Como seria de esperar, o primeiro-ministro Boris Johnson – no seu segundo discurso em frente à porta de Downing Street que exibe o número 10 – decidiu produzir um discurso em que o Brexit foi apresentado como uma espécie de assunto do passado : está claro – pelo número de deputados eleitos pelos conservadores – que os britânicos querem o Brexit, o Brexit será feito em coisa de um mês, pouco mais, ponto final.
O que importa é o que vem a seguir, disse Johnson: “queremos trabalhar com a União, como amigos e soberanos iguais, para combater as alterações climáticas e o terrorismo, para construir uma cooperação académica e científica”. “A principal prioridade do povo britânico agora é que nos devemos focar no Serviço Nacional de Saúde. Essa ideia bela que representa o melhor do nosso país. Se se perguntarem a vós mesmos o que é que vamos fazer. Vamos unir-nos, unir todo este incrível Reino Unido, Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte, juntos”, disse.
Johnson falava do futuro, mas de algum modo mascarando esse futuro com as cores de unidade que, sabe-o bem, não são reais: é que entre as várias nações que o primeiro-ministro insiste que façam parte do todo que é a Grã-Bretanha, há uma que vai ser o seu próximo grande problema.
Johnson não estaria a pensar nas duas Irlandas e no enormemente vago acordo do ‘backstop’, mas da promessa dos escoceses em tudo fazerem para complicar o Brexit e promoverem um referendo de secessão. Esse será o próximo grande desafio do primeiro-ministro, que pode vir a trazer graves dissabores à maioria parlamentar saídas das eleições desta quinta-feira.
Seja como for, Boris Johson está em excelente posição para fechar o Brexit – e sabe, por outro lado, que a União tem tudo a ganhar em manter um bom ambiente com os que agora a abandonam: num mundo que se foi encolhendo desde que o Donald Trump chegou à Casa Branca, a Europa entendida como um todo não tem como deixar de se virar para si própria.
Do ponto de vista político interno, e para além da vitória indiscutível, Johnson pode contar com um hiato durante o qual a oposição do Partido Trabalhista estará como que adormecida: o seu ainda líder, Jeremy Corbyn – que ainda não se terá convencido que o seu tempo político acabou – terá que colocar o lugar à disposição e, nos próximos tempos, o partido entreter-se-á consigo próprio, deixando o primeiro-ministro em roda livre.
Para além das questões internas, a grande dúvida é como vai Boris Johnson gerir o posicionamento do Reino Unido em termos da geopolítica planetária. O primeiro-ministro poderá cair na tentação de ser o próximo parceiro privilegiado dos Estados Unidos – a altura, com o impeachment, é propícia – mas com certeza que os britânicos não quererão ficar reduzidos a uma espécie de colónia da sua ex-colónia.
Desse ponto de vista, será interessante observar-se como vai Boris Johnson lidar com questões tão importantes como a crise com o Irão, a guerra na Síria, a manutenção da amizade com a Arábia Saudita ou o estado de nervos que vai sucumbindo Israel. Já agora, também vale a pena tentar perceber-se se Johnson olhará para a União como um todo, ou se vai escolher (o que não seria fácil) entre Paris e Berlim para uma amizade sincera e possível casamento futuro.
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