O infeliz caso Ilhor Homenyuk versus SEF espoletou algo sobre o qual se fala há vários anos: a reforma das polícias. Na prática, o que pretende o Estado é ter um corpo de segurança e polícia eficiente e com um orçamento controlado. Esta é uma equação difícil porque não se trata de reformar algo recente, mas antes reformar instituições com muita história e géneses diferentes. E, por isso, anunciar o que quer que seja merece ser questionado, sendo que é sempre mau fazer uma reforma pública que tem por base um caso concreto.

Mas vamos a ideias. A reunião do diretor nacional da PSP com o Presidente da República desencadeou uma discussão com alguns anos. Já foram discutidos modelos de reforma nos últimos governos. Comecemos pelos obstáculos: integrar a PJ e a vinculação desta ao Ministério Público, sendo que esta instituição ficaria com a vida complicada tendo em conta que olha para a PJ como uma espécie de “braço armado”. Depois existe o obstáculo das disparidades de vencimento, onde a investigação criminal da PJ é muito mais cara do que a polícia de investigação criminal do SEF, PSP ou GNR.

Historicamente, toda a investigação criminal esteve na PJ e esse era um trabalho gigantesco. A divisão de tarefas tornou-se lógica mas criou um outro problema, e isto porque a informação que resulta do pequeno crime é relevante em termos de contribuição para a grande investigação criminal. Ora, depois desta dispersão de funções, aquilo de que os peritos falam é de uma coordenação complicada entre as três polícias.

Existe ainda o tema da chamada “reserva das forças de segurança”, que coloca um outro obstáculo à unificação das polícias. A GNR não tem sindicatos mas sim organizações socioprofissionais. Há quem pense que, por isso, é impossível uma fusão com a PSP, que tem sindicatos – em caso de greve da polícia, quem garantiria a segurança? Ou a atual GNR ganha direitos sindicais ou terão de ficar forças de segurança de fora para situações de crise.

Temos ainda o modelo de responsabilidade territorial da GNR e da PSP, sendo que os especialistas acreditam que a primeira está sobredimensionada, pois atua no espaço rural, enquanto a PSP está subdimensionada em recursos, uma vez que opera nos espaços urbanos e trabalha para 70% da população. Talvez fizesse sentido integrar funções de policiamento de proximidade da GNR na PSP. E não nos esqueçamos que a GNR tem natureza militar, logo faz todo o sentido manter a autonomia.

Sendo um órgão de polícia e de defesa nacional, numa eventual reforma não será despiciendo alocar à GNR tudo o que fosse de reserva estratégica nacional, policiamento marítimo e das alfândegas, florestas e trânsito, a par de manter as forças militarizadas e as honras de Estado. E sobre o SEF?

Na verdade não foi a PSP mas antes a GNR quem lançou a primeira oferta para os absorver já que as fronteiras competem à GNR e, tradicionalmente, era a força que estava nas alfândegas. A PSP tem a lógica de liderar uma polícia única e daí a iniciativa do comando nacional, enquanto para a PJ o interesse no SEF está na cooperação internacional em matéria de emigração e no acesso aos dados da Interpol.

O SEF surgiu na lógica do espaço Schengen e com o objetivo de ter polícia civil nas fronteiras. Recordemos ainda que o SEF tem um corpo de inspetores respeitado internacionalmente e não fará sentido atribuir esta responsabilidade a uma polícia que não tem este nível de qualificação. Perante estes dados, não parece fácil uma reforma.