O Banco de Portugal (BdP) reconhece, numa análise divulgada esta quinta-feira, que a escalada da inflação já não está restrita somente às componentes com preços mais voláteis, tendo já começado a transmitir-se às “tipicamente mais estáveis”, como é o caso da restauração. Ainda assim, em conferência de imprensa, o governador do banco central português, Mário Centeno, sublinhou, repetidamente, que o atual fenómeno inflacionista deverá ser temporário, não tendo sido identificada, até ao momento, nenhuma “natureza interna ou endógena”.
No boletim económico publicado esta manhã pelo BdP, é explicado que a análise que decompõe “a inflação total observada nas variações de preços dos itens elementares classificados por grau de volatilidade histórica dos respetivos preços aponta para que as pressões ascendentes estejam a transmitir-se aos preços das componentes tipicamente mais estáveis”. Ou seja, ainda que a subida da inflação tenha sido explicada “em larga medida” pelas componentes mais voláteis, também as que se caracterizaram por uma menor volatilidade (como os serviços de educação e saúde, rendas, restaurantes e cafés) já registaram um aceleração dos preços, no final de 2021 e no início de 2022.
“A variação homóloga dos preços no período 2016-2020 manteve-se próxima da média de 1,5% para o primeiro quartil de volatilidade e em 1,1% para o segundo quartil, mas aumentou para 2,9% e 5,2%, respetivamente, em março de 2022”, detalha o banco central português.
Em conferência de imprensa, Mário Centeno fez questão de notar que a inflação é um fenómeno “também ele pandémico”, tendo raízes nas características “com que se recuperou da crise económica”. O economista salientou que a rapidez da retoma criou “pressões e tensões”, que deverão ser, contudo, temporárias. A expectativa do Bando de Portugal é a de que a procura se desloque, nos próximos tempos, para os serviços, setor que passará, assim, a ser o “motor da continuação da recuperação económica”.
Quanto ao impacto da guerra em curso na Ucrânia na escalada dos preços, Mário Centeno admitiu que “é evidente o efeito”, mas ressalvou que, já antes do arranque desse conflito, se fazia sentir a subida dos preços.
O governador do BdP enfatizou, além disso, que outro fator que explica a evolução da inflação é a própria transição climática, que terá, assim, “impacto nas nossas vidas”, mas é um objetivo “com o qual devemos estar comprometidos”. Também neste caso trata-se de uma escalada da inflação transitória, ainda que “mais longa”, , sublinhou Mário Centeno, que atirou: “Temos de a refletir nas nossas decisões de consumo e produção se quisermos ser consequentes com os objetivos que traçamos”.
Perante este cenário, o governador considerou a inflação “um fenómeno muito complexo e difícil de avaliar”, que é também um “desafio para todos os bancos centrais” e insistiu que tem na sua génese uma natureza temporária. “Continuamos a não identificar nenhuma natureza interna ou endógena”, observou, referindo que nem em Portugal, nem na Zona Euro há raízes que gerem fenómenos deste tipo “mais persistentes”.
Questionado sobre o impacto da trajetória dos preços na recuperação da economia portuguesa, Mário Centeno admitiu que a inflação pode ser um “risco ao crescimento”, mas descartou a adoção de medidas como moratórias, frisando que já “existem mecanismos para atuar”, de forma temporária e caso seja necessário.
Sobre os salários, o governador começou por dizer que esta “é uma avaliação que não pode ser feita apenas no momento que estamos a viver” e apelou à cautela. De notar que, no caso da Função Pública, os sindicatos têm reivindicado aumentos remuneratórios adicionais face aos já atribuídos no início do ano para evitar a perda de poder de compra, mas o Governo tem rejeitado, de modo a não alimentar a inflação.
Por outro lado, Mário Centeno defendeu esta quinta-feira que em momentos inflacionistas como o atual devem ser utilizados os buffers financeiros constituídos anteriormente, como é o caso da riqueza acumulada pelas famílias durante a crise pandémica, e alertou que “qualquer tentativa de interferência nos mecanismos de composição dos preços pode ter efeitos ainda mais perversos”.
O boletim económico apresentado esta quinta-feira pelo Banco de Portugal faz uma análise aprofundada à evolução da economia em 2021, tendo sido destacado, neste âmbito, o papel das políticas económicas na preservação da capacidade produtiva. “A recuperação que se iniciou logo em 2020 veio demonstrar a importância de coordenar políticas”, salientou Mário Centeno, em declarações aos jornalistas, que alertou que é preciso não esquecer a pressão colocada pelo endividamento no crescimento económico.
Por fim, e quanto à candidatura de João Leão ao Mecanismo Europeu de Estabilidade, Mário Centeno desejou a “maio sorte” ao ex-ministro e considerou que fará “um excelente trabalho nessas funções”.
Taguspark
Ed. Tecnologia IV
Av. Prof. Dr. Cavaco Silva, 71
2740-257 Porto Salvo
online@medianove.com