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Angola anuncia medidas para minimizar recessão em 2020 e prepara revisão orçamental

A ministra das Finanças de Angola, Vera Daves de Sousa, anunciou hoje a revisão do cenário macroeconómico, baixando em 20 dólares a cotação do petróleo utilizada no documento orçamental de 2020. Avançou igualmente com a utilização de 1,5 mil milhões de dólares do fundo soberano e diversas medidas de cortes, totalizando 5,1mil milhões de dólares. Tudo isto para travar a amplitude da recessão prevista para este ano.
27 Março 2020, 22h45

A ministra das Finanças de Angola, Vera Daves de Sousa, anunciou hoje as medidas para revisão do cenário macroeconómico, fruto da crise gémea da Covid-19 e do choque petrolífero, que vão permitir rever o Orçamento Geral do Estado de Angola para 2020. De acordo com o documento a que o Jornal Económico teve acesso, Vera Daves de Sousa admitiu que as previsões macroeconómicas “assinalam uma recessão em 2020 em torno de 1,21%, como resultado da degradação do quadro económico envolvente”. “Este desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) é resultado de uma expectativa de redução da produção petrolífera em 0,17%, combinada com uma redução do PIB não petrolífero em 0,98%”.

A ministra das Finanças de Angola anunciou igualmente redução da despesa pública aos níveis do corte orçamental. “O corte da despesa pública não incidirá apenas sobre o investimento e capital. Vamos acelerar a reforma do Estado com a redução de estruturas com funções e atribuições redundantes e otimizando o pessoal para as necessidades que se colocam ao nível da administração local do Estado”, referiu a ministra. Ao todo, o impacto das medidas avançadas será da ordem dos 5,1 mil milhões de dólares.

Em paralelo com a preparação da proposta de revisão do OGE 2020, o Ministério das Finanças de Angola foi autorizado pelo titular do poder Executivo, o presidente João Lourenço, a tomar medidas de política adicionais, nomeadamente, “desmobilizar do Fundo Soberano de Angola (FSDEA) recursos adicionais no valor de 1,5 mil milhões de dólares, mediante o compromisso de uma recapitalização futura, logo que as condições das finanças públicas o permitam”, adiantou a ministra das Finanças

Vera Daves de Sousa referiu igualmente que ia “conjugar esforços com o Banco Nacional de Angola para aumentar a taxa de ‘rolagem’ no financiamento interno e incentivar o Instituto Nacional de Segurança Social (INSS) a rentabilizar parte dos seus recursos pela via da compra de títulos do Tesouro”.

Quanto à projeção de impacto das medidas anunciadas, a ministra das Finanças referiu um corte no Orçamento de Bens e Serviços de 483 milhões de dólares, um corte Orçamento de Transferências de 202,8 milhões de dólares, outro corte no Orçamento do Programa de Investimento Público (PIP) de 531,3 milhões de dólares, a descapitalização do Fundo Soberano de Angola (FSDEA) em 1,5 mil milhões de dólares, a alienação de participações e activos do Programa de Privatizações (PROPRIV) em 400 milhões de dólares, a rentabilização de parte dos recursos do Instituto Nacional de Segurança Social (INSS) pela via da compra de Títulos do Tesouro no total de 300 milhões de dólares, a suspensão da componente em cash da regularização dos “Atrasados Internos” fora do “Sistema Integrado de Gestão Financeira do Estado” (SIGFE) e restos à pagar referentes a 2019, no valor de 536 milhões de dólares e um alcance da taxa de rollover mínima de 50% no financiamento interno no montante de 1,15 mil milhões de dólares. No total, o efeito das medidas é da ordem dos 5,102 mil milhões de dólares.

“Cabe-me, como ministra das Finanças, comunicar a todas as angolanas e angolanos, as medidas prioritárias para o País em tempo de pandemia, ou, como muitos chefes de Estado e de Governo pelo mundo fora consideram, em tempo de guerra contra um inimigo invisível”, referiu a ministra.

“Também nós, angolanas e angolanos, temos de nos preparar para o choque que essa nova realidade irá acarretar, e de sobremaneira, no nosso dia-a-dia. As nossas crianças não podem ir à escola, a maioria de nós não vai poder ir trabalhar, nem ir à igreja, e os nossos almoços de domingo, em família, com mãe, pai, tias, tios, sobrinhos e primos, um momento essencial da nossa vida em comunidade, estarão suspensos – têm de ficar suspensos. O nosso contacto social tem de ser reduzido ao mínimo indispensável. Até ordens em contrário, não devemos sair das nossas casas”, explicou a Vera Daves de Sousa.

“Esta guerra tem na linha da frente o sector da Saúde e todos os agentes de saúde pública – médicos e médicos intensivistas, cientistas e epidemiologistas, enfermeiros e auxiliares hospitalares, técnicos de laboratório, soldados, policias, bombeiros e voluntários… que se congregam num exército corajoso e abnegado no combate a um inimigo invisível, mas extremamente letal”, referiu.

“Em termos económicos, também estamos numa situação de guerra. Grande parte da força de trabalho do País vai estar envolvida neste esforço só equiparável a uma guerra em larga escala, afastada das atividades produtivas, porque confinados às suas casas. Este é o contributo que se espera dos cidadãos e o mesmo espírito será exigido quando retomarmos as nossas atividades profissionais e produtivas”, adiantou a ministra.

Por outro lado – referiu Vera Daves de Sousa – “é necessária uma mobilização massiva de recursos públicos e privados para que possamos enfrentar a pandemia, dotando os serviços de saúde de todos os meios necessários como os kits de testes, ventiladores, máscaras, desinfetantes, medicamentos, camas e um sem fim de condições que o Executivo está a assegurar, em nome de todos nós”.

“Para as famílias, o Executivo compromete-se a intensificar o esforço que tem vindo a ser feito no combate à pobreza e no apoio às famílias; sendo certo que, na verdade, os nossos programas, por si só, não serão a panaceia completa, mas esperamos dotar as pessoas de meios e capacidades para que mais do que o assistencialismo possam ter acesso a formas de autossustento”, adiantou.

“Para as empresas nacionais, está reservado um papel cada vez maior e central na economia. Em todos os países, e Angola não é exceção, esta pandemia está a provocar uma alteração profunda do quadro económico. A resposta de emergência que o Executivo está em condições de dar irá ter presente a necessidade de se manter, no essencial, a atividade empresarial”, referiu a ministra.

“Não obstante todas as medidas de estímulo que possam ser tomadas, a verdade é que o objetivo maior é o de reduzirmos o papel interventivo do Estado, cingindo-o ao seu lugar de regulador”, comentou.

“Por isso, vamos continuar a criar um ambiente mais propício para o fortalecimento do clima de negócios. Acreditamos, da parte do Ministério das Finanças, que a proposta de redução do Imposto Industrial, entregue a Assembleia Nacional e que será discutida nos próximos tempos, persegue este objectivo”, anunciou a ministra.

“Pagando menos impostos ao Estado, acreditamos que as empresas terão mais recursos para reinvestirem e com isso reconduzirem os seus negócios. Sem dúvidas, em última análise, ganha o nosso PIB”, defendeu Vera Daves de Sousa.

O ministério das Finanças de Angola desenhou por isso medidas que passam pelo “reforço da capitalização do Fundo de Garantia de Crédito”, pelo “reforço das linhas de crédito para apoio às iniciativas empresariais do sector privado (através dos Avisos 4 e 7 do Banco Nacional de Angola)”, pela “imediata operacionalização dos Centros Logísticos de Distribuição (CLOD’s) para apoio aos produtores de alimentos” e pelo “início efetivo do Programa de Comércio Rural”, referiu a ministra.

“Os tempos que vivemos são de um duplo choque”, referiu a ministra das Finanças de Angola, considerando que “o choque do coronavírus, que põe em causa a saúde pública mundial, mas, e ao mesmo tempo, o choque da queda dos preços do petróleo no mercado internacional para níveis verdadeiramente catastróficos para Angola. A falta de acordo entre a OPEP e os outros países produtores criou um excesso na oferta de petróleo com consequências dramáticas no preço, havendo notícias de produtores que, por estes dias, colocaram o crude à venda a preços de saldo. Diante deste cenário, assistimos a uma redução da procura mundial do petróleo ao mesmo tempo que existe um excedente na oferta”.

“Mas essa turbulência que vivemos agora não poderá, de forma alguma, pôr em causa o processo de reformas que o Executivo tem vindo a desenvolver, absolutamente indispensáveis à diversificação da economia e ao desenvolvimento do país, e muito menos abrandar o esforço e o empenho no combate à corrupção, ainda que, admitimos, algumas dessas reformas possam estar tendencialmente comprometidas”, lamentou Vera Daves de Sousa.

“Há projeções que apontam para uma quebra acentuada do PIB nas principais economias do mundo, a economia norte-americana pode sofrer uma quebra de 24% do PIB no 2.º semestre deste ano, e isto é, note-se, uma previsão otimista. Segundo o FMI e a OCDE, as economias da União Europeia e do Japão enfrentam riscos de colapso. O Continente Africano, infelizmente, não passa ao lado da pandemia, logo, poderá também não passar ao lado desta crise económica de dimensões nunca vistas e de difícil previsão. Como é claro, a vida das angolanas e dos angolanos e a economia de Angola poderão não sair ilesas deste terrível ‘tsunami’”, disse a ministra.

Assim, explica que em Angola, “a batalha tem duas frentes decisivas: a resposta à pandemia e a queda abrupta dos preços do petróleo no mercado internacional, o que, inevitavelmente, nos leva à necessária revisão de todas as nossas projeções”. Por isso, “a situação, ao fim do primeiro trimestre, nos obriga a adotar o conjunto de medidas aprovadas hoje em sede do Conselho de Ministros”, adiantou.

Entre as medidas aprovadas está, segundo a ministra, a “cativação de 30% das despesas da categoria bens e serviços, até a finalização do processo de revisão do Orçamento Geral do Estado OGE 2020, desde que não estejam relacionadas com alimentação (principalmente dos hospitais públicos e forças de segurança), medicamentos, limpeza e saneamento”.

Mas, também, a “suspensão de parte das despesas de capital, com destaque para as novas aquisições de imóveis no país e no exterior”, a “suspensão das despesas de apoio ao desenvolvimento que não sejam de carácter prioritário e estrutural. Entende-se como sendo prioritários os projetos de combate à pobreza, abastecimento logístico, ações inspetivas, os projetos ligados à luta às grandes endemias (cólera, malária, HIV-SIDA), bem como todos os projetos de foro social”, defendeu a ministra das Finanças de Angola.

Além disso, também adiantou a “suspensão de todos os ‘créditos adicionais’, com exceção das despesas com o pessoal e projetos de carácter prioritário e estrutural”, a “suspensão de todos os processos de novas admissões e promoções na Função Pública, com exceção dos sectores já previamente aprovados, até a finalização da revisão do orçamento” e a “aceleração da implementação da orientação do titular do Poder Executivo – o presidente João Lourenço – no sentido de “todos os processamentos de despesas, inclusive de pessoal, ocorrerem por via do Sistema Integrado de Gestão Financeira do Estado (SIGFE)”.

Na mesma lista consta a “redução das viagens dos membros do Executivo e de delegações Executivas Governamentais, ao estritamente necessário, adotando-se sempre medidas de minimização de custos”, referiu Vera Daves de Sousa, bem como a “redefinição e tipificação da gama de viaturas a serem atribuídas aos gestores do Estado, no exercício das suas funções, para as diferentes categorias de responsabilidade” e a “suspensão da aquisição de novas viaturas para uso pessoal e redefinir as prioridades das viaturas cujo processo de aquisição já tenha sido autorizado e iniciado”

“A suspensão das exportações de bens alimentares nacionalizados, incluindo os transportados pelos habitantes de zonas fronteiriças, a partir do terceiro dia a contar da entrada em vigor do presente diploma, por um período de trinta dias”, é outra das medidas que terá um impacto muito relevante na economia angolana, assim como a “isenção do pagamento do Imposto sobre o Valor Acrescentado e dos direitos aduaneiros para as mercadorias importadas para fins de ajuda humanitária e doações”.

Tratam-se de “medidas aprovadas de carácter estrutural e tendentes à reprogramação macroeconómica”, com “inicio da preparação, pelo Executivo, do processo de revisão do Orçamento Geral do Estado de 2020, cuja proposta contamos que seja submetida à Assembleia Nacional até à primeira quinzena de maio”, anunciou Vera Daves de Sousa, revelando que “a proposta de OGE revisto terá como pressuposto um preço médio de referência do petróleo de, no máximo, 35 dólares, destacando-se para este cenário uma redução de 20 dólares em relação ao OGE inicial de 2020”.

A ministra das Finanças ainda detalho que Angola terá “uma ligeira queda da produção petrolífera, que irá cifrar-se em 1,36 milhões de barris de petróleo por dia e a manutenção dos níveis de produção de diamantes. Iremos assistir também a uma redução do preço médio do quilate que passaria dos 162 dólares para os 100,3 dólares”, admitindo que o seu país deverá “assistir a um agravamento da depreciação cambial e a uma inflação ligeiramente acima do esperado”.

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