Há duas coisas que, na atual pandemia, se destacam: uma é muito bem expressa pela palavra inglesa hindsight, difícil de traduzir, mas que mais ou menos significa a capacidade de acertar retrospetivamente; a outra, é a certeza com que se afirma tudo e o seu contrário.

Relativamente à primeira, corresponde àqueles que dizem “eu bem tinha avisado”. Provavelmente tinham, mas só falam quando acertam ou, o que é o mesmo, só falam os que acertam. O caso do Natal é paradigmático: os muitos que acharam que não se podia fechar agora calam-se e deixam a culpa única aos decisores, porque esses não podem fugir. Os outros, os que de facto foram sempre contra, pelo contrário não se calam, com um tom de uma certa altivez.

Relativamente à segunda, é ver as certezas com que se afirmam coisas que, na realidade, dificilmente são demostráveis. Um caso típico foi o fecho das escolas. É difícil ter a certeza do seu efetivo efeito no contágio. Os modelos usados têm a fragilidade de serem modelos, cuja validade depende, entre outras coisas, da parametrização. Mesmo os melhores, só perante os resultados são suscetíveis de serem ajustados e, muitas vezes, são difíceis de avaliar.

“The Economist”, cuja seriedade e competência é reconhecida, defende que o número efetivo das infeções, na primeira vaga, foi muito superior ao reportado. Concretamente, em setembro de 2020, perante os 30 milhões de casos confirmados, a sua estimativa é de que seriam 630 milhões. Como o reportado depende dos testes feitos, nunca será possível ter a certeza de o que está certo ou errado. No seu número de 23/01, é citado um estudo da Brown University em 10.000 distritos escolares nos EUA, que indica que as taxas de infeção não variam significativamente pela existência de ensino presencial ou remoto, isto é, com escolas abertas ou fechadas.

Mas a gravidade dos números, a voz dada nos media aos que clamavam pelo fecho criou uma pressão social em que mesmo os que tinham dúvidas passaram a achar que o melhor era fechar. Claro que é a solução mais fácil do ponto de vista da pandemia: pelo menos não agrava. Porém, os outros custos, sobre os jovens, a sua socialização e aprendizagem, o custo sobre os mais frágeis e o agravar das diferenças sociais esses serão inevitáveis.

Seja como for, o que é óbvio é que se continua a saber muito pouco; o que é óbvio é que é necessário decidir, monitorizar, avançar e recuar. Isso não é um defeito, é uma necessidade. É assim que se faz com método científico. O que é necessário, para bem da população, sua possível tranquilidade e confiança, é que se admitam os erros, mas se valorize quem os assume e corrige, é que não se dê a sensação de que é tudo um disparate, porque não é!

O caso da vacinação dos políticos é ilustrativo: se a sua recusa inicial poderá ter sido uma cedência demagógica perante o receio do clamor que se geraria se se decidisse de outra maneira (e gerava-se, de certeza), o recuo, cujos contornos exatos ainda não está definido, é agora apontado como “tudo vale”, “do 8 ao 80” a que se junta o populismo das recusas. O papel de filtragem e explicação da imprensa é, mais uma vez, absolutamente essencial.