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Cravinho passa aos Negócios Estrangeiros e é substituído por Helena Carreiras

O até agora ministro da Defesa passa para um lugar que lhe é mais natural e é substituído pela primeira vez por uma mulher, Helena Carreiras (a Ursula von der Leyen portuguesa), até agora diretora do Instituto da Defesa Nacional.
  • Cristina Bernardo
23 Março 2022, 19h56

O antigo secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação do XVII e XVIII Governos Constitucionais (entre os anos de 2005 e 2011) regressa a uma casa que conhece bem, o Ministério dos Negócios Estrangeiros, depois de ter deixado um rasto de alguma polémica desde que, em outubro de 2018, assumiu a pasta de Defesa Nacional.

O caso do alegado tráfico de bens preciosos por militares portugueses na República Centro-Africano, a tentativa de gerir o caos do caso de Tancos e a polémica da substituição de algumas chefias militares – com a passagem do vice-almirante Gouveia e Melo para o lugar de Chefe do Estado-Maior da Armada, entre outras decisões polémicas – marcara, a sua presença.

Desde a primeira hora que a escolha de António Costa pareceu um ‘tiro ao lado’: a Defesa não é a mesma coisa que os Negócios Estrangeiros, enquanto ministro, João Cravinho pareceu sempre perdido nessa confusão – que só ajudou a criar por ter aceitado um lugar que não seria naturalmente o seu.

Antes disso, Cravinho ainda teve tempo de se enfurecer com Ramalho Eanes, ex-presidente da República e uma espécie de senador, foi um dos assinantes de uma carta dirigida aos “titulares dos órgãos responsáveis pela Defesa Nacional” (Presidente da República, primeiro-ministro, ministro da Defesa e grupos parlamentares), a apelar” a que não houvessem decisões apressadas e houvesse “um debate alargado à sociedade civil, envolvendo a inteligência nacional, Academia, os institutos públicos, os partidos políticos e o que de melhor existe em conhecimento e saber no país”. Em causa estava o tema a proposta de alteração à Lei de Bases das Forças Armadas, na qual o PS pretendia reforçar a unidade de comando estratégico e operacional nas Forças Armadas dando mais poder ao Chefe de Estado-Maior-General (CEMGFA), pretendendo com isso que a resposta dos militares seja mais célere nas missões.

Como novo ministro dos Negócios Estrangeiros, João Cravinho herda uma pasta – mas não toda: não será ministro de Estado – que foi exemplarmente gerida por Augusto Santos Silva, o que é sempre uma dificuldade à partida.

Cravinho não é dos que considera que há um benefício adicional na existência de um exército comum na União Europeia, mas para sua sorte, só terá colateralmente a ver com o dossiê.

Quem deste tema terá de tratar com mais cuidado será Helena Carreiras, a primeira mulher a exercer funções de ministra de Defesa em Portugal – o que a colocará é pé de igualdade com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que exerceu exatamente esse cargo (também pela primeira vez) na Alemanha.

Diretora do Instituto da Defesa Nacional e com uma vida académica e de investigação profundamente ligada às áreas da Defesa, Helena Carreiras terá, antes de se preocupar com os assuntos europeus, que gerir os problemas caseiros.

Tomará posse numa altura em que é claro e consensual para todos que o orçamento do Ministério e os gastos militares vão subir desenfreadamente. Ora, como esses gastos a mais terão que ser poupados noutra área qualquer, Helena Carreiras pouco terá de esperar para passar a ser ‘odiada’ pelos partidos à esquerda do PS.

O problema é se outro tanto acontecerá com os partidos à direita. E também com a própria instituição militar. É que as Forças Armadas têm sido claramente o ‘parente pobre’ dos Orçamentos de Estado. E não é de agora: pelo menos desde 2001 – numa altura em que os europeus resolveram, talvez demasiado apressadamente, assumir a perceção de que a segurança militar ou já não era fundamental ou estaria ‘concessionada’ à NATO – que assim acontece.

Com o dinheiro a chegar em maior volume, seguir-se-á um igual aumento das reivindicações de cada um dos ramos das Forças Armadas, e Helena Carreiras estará no meio de movimentações reivindicativas que, tudo indica, serão muito difíceis de gerir.

Por outro lado, ainda terá de se preocupar em convencer os portugueses, o que não será fácil, que o aumento dos orçamentos para as Forças Armadas não corresponderá a um aumento dos gastos em absoluto, mas, ao contrário, a criação de uma oportunidade de desenvolvimento de negócios associados que, no limite, poderão permitir concluir que esses gastos são, afinal, puto investimento. Para que essa muito pouco evidente faceta do novo posicionamento do país (e da União Europeia) face à defesa se torne minimamente credível, Helena Carreiras terá de destinar uma parte do dinheiro para o financiamento de investigação e desenvolvimento, o que colocará a academia do seu lado.

De qualquer modo, para Helena Carreiras, a sua presença à frente do Ministério da Defesa será uma verdadeira ‘prova de fogo’.

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