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Bancos dão ordem para executar totalidade da Coleção Berardo

CGD, BCP e Novo Banco deram à execução penhores sobre 100% dos títulos de participação dados como garantia de créditos de mais de 900 milhões.
25 Maio 2019, 14h00

A totalidade da coleção Berardo arrisca ser penhorada pelos principais credores de Joe Berardo. Caixa Geral de Depósitos, BCP e Novo Banco querem reaver créditos em torno de mil milhões de euros através da execução de penhores dos títulos da Associação Coleção Berardo (ACB), proprietária das obras de arte que foram cedidas ao Estado. Estes são os bens móveis de Joe Berardo sinalizados pelos bancos para penhorar no âmbito da acção judicial que avançaram no final de abril contra o empresário, juntando esforços para executar a dívida do empresário madeirense que ascende a 962 milhões de euros. Uma iniciativa conjunta que acontece depois de no início do ano ter falhado um acordo para a liquidação dos créditos.

O Jornal Económico apurou que na acção executiva sumária que deu entrada no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, a 20 de abril, a CGD, o BCP e o Novo Banco apresentaram títulos executivos “fortes”, onde constam os títulos da Associação Coleção Berardo  que foram dados como penhores (garantias reais) dos créditos a Joe Berardo para compra de ações. Em causa estão garantias prestadas pelo empresário junto dos bancos de 75% dos títulos da dona da coleção de arte exposta no Centro Cultural de Belém (CCB), numa percentagem que acabou por chegar aos 100% após os primeiros reforços de cobertura de garantias quando Berardo voltou a falhar as suas obrigações.

Na mira dos bancos estão, assim, os títulos da ACB que têm associado um valor referente à coleção de arte do empresário, cujo acervo inicial de 862 obras foi avaliado há mais de uma década em 316 milhões de euros pela leiloeira internacional Christie’s, no ano de constituição da Fundação de Arte Moderna e Contemporânea. O acordo entre o Governo e o Joe Berardo prevê a manutenção do direito de preferência do Estado no caso de decisão de venda da coleção. Um acervo que irá continuar no CCB até pelo menos 2022 (com renovação automática) e que, segundo especialistas do setor, deverá valer hoje mais de 500 milhões de euros.

Resta agora saber se a liquidação (ainda que parcial) da dívida passará pela venda da coleção ou por desapossar Joe Berardo dos títulos da ACB, com a sua venda jurídica, que permitirá comprar a própria colecção, num processo que exigirá sempre a participação do Estado enquanto vigorar o acordo de comodato que confere ao Estado o direito de opção de compra da Coleção Berardo.

Penhora vai exigir acordo com Estado

Recorde-se que estes colaterais da ACB foram dados como uma garantia adicional de Joe Berardo, depois da crise financeira e da dificuldade de recuperação dos mercados. Estes empréstimos estavam ligados à compra de ações que entretanto desvalorizaram fortemente e não recuperaram. Foi o caso da carteira de títulos do BCP, dada como garantia das dívidas, que, a partir de 2008, começou a desvalorizar de forma contínua, numa altura em que a Caixa Geral de Depósitos sabia que o seu cliente Joe Berardo enfrentava dificuldades para liquidar as dívidas que então totalizavam perto de 348 milhões de euros  – créditos contraídos entre 14 de julho de 2006 e 28 de maio de 2007, e serviram em grande parte para financiar o investidor na luta contra Jardim Gonçalves pelo controlo do BCP.

O Jornal Económico questionou Joe Berardo sobre os penhores dos títulos da ACB que foram dados como garantias aos bancos, tendo o empresário madeirense recusado prestar qualquer esclarecimento. “Não posso falar sobre o processo”, justificou.

Sobre os bens que foram sinalizados para penhora na ação judicial, os três bancos recusaram comentar o assunto ao Jornal Económico.

Ação judicial avança depois de tentativa falhada de acordo

Três bancos credores pediram a coleção de Berardo em troca do perdão da dívida. O empresário terá recusado e pretendido vender os mais caros, entregando apenas os menos valiosos.

Na sequência da crise financeira e do incumprimento de Joe Berardo, a CGD, BCP e Novo Banco acabaram por dar instruções para executar os colaterais (cerca de 40% imputados à Caixa e BCP, cada, e cerca de 20% ao Novo Banco) – onde se incluem os 75% dos títulos da Associação Coleção Berardo, como noticiou o jornal “Público” na sua edição de 12 de julho de 2017.

Segundo este jornal, em simultâneo decorriam naquela altura diligências para alcançar um entendimento que permitisse às partes envolvidas minimizar as perdas. Um acordo de perdão de dívida que se centrava na Fundação Berardo – a qual apresentava, no final de 2017, um buraco financeiro de 517 milhões de euros –  e na coleção de obras de arte do empresário madeirense, mas que acabou por não se concretizar. O acordo caiu por terra com a recusa de Berardo, já este ano, em entregar quadros valiosos à banca como forma de pagamento para a reestruturação dos créditos.

Os bancos acabaram por seguir a via judicial, exigindo a execução de penhores dos títulos da ACB dados como reforço de garantias e que já perfazem a totalidade dos títulos de participação da dona da coleção de arte exposta no CCB. Além do comendador, são visadas três empresas a si ligadas: a Metalgest, a Fundação José Berardo e ainda a Moagens Associadas.

Os números divulgados pela comunicação social indicam que, na segunda metade da década passada Berardo foi financiar-se preferencialmente junto da Caixa Geral de Depósitos (cerca de 400 milhões de euros) e do BCP (outros 400 milhões) e do BES em menor escala (200 milhões). Só a Caixa e o BCP tinham 80% dos créditos de Berardo, e o BES o restante.

Artigo publicado na edição nº1988, de 10 de maio do Jornal Económico

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