[weglot_switcher]

Marco Freire admite que grupo Arrow olhe para oportunidades de consolidação em Portugal

A Whitestar tem crescido 25% ao ano, em termos de volumes sob gestão. Mas o objetivo é continuar a crescer 10% ao ano no resultado antes de juros e impostos, afirmou Marco Freire em entrevista. O CEO da empresa do grupo Arrow não afasta o crescimento por aquisições.
  • Cristina Bernardo
22 Fevereiro 2022, 17h30

Em entrevista ao Jornal Económico, Marco Freire, Chief Executive Officer (CEO) Whitestar Asset Solutions admitiu que o grupo Arrow Global (que detém a Whitestar, a Norfin e participa no Fundo da Arrow Global que adquiriu o Vilamoura World) venha a fazer aquisições em Portugal. Não só ao nível da compra de ativos hoteleiros, mas também que participe na consolidação do sector do servicing.

Quando questionado sobre se o Grupo Arrow prevê crescer através de outras aquisições em Portugal, Marco Freire diz que o fundo da Arrow “fará brevemente uma aquisição de um operador hoteleiro de média dimensão e português, com maior enfoque na zona do Algarve e que vai permitir aqui alguma consolidação nesse segmento a partir de Vilamoura e de outras aquisições que já fizemos também na região”.

“Fora isso, o grupo está sempre a olhar para oportunidades de consolidação nos sectores onde se insere. Não temos nada especificamente em pipeline, mas havendo uma oportunidade avançaremos”, admite o CEO da Whitestar.

O grupo especializado na compra de ativos “stressados” – ganharam a compra da carteira Mercury, da CGD e a carteira Harvey, do Novobanco – admite também a consolidação ao nível das empresas de servicing. “Acho que poderá haver alguma consolidação”, disse Marco Freire, que ressalva no entanto que “ainda há espaço e mercado para a continuidade de um crescimento orgânico”.

Em entrevista, o CEO da Whitestar disse que acreditar que “poderá haver alguma consolidação [das empresas de servicing] neste ciclo, em que o produto fica mais estagnado, mas tudo se avizinha para a criação ou a geração de um novo ciclo de aumento de NPL a curto, médio prazo e que vai depois originar mais negócio para o sector”.

A empresa de servicing portuguesa do grupo Arrow admite que, quando a legislação europeia entrar em vigor, os “players” mais pequenos irão ser absorvidos num processo de consolidação do sector.

“Essa regulação vai permitir, por um lado, alguma consolidação” uma vez que “vai permitir eliminar do mercado alguns players mais pequenos que não vão conseguir cumprir e sobreviver num mercado mais regulado e vai dar mais força a outros players, como nós, que já estamos apetrechados para actuar no mercado regulado”, afirma.

“A Whitestar tem defendido, desde há muitos anos, a regulação do setor. Que nós achamos que é bastante benéfico e bem-vindo. A Whitestar, como pertence a um grupo internacional e que estava cotada em bolsa até há pouco tempo, já se rege pelas boas práticas dos mercados internacionais”, salienta o CEO.

Apesar de admitir o crescimento por aquisições, o CEO da gestora admite que há espaço para o crescimento orgânico. A Whitestar tem crescido 25% ao ano, em termos de volumes sob gestão. “Acreditamos que mesmo com estes níveis historicamente baixos de NPL (non-performing loans) vamos continuar a crescer. Os nossos concorrentes, provavelmente, também vão conseguir fazer esse caminho”, disse.

“O nosso objetivo é continuar a crescer 10% ao ano no resultado antes de juros e impostos. É isso que temos acordado com o acionista. É esse o desafio”, afirmou Marco Freire.

Questionado sobre se a redução da dimensão do malparado no balanço dos bancos é um tema que os preocupa, na medida em que pode ameaçar o volume de negócios, Marco Freire, admite que sim, mas não sem antes dar um contexto. “Nos últimos cinco anos houve uma redução enorme do rácio de NPL (Non-Performing Loans) em Portugal, que passou de 18% para os atuais 4%. Essa diminuição do rácio de NPL teve a ver com três grandes factores, o primeiro com uma melhoria do cenário macroeconómico que obviamente ajuda na recuperação do crédito e na redução dos NPL (crédito malparado) em particular. Segundo, pela venda massiva de carteiras de NPL que os bancos portugueses fizeram nos últimos anos. E terceiro porque os bancos nos últimos anos concederam muito mais crédito do que concediam há uns anos atrás e isso, aumentando o denominador que é o volume de crédito total, também diminui o rácio da NPL em conformidade. Dito isto estamos em mínimos históricos do rácio de NPL nestes 4%”.

Falta de produto NPL vai dar origem a mercado secundário

Numa perspectiva de mercado, Marco Freire afasta a ideia de que as vendas de carteiras de NPL vão ser tão fortes, ou com os mesmos volumes, “como nos últimos três ou quatro anos”. Mas o CEO da Whitestar acredita que vão sempre existir vendas, ainda que de volumes mais baixos.

O responsável pela Whitestar defende, isso sim, que “a falta de produto [crédito NPL] no mercado primário, pelo facto de os rácios de NPL estarem em mínimos históricos, vai ser compensado, em parte, pelo mercado secundário”.

“Haverá aqui uma dinamização do chamado mercado secundário, ou seja, investidores que compraram carteiras há cinco, quatro ou três anos e que chegam agora à maturidade dos fundos ou ao momento em que têm que pagar os empréstimos que obtiveram para adquirir essas carteiras e que, para acelerar esse fecho, vão colocar carteiras no mercado”, antevê.

“Já se começa a ver essa tendência e nós acreditamos que isso vai crescer durante o ano a partir de 2022 em diante, portanto vamos ter pela primeira vez em Portugal, de uma forma mais dinâmica, um mercado secundário ativo devido a grandes compras que existiram entre 2016 e 2018 e que agora provavelmente virão as caudas dessas carteiras para o mercado secundário”, diz Marco Freire.

Depois, 65% dos NPL que existem hoje é crédito a empresas e portanto há uma concentração e uma exposição grande a esse segmento de crédito no que toca a crédito malparado, refere. “Isto tem uma explicação, pois enquanto os outros mercados do sul da Europa criaram soluções estruturais para a venda de NPL, nomeadamente a criação de bad banks, como em Espanha, ou as titularizações com garantia do Estado, como houve em Itália na Grécia, Portugal não adotou nenhuma solução dessas. O que significa que durante o período pós-crise financeira de 2008 a 2015, os bancos portugueses não conseguiram vender carteiras de NPL porque não conseguiam suportar o impacto que essas vendas teriam nos seus balanços. E o segmento onde o impacto é maior é no crédito NPL a empresas, que é onde existe a maior diferença entre o valor que os bancos têm reconhecido no seu balanço após imparidades, e o valor real de mercado desses ativos”, assegura.

“Portanto, em Portugal o que aconteceu foi que houve uma venda massiva do chamado crédito a particulares em incumprimento com e sem garantia, carteiras mais granulares, e os bancos foram ficando com a exposição de crédito NPL a empresas”, resume Marco Freire.

Entretanto, “os bancos começaram a colocar no mercado esse crédito NPL a empresas de 2019 em diante e que agora vão colocar os créditos dos chamados single names, portanto vão vender caso a caso, ou seja crédito a crédito por devedor”, diz o CEO da gestora, admitindo que a exposição a malparado que ainda existe nos balanços do banco “é muito essa”.

O mercado de venda de NPL vai assim manter-se através destas vendas de crédito a empresas, “quer seja em pequenas carteiras quer seja em carteiras de single names, e depois há algumas situações particulares que passam pelo que chamamos de spin-off da gestão dessas carteiras de crédito”, disse referindo-se ao que está a ser preparado pelo Banco Montepio para carteira baptizada com o nome de “Douro”.

Marco Freire, tal como referiu na entrevista publicada na edição em papel do Jornal Económico, defende que a pandemia criou alguma exposição adicional de NPL em setores muito específicos como o turismo, a restauração, o retalho, mas o impacto ao nível do aumento do malparado no balanço dos bancos foi muito residual.

“As dificuldades que existem nas pequenas empresas refletem-se no cumprimento do crédito principalmente em alguns sectores em particular que estão hoje mais expostos. Nos outros, principalmente o segmento dos particulares, aí não se notou de facto um grande impacto”, referiu.

Quando questionado sobre que classes de ativos espera um impacto maior de subida de malparado, Marco Freire respondeu sem hesitar: “Principalmente no crédito hipotecário”. “Não é algo que se vá notar no imediato. Na minha opinião está a formar-se o início de um novo ciclo de potencial aumento dos NPL. O crédito hipotecário que está indexado à Euribor e que tem spreads baixos vai ter um aumento relativo considerável e vai pesar mais em termos da prestação mensal e vai originar níveis de incumprimento superiores”, defende.

A Arrow Global é uma empresa britânica que opera no mercado global de compra de créditos de bancos e de dívidas de empresas.

A Arrow é um investidor e gestora de ativos líder na Europa no setor de ativos nonperforming e non-core. “Estamos a evoluir nosso modelo desenvolvendo um negócio de Gestão discricionária de Fundos e Investimentos para capitalizar as oportunidades de mercado”, lê-se no site da empresa.

Recentemente foi adquirida por outro grupo inglês, o TDR Capital que mudou a estratégia de gestão para uma gestão mais descentralizada pelas várias geografias onde opera.

Questionado sobre se foi na sequência desta mudança de acionista que Maria Luís Albuquerque, ex-ministra das Finanças, saiu da administração executiva da Arrow, Marco Freire confirmou”.

Houve algumas alterações, não só nos administradores não executivos, entre os quais estava a Maria Luís Albuquerque, mas também na própria estrutura executiva de gestão, que praticamente foi toda alterada. A nova gestão do grupo tomou posse pouco depois da entrada da TDR e são pessoas que já estavam no grupo. A nova estrutura de gestão do grupo acredita que as plataformas nas cinco geografias onde o grupo atua devem ser autónomas porque assim criam mais valor, já que são geridas por especialistas no mercado em que atuam. A centralização no Reino Unido acrescentava pouco valor e era mais um custo do que um criador de valor para a atividade do grupo e foi isso, grosso modo, que se alterou”, referiu em entrevista ao JE.

A empresa em Portugal passou por um processo de redução de pessoal, ao que sei saíram cerca de 10% das pessoas. Marco Freire explicou que foi tudo por mútuo acordo. “Estamos a falar de 41 pessoas, que saíram por mútuo acordo”.

“A aproveitamos esta mudança acionista para fazer uma reestruturação, na sequência de uma nova lógica de gestão”, disse o CEO que garante que não tem prevista fazer uma redução ou uma reestruturação adicional àquela que foi feita no final de 2021. “Pelo contrário, temos pretensões de continuar a crescer e é isso que temos feito e temos vindo a contratar mais pessoas”.

Foi noticiado que o grupo Arrow comprou a carteira Mercury, da CGD e a carteira Harvey, do Novobanco. Mas também perdeu outras três: a Orion, do Novobanco, a Gerês – que foi ganha pela LX Partners, e o portfólio Lúcia, do BCP, desafiado a explicar o racional de concorrerem em parceria, Marco Freire responde que “não somos nem queremos ser vistos como cativos da Arrow e por isso promovemos sempre parcerias em que conseguimos alinhar interesses com um investidor terceiro”.

“Esse alinhamento de interesses é precisamente pelo facto de a Arrow ou do seu fundo co-investir e mostrar, por isso, que está disposto a pôr dinheiro aos valores a que a Whitestar avaliou as carteiras. Depois porque os investidores com que fazemos parcerias são os melhores para aquelas carteiras em particular. Estes fatores fazem com que o alinhamento de interesses seja total”, refere o CEO.

Como é que os investidores constroem o preço das carteiras de NPL?

Uma carteira sem garantia real tem duas componentes, começa por explicar o responsável pela Whitestar.

“Os créditos de maior valor, principalmente de empresas, são vistos caso a caso, linha a linha, com uma análise mais profunda, casuística, e com um análise financeira da empresa e uma análise legal do processo Enquanto que todos os outros créditos mais granulares o preço é feito estatisticamente, com base nas curvas de experiência de carteiras semelhantes que temos sob gestão. Nesse aspecto, a Whitestar tem aqui uma posição única porque, sendo o servicer mais antigo e que teve sempre maiores volumes e maior exposição a esse tipo de produto, também é aquele que tem mais informação porque já geriu carteiras destas em cenários de crise financeira, em cenários de recuperação e de crise pandémica”.

Portanto, diz, “temos aqui os vários ciclos e um conhecimento e informação que nos permite fazer esse cálculo com algum grau de certeza”.

Marco Freire explica que “no crédito com garantia real há variáveis importantes. Desde logo o valor do imóvel, qual é a garantia do crédito, mas depois também a análise do processo judicial, se esse crédito já está litigado ou judicializado, em que fase é que está, qual é o ranking daquela hipoteca no processo, quais são os custos que estimamos ter com o processo e há aqui custos avultados. Não só custos de tribunal, mas também impostos, o custo da própria gestão dos créditos, tudo isso são custos que entram aqui na formulação do preço. Portanto, pegando nestas componentes qual é o valor de recuperação que nós estimamos para aquele ativo, deduzido destes custos de recuperação ao longo do tempo, descontados a taxa de retorno que cada investidor pretende ter face ao risco de cada carteira, chegamos ali a um preço”.

No crédito com garantia real, acrescenta, “um dos nossos fatores críticos de sucesso é que nós fomos o primeiro servicer em Portugal a ter uma equipa interna de due diligence, que faz a avaliação do ativo imobiliário que garante o crédito, que faz a análise legal do processo judicial que está associado ao crédito, faz a análise financeira e depois faz a modulação desse preço para o investidor”.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.