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Antonoaldo Neves: foi-se embora o gestor que deixou a TAP numa crise profunda

O ex-CEO deixa a companhia aérra nacional com prejuízos de mais de 220 milhões de euros nos últimos dois anos, uma situação que se deverá agravar no presente exercício. Também não conseguiu colocar a TAP no mercado de capitais, como pretendia.
  • António Pedro Santos/Lusa
18 Setembro 2020, 17h20

Concretizou-se esta semana a saída de Antonoaldo Neves do cargo de CEO da TAP, uma decisão que o Governo português aguardava há várias semanas, principalmente desde que chegou a acordo com o anterior acionista da TAP Navid Neeleman, para a compra da sua posição acionista de 22,5% na companhia aérea nacional.

O anúncio foi feito num comunicado enviado à CMVM – Comissão do Mercado de Valores Mobiliários e revela que foi o próprio Antonoaldo Neves a renunciar a este cargo e a outras funções que exercia na TAP.

Antonoaldo Neves chegou à TAP pelas mãos de David Neeleman em 2015, para exercer o cargo de administrador para a área comercial da transportadora aérea nacional.

Em 2018, Antonoaldo Neves assume as funções de CEO da TAP, substituindo no cargo uma referência no setor e na empresa, Fernando Pinto, outro gestor brasileiro.

Cedo traçou as suas metas: fazer crescer a TAP “mais em números, em qualidade e rentabilidade”.

Não se pode dizer que tenha conseguido cumprir estas metas: nos últimos dois anos, ainda antes da pandemia e com o setor do turismo em forte ctescimento no nosso país, a TAP registou fortes prejuízos: 118 milhões de euros em 2018 e 105,6 milhões de euros de perdas no ano passado.

Depois de um forte investimento na aquisição de novos aviões e de contratação de pessoal, a TAP é apanhada este ano pela Covid-19, que a obrigou a deixar em terra grande parte da sua frota, agravando a já periclitante situação financeira da companhia e obrigando o Governo a negociar com Bruxelas uma injeção de 1.200 milhões de euros, de que já foram recebidos cerca de 500 milhões de euros para resolver os problemas de tesouraria mais prementes.

Face a esta conjuntura, aos 223,6 milhões de euros de prejuízos da TAP nos últimos dois exercícios deverá somar-se uma nova linha de perdas referente ao presente ano, aguardando-se a divulgação dos resultados referentes ao primeiro semestre de 2020, mas com perspetivas negativas de acréscimo de prejuízos.

Outro dos objetivos do mandato que Antonoaldo Neves não chegou a terminar – acabava no final deste ano – era a colocação da TAP no mercado de capitais, beneficiando da sua experiência à frente dos destinos da Azul, companhia aérea brasileira de David Neeleman, onde conduziu uma bem sucedida operação de dispersão de capital em bolsa.

De seu nome Antonoaldo Grangeon Trancoso Neves, 45 anos, com dupla cidadania (portuguesa e brasileira), casado, três filhos, formou-se na Universidade de Virgínia, Estados Unidos, tem MBA em administração de empresas, mestrado em finanças corporativas e é bacharel em engenharia civil.

No seu currículo, destaca o facto de ser membro do conselho de administração e da comissão executiva da TAP desde 2017, mas também a presidência que exerceu na Azul, entre 2014 e 2017

“Liderou uma das maiores companhias áreas do Brasil, que transporta mais de 22 milhões de passageiros por ano, com cerca de mil voos por dia. Com sucesso, liderou o processo de abertura de capital nas bolsas de Nova Iorque e São Paulo, captando mais de mil milhões de dólares para a empresa durante o período da maior crise brasileira”, escreveu Antonoaldo sobre si próprio no referido currículo profissional.

De 2000 a 2014, foi sócio da consultora McKinsey, nos escritórios de São Paulo, tendo liderado as práticas de aviação, infraestrutura e concessões na América Latina, além de ter conduzido o processo de fusão de duas grandes companhias aéreas no Brasil.

“Devolveu o novo marco regulatório para o setor de aviação no Brasil, bem como liderou os estudos que resultaram no desenvolvimento da visão e planeamento estratégico para o setor até 2030, incluindo recomendações de revisão completa no código aeronáutico brasileiro e projeção de procura de passageiros”; “concebeu a moldagem das concessões aeroportuárias no Brasil, incluindo a revisão dos termos contratuais e dos mecanismos de incentivo para balançar investimento e custo para o setor; e “concebeu o plano de reestruturação e abertura de capital da Infraero, maior operador aeroportuário do Brasil”, pode ainda ler-se no referido currículo profissional de Antonoaldo Neves.

Fluente em português e inglês e com nível avançado em espanhol, Antonoaldo Neves dirigiu-se aos trabalhadores da TAP no momento da saída dizendo que cessa as funções de CEO com “o sentimento de missão cumprida”, mas o certo é que deixa a companhia aérea nacional mergulhada numa das maiores crises da sua longa história, com o espectro de despedimento de pessoal e de redução da frota.

Além das evidentes dificuldades no plano financeiro, o mandato incompleto de Antonoaldo Neves como CEO da TAP fica também marcado, principalmente nos últimos meses, por um indisfarçável mal-estar com o ministro da tutela, Pedro Nuno Santos, inclusivamente com a troca de palavras mais azedas entre ambos, mas nunca frente a frente, em termos públicos, em diversas audições parlamentares na Assembleia da República.

Para já, Anotonoaldo Neves foi substituído no cargo por Ramiro Sequeira, até que o Governo opte por uma solução mais duradoura para CEO da TAP, após o anunciado processo de recrutamento internacional para o cargo, a desenvolver por parte de uma empresa de ‘head-hunters’, que deverá ser contratada nas próximas semanas.

Curiosamente, Raffael Quintas, outro administrador braileiro que se encontra na TAP pelas mãos de David Neeleman, foi quem assinou o comunicado de anúcio da renúncia ao cargo de Antonoaldo Neves, mas parece que vai escapar à razia e manter-se na TAP como administrador para a área financeira e assento na respetiva comissão executiva.

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