”, nada entusiasmante no discurso, a sua idade não era um fator, à partida, muito apelativo para um eleitorado democrático onde sobressaía uma agenda com laivos radicais. Embora Bernie Sanders não fosse muito mais novo, a sua postura enérgica disfarçava a idade.

Tudo indica que terá sido o sentimento tático de que, para o objetivo principal que era afastar Trump, a seleção de um candidato com imagem mais moderada e “presidencial”, com a vantagem potencial de poder colher simpatias num eleitorado conservador centrista, cansado dos exageros de Trump, que fez pender a balança para Biden. E os democratas estavam certos na sua aposta, como se viu. E logo houve quem dissesse que Biden era um presidente “a prazo”, que Kamala Harris, a sua vice-presidente, seria a verdadeira estrela da companhia, já na calha para a sucessão.

Biden, como se costuma dizer, “saiu melhor do que a encomenda”. Desde logo, montou uma equipa que surgiu com uma imagem muito profissional, com poucas vedetas mas com o que parece ser uma grande solidez. Não fez muitas concessões à ala mais à esquerda na escolha dos nomes, mas mostrou uma abertura à diversidade que surpreendeu.

Porém, mais importante do que isso, colocou no terreno uma agenda legislativa ousada e progressista, que deu já frutos no estímulo à economia, com impactos fortes na promoção do emprego. Embora com hesitações, em áreas muito sensíveis, como as questões da imigração, onde alguns gestos iniciais de generosidade foram sucedidos por recuos, o saldo das medidas propostas não deixa de ser muito interessante, embora o seu destino legislativo último continue incerto, atentas as dificuldades com que se defronta no Senado.

Mas é no plano externo que Biden hoje brilha. Foi firme face à China e Rússia, como todo o eleitorado americano quer, sossegou os aliados e parceiros, exaustos de Trump, face aos quais demonstra uma boa vontade não isenta de firmeza e vontade de liderança.

As expetativas face a Biden não eram elevadas. Partindo desse patamar, ele percebeu que não teria uma segunda oportunidade para criar uma primeira impressão. E essa está a ser excelente.