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Cartão vermelho: Compra ao DK dos créditos incobráveis da Imostep ao Novo Banco no centro da acusação de burla

O presidente do Benfica admitiu ter alertado um acionista da SAD para comprar a Imosteps ao Davidson Kempner por 8 milhões de euros. Esta operação sustenta a acusação de burla qualificada no despacho do Ministério Público.
9 Julho 2021, 12h19

O Ministério Público chama-lhe “esquema ardiloso” montado entre 2018 e 2019 por Luís Filipe Vieira e pelo seu filho Tiago Vieira para adquirir os créditos incobráveis de 54,3 milhões de euros que o Novo Banco detinha sobre a empresa Imosteps.

O Jornal Económico confirmou que esta operação de compra de créditos por parte do seu amigo e sócio da SAD do Benfica, José António dos Santos, ao fundo Davidson Kempner que por sua vez tinha comprado a dívida ao Novo Banco com um enorme desconto no pacote Nata II, sustenta a acusação de burla qualificada, que é um dos crimes de que é acusado pelo Ministério Público o presidente do Benfica.

A operação já era conhecida e foi mesmo relatada pelo próprio Luís Filipe Vieira na Comissão Parlamentar de Inquérito ao Novo Banco, o que, segundo fontes, o poderá ter incriminado.

O presidente do Benfica admitiu ter alertado um acionista da SAD para comprar a Imosteps ao Davidson Kempner por 8 milhões de euros. Trata-se de José António dos Santos, conhecido como ‘Rei dos Frangos’, um dos donos da Valouro e maior acionista individual da Benfica SAD, que comprou por 8 milhões a dívida da Imosteps (de Luís Filipe Vieira) que o Novo Banco vendeu ao fundo norte-americano Davidson Kempner, depois de ter tentado comprar antes do Nata II por 10 milhões, o que foi recusado pelo banco.

“Eu acho que ele fez um ótimo negócio”, disse Luís Filipe Vieira na Comissão Parlamentar de Inquérito, defendendo que ao adquirir esses créditos da Imosteps José António dos Santos ficou com uma carteira de terrenos de 102 mil metros quadrados no Rio de Janeiro.

O presidente do Benfica admitiu na CPI que foi um fundo de capital de risco (fundo Iberis Semper) e José António dos Santos quem ficou com a dívida da Imosteps e os ativos dessa empresa. “Não conheço o fundo, mas a pessoa que pôs o dinheiro conheço, conheço a pessoa”, admitiu Luís Filipe Vieira sobre o investidor que foi José António dos Santos.

O Ministério Público disse que foi o próprio Luís Filipe Vieira que esteve por trás da compra realizada no ano passado de uma dívida de 54,3 milhões de euros que uma das suas empresas, a Imosteps, tinha ao Novo Banco, tendo desembolsado por ela apenas um sexto do valor que o Banco Espírito Santo (BES) lhe tinha emprestado meia dúzia de anos antes.

A operação da compra dos créditos da Imosteps – Promoção Imobiliária faz manchete de hoje no Público e ontem foi relatada na Tribuna do Expresso.

Fonte ligada ao processo diz ao Jornal Económico que o Ministério Público refere, “mas não valoriza” que “o Novo Banco não provisionou a imparidade e não procura pagar-se através do património imobiliário da OATA, mas vai buscar 89% ao Fundo de Resolução e vende o crédito ao fundo americano”.

A OATA é detida em 50% pela Imosteps Empresa também detida pelo Novo Banco, BCP, Promovalor e grupo madeirense AFA.

O Ministério Público recorda no seu despacho de acusação que as perdas que o Novo Banco registou com os créditos da Imosteps (já que os vendeu com um desconto de 89%) foram em grande parte suportadas pelo Fundo de Resolução.

Já Luís Filipe Vieira tinha dito aos deputados que “Só à Imosteps o Novo Banco vendeu a dívida de 54 milhões com uma perda de 52 milhões”.

A Imosteps foi uma empresa que é controlada por Luís Filipe Vieira, por causa de um “favor” feito a Ricardo Salgado. Trata-se de uma empresa que tem ativos no Brasil, e cuja dívida de 54,5 milhões de euros ficou fora das reestruturações de 2015 e de 2017 feitas pelo Novo Banco através do Fundo de Investimento Alternativo Especializado (FIAE) Promoção e Turismo (que protagonizou a operação de reestruturação de créditos do banco da Promovalor de Luís Filipe Vieira).

Em 2012 a Imosteps comprou 50% da OATA e “foi um favor que fez ao BES”, disse Luís Filipe Vieira na CPI, lembrando que comprou esses 50% à Opway (que era do GES). O que justifica que o presidente do Benfica tenha sempre defendido que a dívida de cerca de 55 milhões “não é minha”. A passagem da propriedade da Imostep para o empresário foi instrumental, mas ainda assim quer Luís Filipe Vieira quer o seu sócio no Brasil deram ao banco avais pessoais da dívida da Imosteps.

“Uma dívida que não foi minha, foi avalizada por mim e por meu sócio”, disse o empresário que sugere que encontrou (sugeriu) um comprador para essa dívida e “resgatámos os avales”. O presidente do Benfica disse ainda na CPI que alguém comprou a Imosteps. “Quem comprou, pagou 8 ou 9 milhões de euros”, referiu na altura.

O presidente do Benfica apresentou o negócio a um dos sócios da SAD do Benfica, José António dos Santos, que é conhecido como ‘Rei dos Frangos’ por ser um dos donos da Valouro, para se livrar do fundo Davidson Kempner que no Nata II tinha comprado o crédito ao Novo Banco por cerca de cinco milhões de euros.  O Davidson Kempner vendeu ao “conhecido” de Luís Filipe Vieira por oito milhões de euros os créditos da Imosteps.

Antes José António dos Santos tinha tentado comprar a dívida de Luís Filipe Vieira da Imosteps por 10 milhões de euros, mas o Novo Banco recusou.

José António dos Santos, além de sócio da Valouro e maior acionista individual da Benfica SAD, é sócio de Luís Filipe Vieira e da sua filha em duas empresas imobiliárias em Portugal. José António dos Santos também assumiu a dívida de que o presidente do Benfica era avalista numa pequena empresa de pneus da Amadora, a David Maria Vilar, segundo foi revelado na CPI ao Novo Banco.

Na CPI ao Novo Banco, Luís Filipe Vieira explicou como é que “herdou” a dívida de 55 milhões da Imosteps ao Novo Banco. “A dívida já existia dentro do banco – era uma dívida da Opway. A Opway tinham um terreno no Brasil, e pensavam que tinham um determinado ativo, com um determinado valor e que podiam ter lá um tipo de construção. Mas aquilo estava numa zona que era considerada reserva ecológica”. Depois o presidente do Benfica e da Promovalor contou que como  estavam no Rio de Janeiro,  Ricardo Salgado pediu-lhe se podiam “olhar para aquilo”.

“Empenhámo-nos naquela situação, estava numa zona que depois viria a ser considerada reserva ecológica, havia outros detentores de terrenos ali, e conseguimos chegar a acordo com o Prefeito de, noutra área, conseguimos 102 mil m2 de construção, o que quer dizer que aquilo tem um valor”, relatou.

“Quando chegámos a Portugal, caiu o BES  – qualquer pessoa dentro do BES sabe esta história, é uma dívida que eu não considero minha”, disse Luís Filipe Vieira, considerando que resolveu “um problema ao banco”, disse adiantando que “quando começamos a discutir com o Novo Banco a reestruturação da dívida chegámos a tentar reestruturar também a Imostep, nós sabemos o valor que aquilo tem, mas nunca houve vontade alguma de incluir a Imostep na reestruturação”, contou o empresário.

O Público relata que o negócio ainda veio com dois bónus: por um lado, uma participação de 12,5% que o Novo Banco tinha numa outra sociedade, a OATA, que era o principal ativo da Imosteps (dona de 50% do capital da OATA); por outro lado, ficou com o direito a receber um reembolso de mais de 17 milhões de euros que o BES injetara nessa empresa, que tem um terreno com aval para construir 102 mil metros quadrados na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro.

Segundo o Público, esta é a tese defendida pelo Ministério Público (MP) nos mandados de buscas no âmbito das buscas realizadas na Operação Cartão Vermelho, que esta quarta-feira levou à detenção de quatro pessoas, incluindo o presidente do Benfica, o seu filho e dois empresários.

O mandato de busca e apreensão do Tribunal Central de Instrução Criminal, a que o Jornal Económico teve acesso, fala da “indiciada actividade ilícita” sob investigação suscetível de integrar a prática de crimes de burla qualificada; abuso de confiança agravada; falsificação de documentos; branqueamento de capitais (Código Penal) e fraude fiscal qualificada (RGIT).

O que diz o despacho do Ministério Público?

Segundo a Tribuna do Expresso, o despacho do juiz Carlos Alexandre que autorizou as buscas desta semana e as detenções de Vieira e José António dos Santos refere que Luís Filipe Vieira e o seu filho recorreram a outras pessoas para adquirirem os créditos ao Novo Banco por um valor mais reduzido, aproveitando, para tal, o conhecimento que tinham do valor dos ativos da Imosteps mas também a ligação com a administração do Novo Banco.

O Ministério Público defende que Luís Filipe Vieira, sabendo que o seu nome não poderia ser associado à compra dos créditos da Imosteps, recorreu a Diogo Chalbert Santos, da Iberis Capital, para constituir um fundo de capital de risco que pudesse comprar os créditos ao Novo Banco, através de um fundo que formalmente tivesse como subscritor José António dos Santos. E para que o processo parecesse concorrencial, foi também apresentada ao Novo Banco uma proposta da empresa AFA, acionista da OATA. A proposta de Vieira em maio de 2019, através da Iberis Capital, oferecia ao Novo Banco uma soma de 6,9 milhões de euros pelos créditos (de 54 milhões) acrescida de 2,8 milhões pela participação de 12,5% que o Novo Banco tinha na sociedade OATA. Segundo o Ministério Público essa proposta foi aceite pelo Novo Banco mas não pelo Fundo de Resolução, que identificou José António dos Santos como beneficiário do fundo gerido pela Iberis, e concluiu ser uma possível parte relacionada com Luís Filipe Vieira, protagonista da dívida incobrável.

O Novo Banco acabou por incluir os créditos sobre a Imosteps no pacote de malparado Nata II, vendendo-os ao fundo Davidson Kempner em setembro de 2019 por 6,6 milhões de euros. O Ministério Público invoca que Luís Vieira diligenciou no sentido de avançar com um novo fundo de investimento, designado Portugal Restructuring Fund, que teria como subscritores José António dos Santos e e a sua mulher, e que acabaria por adquirir à Davidson Kempner os créditos da Imosteps por 9 milhões de euros em agosto de 2020. A mesma tese explica que em dezembro de 2020 o empresário que foi detido esta semana para interrogação e que aguarda a medidas de coação, venderia as suas ações na Imosteps ao Portugal Restructuring Fund pelo valor simbólico de um euro, libertando-se dos avales que tinha sobre aquela sociedade.

https://jornaleconomico.pt/noticias/presidente-do-benfica-admite-ter-alertado-um-acionista-da-sad-para-comprar-a-imostep-ao-davidson-kempner-por-8-milhoes-737029

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